Editora Prismas. None 2015. 235 páginas.

Sobre

Este livro de Diego Pacheco é muito mais que um estudo de História, ultrapassa os objetivos de um trabalho acadêmico, é um verdadeiro instrumento de recuperação de importantes experiências passadas, fundamental para refletirmos sobre a participação política e o significado de cidadania em nosso país. Os sujeitos desta obra são pessoas comuns, trabalhadores urbanos, estudantes, carteiros e agricultores. Gente que atendeu ao chamado de Leonel de Moura Brizola - pelas ondas da rádio Mayrink Veiga, que então cobriam boa parte do território nacional e passou a organizar-se em grupos de 11 membros, tal como um time de futebol. Porém, estes 11 não estavam ali para brincar num jogo, mas sim para lutar pelas desejadas reformas de base, um projeto de nação que se construía no início dos anos 1960. 
O período que precedeu ao Golpe de 1964 é um dos mais ricos da história brasileira. Ali podemos vislumbrar o ascenso na organização e na atuação dos trabalhadores, muito mais independentes do que imaginávamos. O tal trabalhismo, citado por muitos personagens da época, fica claramente desvendado nesta obra: trata-se de um conjunto de concepções nacionalistas, e algumas de cunho socialista, que compunham um leque bastante diversificado de posições políticas. Muito diferente da concepção dominante até poucos anos, de que o populismo reinante do período era uma manipulação de massas a partir do domínio carismático de um líder que seria o verdadeiro sujeito dos acontecimentos, a noção de trabalhismo vivenciada pelos integrantes dos Grupos dos 11 significava que a agência, a capacidade de iniciativa e de criação política eram apropriadas pelos trabalhadores em diferentes contextos e colocadas em prática para alcançar os seus objetivos. 
O nacionalismo teve um grande peso nestas concepções trabalhistas e de esquerda nos anos de 1960. Em primeiro lugar, por uma questão geracional. Muitos destes integrantes dos Grupos dos 11 eram crianças ou jovens na época do suicídio de Vargas, acontecimento extremamente impactante, principalmente com a divulgação da Carta-Testamento, documento político com forte tom nacionalista que serviu de guia para toda uma geração. O nacionalismo também era defendido por comunistas e por todos que lutavam contra os monopólios internacionais, pela limitação das remessas de lucros e contra as já notórias interferências do Fundo Monetário Internacional. A dinâmica dos acontecimentos toma novos rumos em 1961, com a renúncia do Presidente Jânio Quadros e a chamada Campanha da Legalidade que garantiu a posse do Vice-Presidente João Goulart, recolocando os trabalhistas no poder e ampliando as esperanças de reformas sociais e econômicas de amplas camadas da população. Um projeto de nação estava em curso: a necessidade de aprofundamento da democracia no país só poderia ser realizada através de um conjunto de reformas (urbana, agrária, educacional, trabalhista, etc). Vivíamos num mundo dividido pela Guerra Fria, com forte presença do discurso anticomunista. Qualquer ação dos ¿de baixo¿, mesmo que fosse apenas para lutar por salário registrado em carteira e pela aplicação da legislação já existente, poderia ser considerada como subversão, e isto mesmo antes do golpe de 1º de abril de 1964. 
Importante momento da obra é a análise do jornal Panfleto, o jornal do homem das ruas, um veículo agregador dos Grupos dos 11 que possuía toda uma forma peculiar de distribuição. Os integrantes dos Grupos dos 11 foram, em grande parte, denunciados e perseguidos pelo Regime Militar. A sombra de sua lembrança foi utilizada pelos militares como uma organização subversiva a serviço do caudilho Leonel Brizola. Até documentos duvidosos, atribuídos aos Grupos dos 11 foram vasados para a imprensa como forma de condenar seus participantes. Diego não dá margem a boatos e calúnias, faz uma análise muito cuidadosa dos documentos e fontes disponíveis, sem cair em versões sensacionalistas e falsas sobre este período controvertido. 
Diego reconstrói os espaços políticos e físicos de atuação dos Grupos dos 11 em Santa Catarina. O leitor passeia pelas estradas do Estado nos anos de 1960. A pesquisa, norteada por extensa bibliografia sobre o tema, foi também baseada em reportagens de jornais; entrevistas com participantes deste movimento e seus contemporâneos; além da consulta aos arquivos da Comissão de Anistia, do Ministério da Justiça, e de processos do Supremo Tribunal Militar. Trata-se de um trabalho original que traz uma importante contribuição à historiografia brasileira, principalmente no entendimento de como determinados grupos se apropriam de ideias e as colocam em prática, na luta por direitos, por liberdade e pela construção de uma Nação. 
Paulo Pinheiro Machado 
Professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina

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