Resumo

Sendo as Minas Gerais uma sociedade na qual se operam múltiplas trocas, mudanças, trânsitos, esta pesquisa busca compreender processos de educação dos corpos a partir dos divertimentos, e circunscreve, como seu objeto, modos de educar, de se divertir, de adoecer e de curar. Numa sociedade que se configura pela aparência, que considera importante ter, mas fundamental ser, em que a vida exemplar é norma, o corpo destaca-se. Estado e Igreja, principais instâncias de poder, estabelecem uma política moralizadora e civilizadora que almeja ordenar o bem comum, estabelecer um modelo de civilidade. Atuam, pois, na busca do controle de práticas em que a vigilância impera. Tendo como pressuposto básico a idéia de que o universo cultural que se configura não se restringe ao modelo europeu e de que nem sempre se prende aos valores, gestos e costumes de africanos, indígenas e europeus, caracterizando-se por hibridações, permeabilidades e permanências, esta pesquisa procura compreender a dinamicidade dos corpos na comarca de Vila Rica. Apoiada em fontes, como iconografia, literatura e documentos, explora o terreno das normas em que o controle e direcionamento da vida diária estabelecem maneiras e modos de proceder, formas de educação dos corpos. Além disso, destaca o âmbito das contravenções, por transgressões, delitos e desvios. Tensionando esses dois pólos, a pesquisa tenta compreender como as pessoas se aproximam ou afastam dos padrões e ainda como os reinventam: caminhos e descaminhos. Para isso, desenvolve o entendimento de educação que, no seu sentido pleno, remete ao governo dos costumes, na época marcados pela desproporção entre brancos e negros, sendo estes a maioria. Buscou-se, assim, compreender a idéia de educar o outro, no sentido polissêmico que o termo abarca, lidando com bons e maus tratos, com o homem branco e com o escravo e seus descendentes. Daí a razão de serem considerados processos educativos da Igreja, de pais e senhores, entre outros, como também de investigar mudanças no espaço físico, uma vez que ambos, corpo e espaço, neste tempo e local, sofrem significativas intervenções de reestruturação que almejam ordenamento e limpeza, mediante alterações em sua superfície, nos invólucros. No âmbito da diversão, destacam-se os descaminhos, embora o princípio da racionalização das práticas predomine e o econômico reja a vida cultural e norteie ações, como descanso, ciência, divertimento e tratos dos corpos. Esse enfoque da diversão traz, entre suas conseqüências, a tentativa de institucionalização de práticas, principalmente de negros e descendentes, ação que reclama intervenções e estratégias múltiplas, controle e disciplina dos corpos. No entanto, lícitos ou não, locais e formas de diversão que se manifestam em práticas culturais, como jogos, festas, danças, batizados e batuques, realizados em ruas, igrejas, vendas e casas de alcouce, traduzem tempo e espaço de trânsito, sociabilidade, permissividade, publicidade, desordem e banimento, pronunciam-se, especialmente, pelos desvios. Portanto prazeres, regalos, deleites, ainda que lícitos, devem ser vigiados. Para além das normas, transgressões e tentativas de controle, depara-se com as doenças. Extremamente atreladas, diversão e doenças manifestam-se em diferentes práticas e discursos, em que são também associadas ao vício e ao pecado

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