Integra

Carmem de Oliveira foi a primeira brasileira a vencer a Corrida de São Silvestre, em 1995. Em nível internacional, ela marcou 2h27min na maratona de Boston, recorde sul-americano. Com ótima técnica e bom fôlego, fez do atletismo a sua profissão.

De família humilde, Carmem corria, literalmente, atrás de bons resultados para conquistar prêmios em dinheiro, o seu salário, mas sem direito a férias. Quando melhorava as suas marcas, Carmem valorizava o cachê para prestigiadas corridas, e facilitava negociar novo contrato com o patrocinador. Mas precisava evitar contusões para não parar. Era “trabalho” permanente, com treinos, viagens e competições. Tudo em nome do “pão nosso de cada dia”. 
Há mais de dez anos fora das pistas, Carmem revela que não tem aposentadoria como atleta. Pedagoga e militando na política por causas sociais, ela é crítica ao modelo de reforma da Previdência e alerta os seus colegas atletas ainda na ativa. Confira:

“A reforma da Previdência esqueceu o atleta. Ela não contabiliza como `trabalho´ os dias de treinos, viagens e competições, para efeito de aposentadoria. Nas últimas décadas, explorando o nosso potencial técnico e físico, representamos o Brasil em eventos internacionais. E o próprio governo reconheceu a importância de nosso `trabalho´ recompensando com a Bolsa-Atleta, patrocínios das estatais, verbas para projetos etc. 

Porém, nada disso habilita os atletas à uma aposentadoria digna, porque falta a parte legal do contrato de trabalho com o clube. Por exemplo: quantos competidores recolhem o INSS de seus patrocínios, por anos ininterruptos? Quantos atletas têm carteira ou contrato assinado com um clube e recolhimentos mensais ao INSS? Sem isso, adeus aposentadoria digna.

As autoridades públicas que tanto se orgulham dos feitos no esporte e nos abraçam na hora dos holofotes não têm ideia do que é a rotina dos atletas; não sabem como vivemos durante os escassos anos de nossas carreiras e, muito menos, o abandono que sofreremos, quando paramos de competir. 
Hoje, eu vibraria mais com a retirada desse projeto nefasto, que sacrifica os mais necessitados, do que com uma vitória numa maratona importante. Tenho a clareza de que esse projeto visa capitalizar os banqueiros com a chegada de uma Previdência privada. 

Atletas, não esqueçam que o governo não estará com vocês na pós-carreira. E, ao contrário das excelências do Judiciário e do Legislativo, não haverá privilégios nem pensões vitalícias! 

Digam algo! Ajam agora, pois essa atrocidade de reforma previdenciária não diz respeito aos atletas, os `trabalhadores´ do esporte. Lutem contra esse projeto como se fosse um pódio para o país”. 

Para concluir:

Faz sentido o alerta de Carmem. Até no futebol, onde os atletas param, em média, aos 35 anos, a situação é difícil. Precisam trabalhar mais trinta anos em outro segmento para chegar à aposentadoria. Pior! As estatísticas mostram que apenas 15% dos profissionais brasileiros têm contrato de trabalho o ano todo. Segundo a CBF, 82,4% dos atletas têm renda mensal de até R$1.000,00; 13,7% recebem R$ 5.000,00 e apenas 6,9% dos jogadores recebem acima de R$ 10.000,00. 

Ora, se no futebol, a paixão nacional, a situação é essa, o que se passa nas demais modalidades? O alerta de Carmem é oportuno: os atletas precisam estar atentos à legislação e sua atualização para evitar dificuldades na pós-carreira.