Resumo

A Educação Física como área de conhecimento tem divulgado, em muitos estudos, os efeitos da prática de atividades físicas sistemáticas para as populações humanas, ressaltando os benefícios nos aspectos físicos, psicológicos e sociais decorrentes da prática de exercícios, ou da participação em programas estruturados de atividades físicas. Considerando esses benefícios, parece natural que muitas investigações busquem estabelecer relações entre as modificações favoráveis decorrentes da prática com a obtenção de melhores níveis de qualidade de vida. Em conseqüência desses benefícios, muitos estudos e pesquisas têm o intuito de investigar as possíveis influências da prática de atividades físicas sobre a qualidade de vida das pessoas. Alguns estudos apontam relações positivas entre a prática de atividades físicas e a qualidade de vida, mas alguns estudos não apontam essa relação positiva. Os apontamentos positivos ou não dessa relação estão ligados ao discurso dos autores de cada produção científica, ou seja, cada autor apresenta vínculos com grupos científicos que discutem assuntos a partir de determinadas perspectivas epistemológicas e, por isso, cada autor pode fazer uma determinada afirmação sobre a relação entre a prática de atividades físicas e a qualidade de vida, por exemplo. Essa problematização levou-nos a indagar qual é o discurso da Educação Física que podemos verificar em relação à qualidade de vida? E quais são os significados e sentidos apontados pela Educação Física em relação à qualidade de vida? Como estado da arte, esta pesquisa objetivou conhecer e discutir as produções científicas da Educação Física brasileira, especificamente as dissertações de mestrado e teses de doutorado que discursam sobre qualidade de vida. As produções científicas foram analisadas com base no gênero discursivo proposto por Bakhtin. Essa escolha se deu pois Bakhtin parte do princípio de que todo texto é dado por alguém e deve ser analisado a partir do autor da produção e do contexto em ele está, dando sentido ao texto. As análises foram organizadas em perspectivas epistemológicas em que cada autor discursou a qualidade de vida em sua produção científica. O discurso de 11 produções correspondeu à perspectiva biomédica na qual as relações causais entre a atividade física e impacto positivo na qualidade de vida são destacadas; 30 produções discursaram sob a perspectiva biomédica, dando ênfase às questões relacionadas ao comportamento humano; três produções apresentaram seu discurso sob a perspectiva da promoção da saúde e o discurso de cinco produções correspondeu à perspectiva psicossocial na qual o comportamento individual emerge das relações sociais vivenciadas pelo indivíduo. Foi possível observar que os discursos verificados sob a perspectiva biomédica (relação causal e abordagem comportamental) partem do princípio de que o desenvolvimento de um aspecto da qualidade de vida pode influenciar todos os outros aspectos do construto, assim como apontam que a disseminação de informações sobre hábitos e estilos de vida saudáveis é medida suficientemente eficaz para melhorar a qualidade de vida da população, não levando em consideração a dependência de diversos fatores e aspectos da qualidade de vida que se inter-relacionam. Já os discursos verificados a partir da perspectiva da promoção da saúde e psicossocial são visões que se baseiam em noção de vida complexa, o que pode favorecer a saúde e a qualidade de vida do indivíduo. Diante desse estudo, foi possível verificar que, dentre as produções científicas analisadas, grande número dos autores tem discursado acerca da qualidade de vida a partir da perspectiva biomédica que, por sua vez, alimenta as práticas e os programas de Educação Física / atividade física numa relação causal e de adoção de comportamentos considerados saudáveis que, atualmente, tendem a não satisfazer as necessidades humanas.

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