Integra

INTRODUÇÃO:

Este texto tem por objetivo relatar o trabalho de investigação sobre o lazer na vida cotidiana das pessoas que freqüentam o Parque Farroupilha em Porto Alegre/RS.

A questão nodal sobre a temática do lazer no cotidiano está na compreensão da lógica societal na qual estamos inseridos, conforme Antunes (1999), voltada para a produção de mercadorias e valorização do capital, forjando a produção de corpos-mercadoria, transformando o tempo livre em tempo vazio e linear, fragmentado e eivado pelo consumo banal de mercadorias bizarras, próprias da sociedade de espetáculos. De acordo com os estudos de Pais (1986), para compreender o cotidiano em suas ambigüidades e contradições, vinculamos a historicidade absoluta de um ato à generalização de uma estrutura social, fazendo destacar a imbricação de um ato ou acontecimento individual com uma estrutura global, através de uma rede de mediações sociais.

Objetivos do trabalho:

* conhecer o perfil das pessoas que freqüentam o Parque e seus objetivos de visitação;


*
analisar o tempo de lazer dessas pessoas na perspectiva de sua forma e conteúdo, tempo e espaço, quantidade e qualidade, visando conhecer a possibilidade da vivência plena do tempo destinado ao lazer.

As significações epistemológicas, pedagógicas e políticas de um trabalho com esta temática, se revelam fundamentais pela possibilidade de transformar um problema social de ocupação de espaços públicos, áreas de lazer e convivência em problema sociológico de investigação.

METODOLOGIA:

Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, apoiada na concepção dialética, caracterizada epistemologicamente pelo pressuposto marxista de análise da vida cotidiana, em que pinçamos o lazer como categoria não isolada no contexto do tempo do trabalho e do não-trabalho, acolhendo o desafio da cultura do consumo, da Indústria Cultural, da sociedade do espetáculo. Este trabalho foi desenvolvido em três momentos, entretanto, não fragmentados. Na elaboração e fundamentação do projeto, foram desenvolvidas ações de caráter exploratório. O trabalho de investigação foi realizado através de consultas às fontes documentais sobre o Parque Farroupilha; observação participante e entrevistas semi-estruturadas, após um processo seletivo de amostragem aleatória dos/das ocupantes do Parque. O terceiro momento, dedicado à resultados.sistematização e análise dos dados.

As observações foram registradas através de fotografias e diário de campo, entendidas conforme Triviños (1987, p. 154) "como todas as observações e reflexões que realizamos sobre expressões verbais e ações dos sujeitos, descrevendo-as primeiro, e em seguida, fazendo comentários críticos, sobre as mesmas". As entrevistas foram gravadas em fitas K7, nos meses de outubro e novembro de 2003. E finalmente, registrar que a pesquisa bibliográfica perpassou todas as etapas propostas, como forma de garantir o embasamento e sustentação teórica do trabalho de pesquisa e análise das informações obtidas no processo investigatório.

RESULTADOS:

Neste trabalho investigativo, verificamos que durante os dias úteis, as pessoas que usufruem daquele espaço, são moradores dos bairros circunvizinhos, estudantes, profissionais liberais, funcionários públicos, comerciários, bancários e aposentados, que tem por hábito caminhar/estar na Redenção, em seu tempo de não-trabalho. Nos fins de semana, encontramos pessoas do entorno do Parque bem como, de bairros distantes, que se deslocam de ônibus ou automóvel, para encontrar com os amigos, conversar, tomar chimarrão, fazer exercícios, passear com os cachorros, conviver com a natureza, enfim, fugir da fatigante e rotineira vida de trabalho semanal.

As singularidades percebidas na perspectiva da forma e conteúdo, tempo e espaço, quantidade e qualidade do tempo destinado ao lazer, integram um amplo rol de significações que envolvem não só a alegria do lúdico, a fruição, a fantasia e o prazer estético, mas, também a necessidade do cuidado de si, da saúde e do seu bem-estar. A Redenção é um espaço com uma dinâmica cultural, onde as manifestações de lazer e divertimento permitem a formação de redes de sociabilidade. Espaços apontados como integrantes do lazer e não de trabalho, foram as compras na feira agro-ecológica que acontece todos os sábados, e no domingo, o passeio pelo Brique da Redenção, uma espécie de Marché aux Puces. O Brique é, também, tradicional ponto de manifestações políticas e culturais onde a música, o teatro, a dança, sempre encontram fiéis apreciadores.

CONCLUSÕES:

Para finalizar, sem contudo esgotar as possibilidades de reflexão sobre a urgência desta temática, frisamos que pensar o mundo do lazer no cotidiano, à luz do capitalismo atual, e a partir das idéias de educar para as virtudes da preguiça de Lafargue (2003), se constitui numa ação revolucionária de emancipação do gênero humano, pois traz em si o debate sobre as relações de trabalho, suas jornadas e conseqüente aumento do tempo do não-trabalho.

Henri Lefebvre (1991) em seu livro A vida cotidiana no mundo moderno, analisa criticamente a Sociedade do Lazer. Para ele, "no momento, o lazer é antes de tudo e para todos, ou quase todos, a ruptura (momentânea) com o cotidiano."

Se tornarmos a categoria lazer como um produto, para o consumo de uma sociedade capitalista e tendo como premissa a chamada indústria do lazer, esta mercadoria estará disponível no mercado segundo o poder de compra de cada indivíduo isolado.

Desse modo, trouxemos uma reflexão preliminar sobre as possíveis contradições, existentes entre o cotidiano vivido em uma sociedade de consumo e seus apelos de mercantilização, que atuam como elemento dinâmico nas transformações do imaginário, na sensibilidade e nos sistemas de percepção e este espaço público, que se confunde com a própria história da cidade, que testemunhou as mais diferentes manifestações populares, políticas e culturais, e que permanece como um dos espaços prioritários na vida de cada citadino entrevistado.