Resumo

O resultado esportivo da seleção brasileira de futebol na última Copa do Mundo realizada no Brasil decepcionou sobremaneira imprensa e torcedores. Dado o peso simbólico da tradicional competição e o apelo emocional que desperta, a derrota por 7x1 para a Alemanha levantou uma grande interrogação sobre a importância de nosso futebol hoje. Toda a estrutura de administração do esporte do país entrou na berlinda. Muitos atribuíram o alegado fracasso à incapacidade dos gestores do futebol brasileiro (tanto da confederação nacional quanto dos clubes) de sustentarem projetos esportivos sintonizados com a evolução do esporte. O tema suscitou toda uma discussão acerca da tradição personalista, coronelista e antidemocrática que se manteve intacta mesmo diante das forças de modernização do esporte, entendidas sobretudo a partir da introdução da lógica de mercado em seu meio. Não pretendemos aqui explicar as razões de nossos descaminhos futebolísticos. Consideramos importante nesse trabalho avançar na direção de compreender a atuação da força moral e afetiva de fundo entre torcedores, dirigentes e jogadores que se traduzem nas pressões sociais para que os mecanismos institucionais ou as práticas tradicionais de nosso futebol se movam mais ou menos intensamente. Entende-se aqui que as energias mobilizadas por torcida, jogadores e dirigentes, acumulando-se e repercutindo, amplificada pela imprensa e redes sociais, constitui a ambiência do mundo esportivo. Compreender a que lógica respondem contribui para definir um dos planos mais fundamentais dos eventos no mundo esportivo do futebol profissional apreciado por uma massa de interessados. Para compreender como se organiza esse complexo de relações, propõe-se aqui conceber essa ordem de fenômenos sociais como principalmente morais e simbólicos que, além de apresentar uma face meramente esportiva, envolve múltiplas dimensões – emocional, econômica, política, jurídica... – que podem ser muito bem exploradas como aspectos de um mesmo fenômeno total a partir da concepção da dádiva e das relações de reciprocidade que elas implicam. Propõe-se entender essas relações, portanto, a partir de uma lógica de troca simbólica, que envolve o pedir ou o exigir, o dar, o receber, o disponibilizar e o retribuir, em nome da grandeza das entidades coletivas (clubes ou seleções nacionais) com as quais se identificam as comunidades de que são parte. A lógica da dádiva ordena a distribuição de força moral, do prestígio e até de recursos econômicos. Poder-se-ia dizer que essa lógica vigora a despeito da força do frio interesse do mercado; às vezes aproveitando-se, às vezes chocando-se com ela.

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