Integra

1 - Revisão bibliográfica

1.1- Síntese do projeto político pedagógico do Clube Escolar Fundão

O Clube Escolar Fundão tem pautado o seu trabalho nas diretrizes político-educacionais estabelecidas desde a implantação dos Clubes Escolares em maio de 1993, dentre as quais destacamos: funcionar como núcleos de lazer e cultura em caráter complementar ao ensino regular da rede pública; ampliar a ação institucional da escola, através do desenvolvimento de atividades de lazer com os alunos matriculados na rede pública municipal; utilizar o tempo livre como espaço de construção da consciência da cidadania e desenvolvimento comunitário; favorecer aos sócios dos Clubes o acesso aos bens culturais e aos espaços públicos da cidade do Rio de Janeiro.

Com relação às práticas esportivas ali oferecidas, considera-se o seu desenvolvimento dentro das seguintes bases: criar uma prática desportiva diversificada e dirigida ao maior número possível de associados, visando o aperfeiçoamento das suas potencialidades; garantir que o aprendizado e/ou o aperfeiçoamento das práticas desportivas não se construa sob o ponto de vista da obtenção de um apuro técnico excessivo, de forma que a preocupação com resultados se torne um motivo de exclusão da atividade; construir condições para que as práticas esportivas nos clubes escolares ofereçam aos alunos a possibilidade de vivenciarem atividades que combinem alegria, liberdade de escolha, responsabilidade (consigo mesmo e com os outros), iniciativa e disciplina, atitudes estas, estimuladas em um contexto de convívio no grupo.

Nesse ponto, o Clube Escolar cria um elo com a escola, na medida em que ressalta a importância do lazer para o desenvolvimento educacional e social e, ainda, na medida em que se entende como um espaço de ampliação das experiências apreendidas na escola.

O projeto político-pedagógico do Clube Escolar Fundão está fundamentado nos seguintes pressupostos teóricos: Educação intercultural que concebe o homem como um ser que constrói a sua identidade através da cultura. Isso vale dizer que o conhecimento trabalhado através das atividades oferecidas não se constitui por si só, dependendo, para tanto, da referência dos sujeitos a quem se dirigem. Isto é, os conteúdos desenvolvidos apenas ganham significado à medida que servem como um elemento a serviço do desenvolvimento das dimensões humanas - deslocando desse modo o foco das ações pedagógicas do objeto do conhecimento (fundamentos do vôlei, do futebol, etc) para o sujeito do conhecimento; a Educação baseada no Desenvolvimento Humano, onde a aprendizagem se realiza sob certas condições biológicas e segundo o contexto no qual se está inserido, ou seja, a todo sistema simbólico corresponde um substrato orgânico, mas a efetivação desse sistema se dá no ambiente sócio-cultural; no trabalho de Paulo Freire, para quem uma relação em que não ocorra o diálogo, a crítica e a cooperação é uma relação desumana em que as mudanças necessárias a uma vida mais justa não florescem; na teoria de Vygotsky, que defende que o sujeito constrói o conhecimento interativamente, na sua relação com o meio e com os outros; onde este sujeito deve ser ativo, participante, cidadão, crítico e solidário; e Wallon, que destaca em sua teoria psicogenética que a dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista da construção da pessoa quanto do conhecimento.

1.2- Tipos de questionários e especificações

Segundo Richardson(1985), de acordo com o tipo de pergunta, os questionários podem ser classificados em três categorias: questionários de perguntas fechadas; questionários de perguntas abertas; e questionários que combinam ambos os tipos de perguntas.

Na presente proposta, entendemos como melhor opção a utilização de questionários de perguntas abertas que, segundo este mesmo autor, se caracterizam por apresentarem "perguntas ou afirmações que levam o entrevistado a responder com frases ou orações".(p.145)

1.3- Normatização para o atendimento de estagiários

No Rio de Janeiro, em 21 de Fevereiro de 2000, o CONFEF dispõe sobre a regulamentação do estágio extracurricular para os acadêmicos de curso de graduação em Educação Física quando realizado em Escolas, empresas, academias, clubes, hospitais, clínicas, hotéis e outros, e dá outras providências.

Vale lembrar que tal Resolução diz respeito aos estágios extracurriculares desenvolvidos em campos de atuação profissional da Educação Física que não os escolares já que, no ensino formal, há legislação própria delimitando quem poderá atuar.

Para a concretização da presente proposta, serão necessários contatos futuros com os órgãos responsáveis pela parte jurídica, tanto da Secretaria Municipal de Educação, quanto da UFRJ.

1.5- Discussão crítica sobre avaliação

Para a avaliação da práxis do estagiário poderíamos optar, mesmo assumindo o risco de sermos reducionistas, entre duas grandes correntes que trazem embutidas concepções antagônicas do que é avaliar. Uma delas baseia-se numa visão de mundo positivista, onde a vida é encarada como sendo algo dado e, portanto perseguidora de verdades absolutas e padronizadas. Onde a valorização de erros e acertos e sua conseqüente punição ou premiação são a representação prática que favorece uma relação utilitarista, onde os conhecimentos não são realmente valorizados a não ser que conduzam a prêmios.

A segunda concepção, adotada pela presente proposta, mostra-se dialética no trato do conhecimento, encara a vida como um processo criativo e transformador e segundo Romão(2002): "potencializa uma concepção avaliadora de desempenhos de agentes ou instituições, em situações específicas e cujos sucessos ou insucessos são importantes para a escolha de alternativas subseqüentes"( p.58)

Precisaremos, também, através da linguagem, investigar a produção de sentidos entre interlocutores/discurso. Não se pode apenas avaliar o aspecto instrumental da linguagem, mas sim, o seu funcionamento na produção de sentidos, de imaginários sociais.

Nossa opção foi então pela análise de discurso que como metodologia estabelece uma relação com a linguagem que, ao considerar o social e o individual, transcende o simples ato de enunciação e desencadeia condições de produção de imaginários, que no presente trabalho pretendemos detectar através da análise dos questionários.

2 - Proposta para o programa de recepção e qualificação de estagiários

A proposta para a execução prática do presente programa está baseada no desenvolvimento de três fases distintas e gradativas, como se segue.

2.1 - Das fases do programa

2.1.1 - Fase de embasamento teórico

A primeira fase do programa, denominada EMBASAMENTO TEÓRICO, teria por objetivo possibilitar ao estagiário o acesso ao referencial metodológico que fundamenta o trabalho pedagógico do Clube Escolar Fundão: seus objetivos gerais e específicos e a metodologia utilizada para a consecução dos mesmos.

Essa é uma fase primordial para o sucesso do programa, pois seria durante o seu desenvolvimento que o professor orientador mostraria, com muita clareza e segurança, o seu nível de comprometimento com o trabalho que realiza no clube, bem como, o nível de conhecimento teórico das bases filosóficas que o fundamentam.

2.1.2 - Fase de observação e identificação

A segunda fase denominada OBSERVAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO, teria por objetivo permitir ao estagiário identificar a aplicabilidade prática de tudo aquilo que lhe foi exposto durante o desenvolvimento da fase anterior. Para isso, seria possibilitado ao mesmo observar a prática cotidiana do professor orientador junto as suas turmas. Esse é o momento da verificação da coerência do que se propõe teoricamente com o que, efetivamente, se realiza.

É através dessa fase que se pretende desconstruir o antigo discurso do "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço" ou, "a teoria na prática é outra."

2.1.3 - Fase de regência dirigida.

A terceira e última fase denominada REGÊNCIA DIRIGIDA conclui o programa, dando ao estagiário a oportunidade de, como "Regente de Turma", colocar em prática os conhecimentos adquiridos, mediante a formulação de um planejamento prévio, seja ele de aula, de micro ciclo ou de curso, dependendo da duração do estágio.

2.2 - Da mudança de fases

A passagem de uma fase anterior para a seguinte ocorreria de acordo com o desenvolvimento particular de cada estagiário. Esse desenvolvimento seria avaliado por meio de questionários de perguntas abertas e denominados TRABALHOS TEÓRICOS, que contariam com objetivos específicos para cada fase, e que seriam apresentados ao estagiário e por este respondido, por escrito.

2.3 - Da avaliação em cada fase

2.3.1 - Da avaliação da primeira fase

Denominado Trabalho Teórico I, o questionário relativo a primeira fase, teria por objetivo avaliar se as informações a respeito da criação, funcionamento e proposta político-pedagógica do clube foram devidamente transmitidas e apreendidas.

2.3.2 - Da avaliação da segunda fase

Por meio do instrumento denominado Trabalho Teórico II, desenvolvido como parâmetro para avaliação da segunda fase do programa, teria-se por objetivo avaliar se o estagiário já estaria condições de identificar a coerência necessária que deve existir entre os objetivos propostos (teoria) e as estratégias utilizadas para a consecução desses objetivos (prática).

2.3.3 - Da avaliação da terceira fase

Tendo-se como base a fundamentação teórica transmitida na fase 1, e a identificação dessa teoria sendo posta em prática na fase II, o denominado Trabalho Teórico III, teria por objetivo, como conclusão do programa, avaliar se o estagiário já está em condições de, mediante acesso ao planejamento específico da oficina junto a qual está atuando, desenvolver um planejamento coerente com tudo que lhe foi apresentado e de colocá-lo em prática, como "Regente de Turma".

2.4 - Da avaliação dos trabalhos teóricos

As respostas fornecidas pelo estagiário por meio dos questionários, possibilitariam ao professor orientador diagnosticar os conceitos que ainda não teriam sido consolidados pelo estagiário.

Por meio do documento denominado AVALIAÇÃO DE TRABALHOS TEÓRICOS, o professor orientador forneceria, também por escrito, todas as informações necessárias para a retificação da aprendizagem.

Os registros por escrito têm por objetivo não somente permitir que ao concluir o programa o estagiário possa levar consigo o produto de sua atuação, mas, também, servir como retro-alimentação para as necessárias correções de rumo.

Tais objetivos não se contrapõem à certeza de que para o real sucesso do programa, mais importante do que registros e documentos escritos será o relacionamento pessoal, as conversas e a troca de experiências entre o professor orientador e o seu estagiário.

3 - Conclusão

Em conclusão podemos afirmar que a implantação do que foi aqui proposto contribuiria, em muito, tanto para a melhoria do atendimento atualmente oferecido pela faculdade aos estagiários, quanto para a qualificação continuada dos professores que trabalham no Clube Escolar Fundão.

Para os estagiários, em função da possibilidade de um contato com um tipo de trabalho diferenciado do trabalho realizado nas escolas e devidamente normatizado, à luz da Literatura, o que permitirá uma visão mais abrangente e organizada dos objetivos e da prática pedagógica desenvolvida no clube. Isto serviria como contraponto aos diferentes objetivos e práticas desenvolvidos nos outros espaços em que virá futuramente exercer sua profissão, quer sejam eles públicos ou privados.

Para os professores, por meio do convívio com futuros profissionais que se encontram em contato com o que existe de mais atualizado no meio acadêmico, o que traria a reboque, um grande estímulo à busca constante de novos conhecimentos e da renovação permanente de sua prática profissional.

Obs. Os autores, profs. Antônio Manoel Lima de Holanda (antonio1958@ig.com.br), Gilmar de Magalhães Couto (gilmarcouto@aol.com) e Luiz Otávio Motta Fontes (lomf@ aq.microlink.com.br) são da Prefeitura Municipal do Rio (RJ)

Referências bibliográficas

  • Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Educação Física. Brasília: MEC/SEF, 1998.
  • Freire, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 26ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
  • Freire, Paulo. Piaget na sala de aula. Rio de Janeiro: Forense, 1972.
  • Hoffman, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001.
  • Jornal do Brasil. Entrevista: Cipriano Carlos Luckesi. Avaliar não é julgar o aluno. Rio de Janeiro: 30/7/2000.
  • Richardson, R. J, Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1985.
  • Romão, José Eustáquio. Avaliação dialógica: desafios e perspectivas. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2002
  • Snyders, G. A Alegria na Escola. São Paulo, 1988.