Resumo

O trabalho em turnos se refere a uma organização das horas de trabalho, que utiliza duas ou mais equipes de trabalho para atender o tempo total necessário para a produção ou para a prestação de serviços. Além disso, pode ser considerado como qualquer tipo de organização das horas de trabalho que difere do período tradicional diurno. Diante de uma sociedade que cada vez mais funciona nas 24 horas do dia, este tipo de atividade torna-se mais comum. No entanto, há evidências que colocam o trabalho em turnos, especialmente o desenvolvido no turno noturno, como fator de risco para diversas patologias, incluindo o câncer, devido seus efeitos crônicos à saúde do trabalhador. Além dos problemas de saúde causados por manter-se em vigília durante o período noturno, o qual biologicamente é destinado ao sono e socialmente às atividades de lazer, acredita-se que diferenças em outras esferas da atividade humana, incluindo o lazer e o próprio trabalho, são evidenciadas. Diante disso, os objetivos desde estudo foram: artigo 1) propor e analisar a validade de construto da Escala de Preferências no Lazer (EPL); e artigo 2) analisar as diferenças nas questões de saúde, trabalho e lazer de acordo com o turno de trabalho de industriários da Grande Florianópolis. Devido à complexidade da matéria em questão e limitações nos instrumentos existentes, o primeiro artigo propôs, a partir dos principais referenciais teóricos acerca dos conteúdos culturais do lazer (artístico, manual, físico-esportivo, intelectual, social, turístico, virtual e contemplação/ócio) analisar a validade de construto da EPL. Para isso, a amostra foi composta por duas amostras. A amostra “A” contou com a participação de 51 adultos participantes de cursos de atualização em uma universidade da Grande Florianópolis, oriundos de diversas profissões como professores, profissionais da área da saúde e do comércio. Com estes indivíduos foi verificada a reprodutibilidade da EPL. Já a amostra “B” foi composta por 885 participantes trabalhadores da indústria, de diferentes funções, da região da grande Florianópolis. A partir da resposta dos voluntários da amostra “B” verificou-se a consistência interna do instrumento. O processo de validação da escala deu-se por meio de três etapas; a) análise de conteúdo por cinco doutores pesquisadores do lazer, que avaliaram o instrumento quanto à clareza da linguagem e pertinência prática o que permitiu o cálculo do coeficiente de validade de conteúdo (CVC); b) reprodutibilidade em teste-reteste para o cálculo do coeficiente de variação temporal; e c) análise de consistência interna. A avaliação de conteúdo apresentou coeficientes adequados, tanto com relação à clareza da linguagem (CVCt=0,951) quanto para a pertinência prática (CVCt=0,925). Os coeficientes de variação temporal (teste-reteste) indicaram valores de reprodutibilidade aceitáveis (≥0,70), sem diferenças significativas entre as avaliações (p>0,005). A escala apresentou adequada consistência interna com Alpha Cronbach=0,719. Desta forma, a EPL apresentou valores aceitáveis de qualidade psicométrica em sua estrutura, podendo ser utilizada em pesquisas com o objetivo de investigar as preferências e envolvimento nos diferentes conteúdos do lazer em adultos. A amostra “B’ foi utilizada para responder aos objetivos do segundo artigo. Para as questões de saúde utilizou-se o IPAQ – versão curta, o Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) e o questionário de matutinidade e vespertinidade de Horne-Ostberg, para análise da atividade física, qualidade do sono e cronotipo, respectivamente. As atividades no lazer foram investigadas a partir da Escala de Preferências no Lazer (EPL) (artigo 1). Entre as questões do trabalho investigadas destacam-se, o tipo de trabalho realizado, a ocupação em outra atividade remunerada, tempo na empresa, escolaridade e renda. Para o cálculo da diferença entre as médias, utilizou-se o teste de Kruss-Kruskal-Wallis (post hoc de Dunn) e o teste de Qui-Quadrado, para as proporções. Na análise de correlação entre as variáveis contínuas, fez-se uso do teste de Spearman. Os dados foram analisados nos softwares, SPSS 20.0, BioEstat 5.0 e GPower 3.0. Para todas as análises adotou-se um nível de significância de 5%. A média de idade dos trabalhadores foi de 31,1(8,5) anos, sendo 58,0% do sexo feminino. Identificou-se diferença estatística entre os turnos com relação à qualidade do sono (p<0,001), com prevalência de 35,6% de distúrbios do sono nos trabalhadores noturnos. Entre esses, 16,7% possuiam características matutinas e 68,6% relataram faltas ao trabalho no último ano por questões de saúde. O consumo de bebidas cafeinadas (33,3%) e de cigarros (21,6%) também foi maior entre os trabalhadores noturnos. Apesar disso, o tempo em atividade física vigorosa foi maior nesses trabalhadores, com média de 75,5 minutos por semana. Trabalhadores em turnos possuiam menor remuneração (p<0,001) e maior frequência de um segundo emprego (p=0,002). Entre as questões relacionadas ao lazer, identificou-se diferença nos conteúdos artísticos (p=0,046), físico-esportivo (p=0,048) e turístico (p=0,004) entre os trabalhadores de diferentes turnos. Desta forma, diferenças substanciais no que tange as questões de trabalho, saúde e lazer foram evidenciadas nos diferentes turnos de trabalho, especialmente no trabalho noturno. Neste contexto, acredita-se que os resultados deste estudo possam servir de base para novas políticas públicas de lazer ao trabalhador catarinense, bem como melhor entendimento por parte das organizações quanto à importância na seleção dos trabalhadores para o turno noturno de acordo com o seu cronotipo a fim de preservar a qualidade de vida dos seus funcionários.


 

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