Resumo

A introdução da terapia antirretroviral combinada (HAART) promoveu um substancial aumento da expectativa de vida em crianças e adolescentes infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Embora não haja um consenso na literatura, a HAART e a própria infecção parecem promover alterações deletérias na composição corporal (CC), tanto na massa óssea, quanto na gorda e na muscular. Esse estudo tem como objetivo avaliar a relação entre os componentes da CC e os parâmetros clínicos e laboratoriais da infecção pelo HIV adquirida por transmissão vertical, em crianças e adolescentes da Grande Florianópolis/SC. Trata-se de um estudo transversal, que investigou 51 crianças e adolescentes, com idades entre sete e 17 anos, sendo 26 do sexo masculino, com valores médios de massa corporal, estatura e idade de 39,9±12,6 kg; 147,2±15,4 cm e 12,5±2,7 anos, respectivamente. Dobras cutâneas, perímetros corporais e a absortometria radiológica de dupla energia foram utilizados para mensurar a CC. Os componentes da CC (densidade mineral óssea – DMO; conteúdo mineral ósseo – CMO; percentual de gordura corporal – %GC; massa livre de gordura – MLG) foram expressos em escores-z com base nos dados do National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES), tendo como ponto de corte de anormalidade o valor -2 dp. Nos prontuários médicos foram coletadas as informações, recentes e também retrospectivas de um período de quatro anos, de carga viral HIV RNA, linfócitos TCD4 + e TCD8 +, tempo/tipo da terapia antirretroviral e sintomas clínicos de evolução. Foram avaliadas as variáveis de crescimento e desenvolvimento físico (maturação esquelética e sexual), atividade física, ingestão de nutrientes e fatores sócio-demográficos para permitir ajustes na variável dependente. Análises estatísticas descritivas e inferenciais (bi- e multivariadas) foram realizadas, adotando-se um nível de significância de 5% (p≤0,05). Encontrou-se escores-z médios negativos em todos os componentes da CC comparados ao NHANES, sendo z-DMOsubtotal -1,22 dp, z-%GC -1,03 dp e z-MLG/estatura 2 -0,81 dp. Foram observadas prevalências de baixos escores para a massa óssea (16,7%), gorda (20,8%) e muscular (12,5%). Na massa óssea, o z-CMOsubtotal/estatura apresentou uma relação positiva com o nadir do linfócito TCD4 + (r=0,32, p<0,05), assim como, o z-DMO total demonstrou relação positiva com a mediana de linfócitos TCD8 + (r=0,38, p<0,05). Sujeitos que utilizam inibidores de protease na HAART exibiram reduzido z-DMOtotal comparados aos que não utilizam (-1,28 vs -0,79 dp, p<0,05). Na massa gorda, o z-%GC esteve inversamente relacionado à mediana de linfócitos TCD4 + e TCD8 + (r=0,33 e r=-0,32, respectivamente, p<0,05). Crianças com sintomas clínicos mais graves da infecção demonstram reduzido z-%GC comparadas aos estágios menos graves (-1,73 vs -0,70 dp, p<0,05). Na massa muscular foi observada relação positiva entre o z-MLG/estatura 2 e o nadir de linfócitos TCD4+ (r=0,37, p<0,05). Conclui-se que a preservação imunológica, associada à supressão viral e elevada atividade citotóxica está relacionada à preservação da massa óssea e muscular, além da redução na massa gorda. Com base nas alterações morfológicas observadas na infecção pelo HIV, torna-se necessário entender os mecanismos fisiológicos envolvidos. As investigações com delineamento longitudinal poderão confirmar a estabilidade dessas alterações na CC durante o processo de crescimento e desenvolvimento.

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