Integra

A Educação Física constituiu-se como uma disciplina, uma área de estudo a medida em que as atividades humanas organizaram-se. A história da Educação Física é a história da educação, a história do homem, pois os movimentos, as atividades físicas, estão relacionados com todas as realizações e manifestações humanas. O objeto de estudo da Educação Física é o homem em movimento, manifestando-se através da ginástica, do jogo, do esporte, da dança, das lutas etc.

Ao perceber a superficialidade com que a Educação Física vem sendo apresentada, utilizando-se dos desportos sem uma contextualização dentro das comunidades, percebemos que é preciso que o profissional dê significado a sua atuação na formação desses grupos. Morais, citado em Marco & Tolocka (1995),afirma que "A realidade corporal não se esgota no organismo mas abarca e é abarcada pela sócio- cultural no seio do qual a vida transcorre." (p.72). Questionamos a necessidade da Educação Física buscar um comprometimento filosófico de qual homem ela estuda e busca.

É necessário partir do professor, certo dos objetivos do seu curso, e do tipo de homem que pretende ajudar a formar. Cada aula é uma oportunidade de proporcionar a reflexão e aceitação das diferenças e a desmentir estereótipos de perfeição.

Encontramos na escola um quadro de desinteresse pela Educação Física, em que o professor libera os alunos para o futebol e as alunas para o queimado. Às vezes, os próprios alunos pedem essas atividades, ou mesmo dispensam-nas. Ao mesmo tempo, encontramos nos jovens um grande interesse pelo corpo, pela saúde, proporcionado principalmente pela televisão, meio de comunicação dominante e de companhia para os jovens, haja vista os programas interativos campeões em audiência, que apresentam estereótipos de beleza, malhação, esportes radicais, lutas, novas danças etc.

Será que a Educação Física escolar não poderia ou deveria acompanhar os esportes da moda, que são de interesse dos jovens? Porque os jovens pedem dispensa das aulas de Educação Física no entanto freqüentam academias? O que está faltando na Educação Física para que os jovens queiram participar da Educação Física escolar?

Desconhecendo a existência de outros trabalhos com as escolas da rede pública federal e sabendo da existência de trabalhos similares realizados na rede privada e pública, este trabalho torna-se de extrema importância para estas instituições analisarem suas práticas e para a universidade contribuindo para as reflexões dos formandos.

Desenvolvimento

A prática de ensino de um professor será fiel à sua filosofia de ensino, e acima disto à sua própria experiência de vida. Desta maneira é fundamental durante a formação acadêmica que existam oportunidades de estudo para que cada um descubra sua concepção de prática pedagógica e tenha condições de argumentá-la.

Segundo Hildebrandt (1986), "O ensino da Educação Física é uma construção de situações em que se tornam possíveis, experiências específicas para a superação de situações na vida presente e futura".(p. 59). Esta concepção expressa claramente o significado que as aulas de Educação Física alcançam.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) traz a questão do dever da educação logo no TÍTULO II, Artigo 2º "A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, sua preparação para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho." Niskier (1996, p. 59). A relação dos ideais de liberdade e solidariedade para formação do cidadão é respaldada e enriquecida com base no conhecimento do direito de todo cidadão.

O artigo 1 da LDB cita: "a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais".Parágrafo 2º: "educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social".Neste momento a lei deixa claro que não se pode separar a educação do lar e da escola, pois a criança que vai para a escola é a mesma que volta para casa e vice-versa, por esta razão, não se pode continuar com aquela visão retrógrada de que na escola chegam robôs para serem instruídos e adestrados, Niskier (p.59).

No artigo 3, que trata do "pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas".Niskier (1996) propõe legalmente o dever do professor em não só vivenciar elementos pedagógicos, como proporcioná-los aos seus alunos. Está na lei, é direito de toda criança adolescente e adulto: "II-liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte, o saber".(p. 60). Reforçando a necessidade das escolas definirem claramente suas propostas pedagógicas junto com os professores.

O referido autor enfatiza que "A alfabetização e a educação básica só se mostram eficazes quando oriundas de um querer coletivo e quando houver um outro enfoque pedagógico: mais importante é saber "como se aprende" do que "como se ensina". As crianças raciocinam e se expressam pela fala e aí está o como da aprendizagem" (p. 9). Estas palavras reforçam as idéias já expostas de que não adianta o professor querer estabelecer sua ordem e verdade. Ele precisa mais do que o aluno, aprender a aprender. Caberá a esse professor estimular uma postura crítica, preparando-o para o exercício da cidadania.

A nova escola depende também de "novos professores, imbuídos de outra mentalidade e cuja remuneração corresponda a responsabilidade assumida" (Niskier, p. 11). Todas as propostas de mudanças e suas condições determinantes, nos mostram o quanto a reforma educacional no país será lenta e progressiva. O interesse e o comprometimento do universitário no seu papel na sociedade, acontecerá ao vincular a produção do conhecimento na comunidade em que ele está inserido, atingindo diretamente as expectativas e necessidades da população.

Niskier (1996) diz "a Universidade brasileira está longe de representar o instrumento decisivo na política de formação de recursos humanos".(p. 12) E não serão novas leis que conseguirão transformar toda a realidade viciada da universidade, afastada do seu papel de produtora do conhecimento, de um dia para o outro. Todo o processo deverá ser, da mesma forma, iniciado nos professores que vivem acomodados em sistemas de aula ultrapassados, com aulas prontas em transparências e fotocópias de materiais usados a 5 ou mais anos, se esquecendo que o conhecimento está constantemente se renovando.

O referido autor concorda com a idéia proposta de que "A educação do docente é o primeiro passo para a solução de muitos problemas, a começar pela consideração de que o professor é um homem do saber e um artista, e não um tecnocrata".(p. 237).

É necessário um posicionamento mais crítico e mais esclarecedor em relação a algumas posições da LDB, de forma a evitar "a negação do princípio de autonomia universitária, que enfraquece a liberdade acadêmica e torna a Universidade perigosamente subordinada ao governo e aos interesses do mercado"; (Souza & Vago, 1997, p. 124). Esta decisão alerta para o que está acontecendo na formação do professor de Educação Física, hoje voltada ao preparo de professores de academia e de "personal training", indubitavelmente áreas atualmente mais rentáveis que o magistério.

Conclusão

O interesse e dedicação com que participaram, demonstrou o quanto esse tipo de trabalho é desejado. O aluno da Rede Federal apesar do desânimo com a matéria, percebe e sabe a importância da Educação Física em sua vida, tanto pela questão da saúde e do bem estar, como pela ludicidade e pela descontração no cotidiano escolar. Para professores esta afirmativa é muito importante, pois a aula é um momento muito desejado.

Em relação ao objetivo do estudo, a expectativa do aluno é deixar de ser executor de planejamento. O aluno da Rede Federal de modo geral gosta da Educação Física de sua escola, participa das atividades, gostaria mesmo que as aulas acontecessem mais vezes na semana, mas não entende o processo de construção das aulas, pois o que desejam é participar como agentes. Além disto, é necessário refletirmos que a ausência de uma política pedagógica definida e efetivamente implantada pela escola, que garanta essa participação, é fundamental para o êxito de um planejamento participativo.

As expectativas do aluno e a realidade de suas aulas não coincidem, pois existe um distanciamento entre eles e seus professores. O aluno espera mais atenção nas aulas, que os professores se interessem mais por suas opiniões, e desta forma quer uma Educação Física diferente da que conhecem hoje.

Sua visão é pouco crítica em relação à avaliação. Em geral consideram as formas tradicionais, citadas no trabalho, como boas. Desempenho nas atividades; prática de esportes; participação; freqüência nas aulas; interesse nas aulas; trabalhos teóricos apenas utilizados em 1 escola como métodos foi considerado razoável pela maioria dos alunos. Desta forma pode-se identificar como os jovens estão condicionados a aceitar os métodos e ao compreendem o significado desse processo.

Apenas os alunos de uma escola sugeriram a auto-avaliação.Ao propor uma auto-avaliação transferimos para o aluno a responsabilidade de avaliarem seu interesse e participação ajudando ao desenvolvimento da sua autocrítica de seu autoconhecimento. Essa questão nos ajuda a identificar a forma do professor de propor suas aulas e presumivelmente identificar a proposta pedagógica.
Desejam inovações, atividades que acompanhem as novidades do momento, entretanto podemos observar hoje nas escolas as mesmas aulas, com os desportos tradicionais. Os alunos desejam capoeira, tênis, uma luta, atividades novas e também que estejam inseridas em seu contexto social. Entendem que é a aula em que têm também a oportunidade de entenderem e vivenciarem conceitos como companheirismo e solidariedade. Assim desejam aulas mais tranqüilas, com menos violência, briga, enfim com uma competitividade mais saudável. É o desejo dos educandos e um desafio para o educador.

Desafio porque na sua formação, o formando aprende a construir e planejar aulas. Construir objetivos práticos e instantâneos de executar atividades. Assim sai da universidade acreditando que é essa a Educação Física que os alunos desejam, aulas em que executam atividades e aprendem esportes. Precisamos discutir na faculdade, uma nova prática e mesmo diferentes formas de incentivar a participação dos alunos no processo de construção do curso e das aulas, pois é essa a expectativa deles.

Muitas vezes as aulas de Educação Física são identificadas como sessões de treinamento para que os melhores representantes sejam preparados para competições e torneios, internos ou interescolares. Cabe ao professor, consciente da importância da Educação Física, mudar essa visão, inclusive para trabalhar melhor com alunos portadores de necessidades especiais.

Identificamos no decorrer do trabalho que é essencial uma visão crítica e consciente das leis para que possamos adotar uma prática pedagógica consciente. "A educação é dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana..." Niskier (1996, p.59). Saber qual sociedade desejamos construir, conhecer o que está acontecendo para que possamos mudar em virtude do homem e de uma sociedade mais humana.

Como é o desejo do educando que participou desta pesquisa, pode e deve ser do professor em formação, o qual veio do mesmo sistema de ensino. Por isso esse ciclo deve começar a ser mudado na universidade, no professor em formação, que consciente do sistema e do que deseja para sociedade, poderá quebrar esse ciclo. Algumas inovações estão sendo propostas, mas os educadores não tomam conhecimento, resultando em uma ausência de atitude por parte do educador. Ele não concorda, discorda ou questiona a origem das mudanças ou reformulações legais do sistema.

Sem uma formação crítica acerca do sistema de ensino, apenas reproduzimos a proposta pedagógica da instituição em que trabalhamos, que em sua maioria não é precisamente definida.

A principal contribuição deste trabalho na formação do professor encontra-se na discussão e redirecionamento das aulas durante sua formação. Esperamos que esse trabalho seja discutido pelos estudantes e professores de Educação Física, repensando algumas matérias e seus enfoques. Redirecionar o currículo "inchado" e com matérias fundamentais pouco exploradas. Do contrário, repetiremos o sistema de trazer novas idéias sem antes acender o debate e determinar as questões e os envolvidos.

Obs. A autora, Andréia Ferreira Braga, é da UFRJ.

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