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A medida que se aproxima a realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio, mais eu vejo as pessoas envolvidas com o esporte se mobilizarem, mesmo com toda a incerteza que ronda essa competição.

Jornalistas conhecidos começaram a ser contatados para receber a necessária vacina para poder se deslocar pelo mundo afora. A origem do imunizante não deveria ser problemas, muito embora dirigentes europeus digam que a coronavac, produzida no Butantã com tecnologia chinesa, não será reconhecida no continente. Chegar do outro lado do mundo não é tarefa fácil quando não se tem voo sem escalas.

Enquanto isso, na última semana foram embarcados para o Japão os últimos equipamentos para os atletas brasileiros totalizando 20 containers que começaram a ser despachados em 2018. Na bagagem estão barcos, equipamentos de musculação, além de máscaras, luvas e outros materiais necessários à manutenção dos protocolos de segurança.

Essa movimentação faz crer que o sinal está verde e que de fato em breve teremos competições.

Simultaneamente, acontecem seletivas mundo afora, definindo assim os nomes dos atletas que representarão o país, com ou sem pandemia.

No Japão são testadas as instalações entregues conforme o plano inicial. Eficientes, calculadas, perfeitas. Poderiam ter sido o palco de muitas apresentações com a finalidade de testar toda a logística necessária para a realização de um evento deste porte. Sem público, foi possível prever como serão as competições de julho.

É curioso observar que dentro dessa lógica de Jogos sem público há uma construção discursiva que foca nas palavras superação e resistência, mas que passa longe da palavra emoção. Sinal dos tempos, o pragmatismo necessário para que o show não pare, mesmo com tanta dificuldade, coloca em segundo plano o afeto gerado pela conquista.

Certamente, as imagens geradas pelos meios de comunicação serão acompanhadas de narrações transbordantes, cuja finalidade será proporcionar o calor que um ginásio ou estádio lotados são capazes de proporcionar. Isso será possível para o público que assistirá de suas confortáveis poltronas na segurança de seus lares. Mas, para mim, a pergunta que não quer calar é, como os atletas lidarão com isso?

Eu que me debruço sobre as dimensões imaginárias do esporte e a representação heroica que ele traz para os atletas tento entender o que é receber uma medalha diante de um público formado por árbitros, comissões técnicas e adversários. É difícil conceber a dimensão de uma disputa sem o público que referenda o esforço e a disputa.

A ovação diante da quebra de um recorde me faz lembrar uma passagem na vida de Adhemar Ferreira da Silva. O bi-campeão olímpico de 1952 e 1956 foi aos Jogos de Roma, em 1960 e não alcançou um grande resultado. Sem saber estava com problemas de saúde que afetaram o seu rendimento. Desolado diante da desclassificação se dirigiu aos seus pertences vivendo a solidão que só os derrotados conhecem. A ovação do público o retirou daquele vácuo temporário. Sabia que aquele som representava um resultado conquistado por algum novo campeão. E para sua surpresa, a audiência do estádio, em pé, o aplaudia reconhecendo a sua trajetória vencedora e promovia assim a despedida que um bi-campeão de fato merecia.

Provavelmente em Tóquio serão vividas outras cenas com as marcas deixadas de uma edição olímpica singular, sem os sons habituais, com cenas diferenciadas. Porque só se sente saudade da presença da falta de algo ou alguém.