Resumo

Estudos contemporâneos apontam para uma maior preocupação com o desenvolvimento infantil e a importante influência que o meio ambiente onde a criança vive gera nesse desenvolvimento. O convívio com as pessoas próximas nos primeiros anos de vida pode gerar uma marca durável no desenvolvimento da criança. Objetivos: O presente estudo teve como objetivo verificar o desenvolvimento motor de bebês até dezoito meses antes e após a sua participação em um Programa de Intervenção Motora Participativa Ampliando Oportunidades (PIMPAO). Método: Este foi um estudo experimental, quantitativo, correlacional, onde participaram 94 bebês, entre um e dezoito meses, provenientes de três contextos diferentes de baixa renda: 41 bebês que passavam oito horas do dia em escolas infantis, sendo o educador o seu cuidador, 29 bebês que moravam com suas famílias biológicas e as mães eram as cuidadoras e 24 bebês que moravam em abrigos, sendo os monitores seus cuidadores. Os locais, previamente selecionados, após contato inicial e aceite em participar do estudo, foram: escola de educação infantil conveniadas com a prefeitura de Porto Alegre, Programa de Estratégia de Saúde da Família (ESF) na Região Metropolitana de Porto alegre e Núcleo de Assistência Residencial do Estado do Rio Grande do Sul (NAR). Os grupos interventivo (GI) e controle (GC) foram aleatoriamente escolhidos. Os bebês foram avaliados no início e após oito semanas por meio da Alberta Infant Motor Scale e da Affordances in the Home Environment for Motor Development Self-Report. O programa de intervenção consistia em atividades de perseguição visual, manipulação de brinquedos, controle postural e demonstração de afetividade. Os cuidadores foram treinados e orientados a repetir estas atividades diariamente, cinco vezes por semana. Orientações para ampliação de oportunidades de desenvolvimento no contexto foram realizadas para os cuidadores. A visita para troca de atividades foi chamada de “troca da semana” e, em cada semana, eram apresentadas cinco novas atividades. A análise dos dados foi realizada utilizando o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 17.0. As variáveis contínuas foram descritas através de mediana e amplitude interquartílica devido à assimetria da distribuição. As variáveis categóricas foram descritas através de freqüências absolutas e relativas. Para comparar as variáveis contínuas entre os grupos foi utilizado o teste de Mann-Whitney. Quando comparados os contextos, o teste de Krukal-Wallis foi aplicado. Para comparar as variáveis categóricas foi aplicado o teste qui-quadrado de Pearson e, na complementação dessa análise, o teste dos resíduos ajustados foi aplicado. Para comparar as oportunidades, antes e após a intervenção em cada grupo e contexto, foi aplicado o teste qui-quadrado de McNemar, exceto para o número de brinquedos referente as motricidade fina e ampla, que foi avaliado pelo teste de Wilcoxon. O nível de significância estatística considerado foi de 5% (p ≤ 0,05). Este estudo teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do SUL (UFRGS). O Termo de Consentimento Livre Esclarecido foi formulado tomando por base a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Resultados: Em relação ao sexo, idade, idade gestacional, número de adultos que conviviam com os bebês, número de crianças, número de cômodos/peças no local e a escolaridade dos cuidadores, não foram detectadas diferenças estatisticamente significativas entre o GI e o GC. Sobre os resultados para categorização AIMS, não houve diferença na categorização do desenvolvimento motor no fator tempo (do pré e para o pós teste) no GC (p=0,545). Porém, no GI, houve um aumento no percentual de normalidade e uma significativa redução no atraso motor (p=0,003). Desconsiderando o grupo (interventivo e controle), o único ambiente que apresentou diferença estatisticamente significativa no fator tempo para o desenvolvimento motor foi a educação infantil (p=0,009). A escola infantil associou-se com a normalidade, a 6 comunidade com o atraso e o abrigo com a suspeita de atraso (p<0,001). Ainda no fator tempo, considerando grupo e ambiente na categorização do desenvolvimento motor no grupo interventivo, somente na escola infantil houve diferença estatisticamente significativa do pré para o pós intervenção (p=0,020). Na avaliação do ambiente, nos resultados do fator tempo para o grupo controle, houve diferença entre as avaliações do pré para o pós intervenção nas questões referentes aos cuidadores deixarem menos as crianças no berço quando acordadas (p=0,008) e mais restritas ao chão (p=0,006) no pós teste. Também houve uma diminuição estatisticamente significativa do número total de brinquedos que estimulam a motricidade fina (p=0,009) e um aumento estatisticamente significativo do número total de brinquedos que estimulam a motricidade ampla (p<0,001). No grupo interventivo, houve uma melhora em quatro quesitos referentes às oportunidades oferecidas às crianças. Foram eles: onde guardar brinquedos (p=0,008), crianças escolherem as brincadeiras (p=0,008) e aumento no número de brinquedos que estimulam tanto a motricidade fina quanto a ampla (p<0,001). No pós intervenção, entre os grupos, diferiram significativamente quanto à criança escolher a brincadeira (p=0,018), melhor para o GI. Quando separados os grupos em ambientes, na escola de educação infantil houve aumento estatisticamente significativo no número de brinquedos da motricidade fina e ampla (p<0,001) do pré para o pós intervenção no fator grupos. No ambiente da comunidade houve uma melhora em dois quesitos referentes às oportunidades oferecidas às crianças: diminuição das crianças carregadas no colo (p=0,021) e no berço quando acordadas (p=0,031). No ambiente de abrigo, houve um aumento significativo na proporção de crianças que escolhem as brincadeiras (p=0,031), maior restrição das crianças ao chão (p=0,031) e aumento no número de brinquedos que estimulam a motricidade ampla (p<0,001). A escola de educação infantil permaneceu oferecendo as melhores oportunidades, e a comunidade, em geral, apresentou as piores condições. Nos abrigos, quando foi comparado o desenvolvimento dos bebês filhos de mães usuárias de crack, observou-se diferença estatística significativa entre os escores do pré para o pós intervenção (p=0,011). Comparando diretamente os escores observados, das oito crianças deste grupo, todas apresentaram escores e percentil motor mais elevados na segunda avaliação. Em relação à comparação dos escores das crianças de mães não usuárias de crack, verificou-se que as quatro crianças deste grupo apresentaram escores e percentil motor mais elevados na segunda avaliação. Chama-se atenção para o fato de que os escores apresentados pelas crianças no grupo das mães não usuárias de crack se mostraram mais elevados. Conclusões: Pode-se concluir que os bebês que participaram do PIMPAO obtiveram melhores resultados em relação ao ganho no seu desempenho motor. Modificações do ambiente foram positivas para o desenvolvimento e houve uma associação positiva das mudanças no ambiente com aqueles bebês que melhoraram seu desenvolvimento motor. Os bebês cujas mães fizeram uso de crack durante a gestação obtiveram desenvolvimento motor mais defasado em relação aos bebês cujas mães não utilizaram a droga. Ambos se beneficiaram com o PIMPAO, com maiores ganhos naqueles mais necessitados. Este estudo mostrou a importância da inserção de um trabalho interventivo em diferentes contextos, destacando a escola infantil como a que gerou mais desenvolvimento nos bebês e alterações positivas no ambiente, seguida pelo abrigo e, por fim, comunidade. Os bebês desenvolvem maior qualidade em seu aprendizado motor quando estimulados de maneira correta em ambiente da escola infantil, ou no abrigo e ou no ambiente familiar.

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