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Do que se trata? Por que é importante? Como foi feito? O que foi achado? Ao responder a estas perguntas você cumpre com os objetivos do chamado resumo analítico (ou indicativo) de um artigo científico, ou seja, daquele texto que apresenta breve e concisamente o conteúdo de um trabalho acadêmico.
Seja num artigo científico ou num relatório de pesquisa, como são as dissertações, teses e monografias de conclusão de curso, o resumo é um elemento essencial. Primeiro, por que ele será utilizado para a classificação e indexação de seu trabalho em bases de dados bibliográficas. Com isso, quando um leitor potencial buscar uma fonte bibliográfica, o conteúdo do resumo determina se seu trabalho será ou não encontrado.
E logo, pois o resumo é o contato inicial do leitor com seu texto, a primeira, talvez a única coisa que ele vai ler . Neste sentido, o resumo precisa ser o suficientemente informativo para que o leitor faça uma ideia geral do que se trata sua pesquisa. Ao mesmo tempo, deve ser atrativo, chamando a atenção deste leitor e convidando-o a continuar na leitura.
Em meio a uma pesquisa bibliográfica, com a necessidade de identificar e selecionar entre centenas de trabalhos aqueles que serão úteis ou não, a decisão do leitor (e juiz) pode ser bastante rápida. O mesmo vale para bancas de avaliação e para pareceristas de eventos científicos, que a partir do resumo já começam a estabelecer a credibilidade e relevância de seu trabalho.
Mais além deste requisitos básicos, existem alguns cuidados adicionais na elaboração de um resumo. São práticas (ou mesmo vícios) que geralmente não são abordadas pelos livros, manuais e aulas de metodologia científica.
Contudo, como elas podem prejudicara avaliação de seu trabalho, talvez até lhe fazer passar vergonha, é importante conhecê-las.
A obviedade do lugar-comum
Os lugares comum são a morte de qualquer tipo de discurso, inclusive o acadêmico.
Por isso, uma regra de ouro que você deve levar consigo é evitar o campeão dos lugares-comuns, pelo menos na elaboração de um resumo analítico: iniciar o texto com a expressão “este trabalho tem como objetivo....”. Ou qualquer variação deste espanto.
Por quê?, você estará se perguntando. Vejamos: como vimos, logo após o título, o resumo é o primeiro elemento do texto com o qual o leitor toma contato. E pode ser o último também, caso ele comece de forma tão previsível, sem criatividade, corriqueira e, vamos combinar, monótona.
Para os que discordam, um relato. Recentemente colaborei na organização dos anais eletrônicos de um grande evento científico e, naturalmente, acabei lendo o resumo de cerca de 400 trabalhos. Ao bater uma vez mais os olhos num “este trabalho”, a sensação de repetição era inevitável (sem falar numa certa tontura).
Mais além do chavão, este também é um erro lógico e por este motivo a expressão não deve nem no início, nem em qualquer outra parte do resumo! Claro que ao ler um resumo eu já sei que existe um trabalho implícito. Ao utilizar esta construção você está dizendo algo que não precisa ser dito, ou seja, trata-se de uma redundância. Além da falta de elegância, você “gasta” palavras e caracteres à toa, desperdiçando o espaço disponível, tema da próxima recomendação.
Extensão: nem de mais, nem de menos
Com suas opiniões polêmicas, inflamadas, de seu visual curioso e de ter sido o deputado federal mais votado na história da democracia brasileira, toda uma geração irá se lembrar do Doutor Enéas Carneiro por sua participação na propaganda eleitoral gratuita.
Em sua primeira candidatura à Presidência da República, em 1989 (logo viriam mais duas), o médico e político tinha a seu dispor exatamente 17 segundos para transmitir ao público sua mensagem de campanha. Mas o interessante é que ele conseguia utilizar cerca de 19 segundos, começando a fala já pelo meio e nunca terminando completamente seu característico bordão, “meu nome é enééaaaass”.
Este uso tão hábil de um espaço de tempo tão reduzido me faz pensar na extensão do resumo. Afinal, quanto devemos escrever? Minha resposta seria, faça igual a Enéas e utilize o máximo possível, dentro dos limites estabelecidos.
Aqui, é importante notar que estes limites variam, segundo o tipo de publicação. Embora a norma técnica NBR 6028 da ABNT tente regular esta extensão, periódicos científicos e eventos acadêmicos possuem na parte das vezes suas próprias elaborações, idiossincráticas. Já no caso de monografias, dissertações e teses, é comum ver este limite ampliado, até totalizar uma página.
Dito isso, a primeira recomendação: não ultrapasse o limite máximo estabelecido. Nunca se sabe qual pode ser o critério de escolha entre dois trabalhos semelhantes, no sentido de qual vai ser aceito e qual vai ficar de fora. Por isso, é mais seguro “jogar” pelas regras. No caso de sistemas de envio informatizados, você nem mesmo terá a possibilidade de expandir seus limites, então é bom transformar a prática em hábito.
Agora, pelo outro lado, qual é a extensão mínima de um resumo? Minha resposta: o máximo que lhe for permitido. Assim como o candidato Enéas, o espaço que você tem disponível para seu resumo é tudo o que você possui para captar – ou não – a atenção do leitor, pareceristas e revisores incluídos. Por este motivo, seu resumo deve passar o máximo de informação possível, aproveitando todas linhas e caracteres a seu dispor.
A tradução automática não é tudo, nem para todos
Recentemente estive em uma das cidades da Copa do Mundo, escolhidas muito mais por seu atrativo turístico que pela sua importância relativa no mundo do futebol.
Seja como for, lá estava eu, no buffet de café da manhã de um resort quatro estrelas, absolutamente intrigado/maravilhado/chocado com a capacidade criativa (inesperada) da tradução automática:
cheese mine
cheese dish
wimp
Se os dois primeiros são reconhecíveis, o último alimento recebeu um novo nome, inimaginável. Na ocasião, fiz um breve concurso no Facebook, prometendo uma caixa dele, para quem adivinhasse do que se tratava…
Situações como esta suscitaram uma quantidade enorme de críticas e questionamentos a respeito da capacidade e preparação para organizar um evento assim, incluindo receber os turistas. Logicamente, o hotel falhou. Mas em que medida também não cometemos o mesmo erro?
Estou pensando no abstract ou resumen, o resumo em língua estrangeira, solicitado em artigos de revistas acadêmicas e também em monografias de conclusão de curso. Em sua elaboração, já me deparei com absurdos da mesma magnitude dos erros cometidos pelo hotel, também fruto da tradução automática.
A principal dificuldade, pelo que entendo, é a falta de contexto, que leva aos programas a realizarem traduções literais, quando há um sentido específico, especializado no que está escrito.
Em outros casos, nomes próprios ou termos que não deveriam ser traduzidos acabam sendo, levando a situações inusitadas. Como exemplo, encontrei uma pesquisada realizada na "Good Trip College", uma instituição onde trabalhei, orientei e participei de bancas.
Em resumo (sem trocadilhos), o abstract de seu trabalho não é somente um acessório, uma obrigação chata a ser cumprida. Na medida que a ciência é uma atividade internacional e que a publicação eletrônica encurta suprime distâncias, este texto pode ser o fator decisivo para que seu trabalho seja encontrado por pesquisadores e estudiosos fora de nosso país. Aliás, esta é a razão para que ele seja solicitado, em primeiro lugar.
E claro, também tem o fator vexame.
Por isto, com o tanto de tempo e de esforço que você mobilizou até aqui na redação de um artigo científico, TCC ou dissertação, invista um pouco mais e contrate um tradutor, em carne e osso, de confiança para realizar a tradução.
Uma dica sobre a elaboração do abstract
No caso de um trabalho que vai ser avaliado por uma banca, recomendo que esta tradução somente seja feita depois da defesa. O motivo? Justamente pelo fato do resumo ser um “alvo fácil” dos comentários, observações e correções da banca, e para evitar desperdício de tempo e dinheiro, é recomendável que a tradução seja feita a partir da versão final.
Se a banca cobrar, o argumento é este mesmo: você esperava que eles contribuíssem para ter o melhor resumo possível e por isso decidiu esperar, não querendo apresentar um abstract psicodélico, realizado por uma máquina, desumanizadora…Em minha opinião, esta deveria ser uma recomendação padrão das instituições de ensino superior.
Chamadas de referência…mas onde está a referência?
Possivelmente eu possa comprar uma briga neste ponto. Pois trata-se de uma prática que eu vejo em congressos de alto gabarito, em dissertações de mestrado e, ocasionalmente, até em revistas científicas. Sei que é uma orientação metodológica, adotada por professores e pesquisadores.
Mas como vejo, não faz sentido algum utilizar uma chamada de referência bibliográfica em seu resumo!
Mais uma questão de lógica. No texto acadêmico, sempre que encontramos uma chamada de referência bibliográfica, algo do tipo (FULANO, ano), nosso instinto de leitores críticos seria o de buscar imediatamente a entrada correspondente na lista de referências, para averiguar de que autor se trata, de qual obra, etc. Afinal, esta é a base da argumentação acadêmica.
Mas no caso da chamada da referência no resumo, o ciclo não se fecha. Você, como autor, está usando retoricamente do nome de alguns autores – conhecidos ou não – a seu favor, como forma de lhe dar credibilidade e de mostrar que sua pesquisa tem fundamentação.
Mas quem são estes autores, efetivamente? De que obras se tratam? O resumo é um texto que deve se sustentar por si só, sem o trabalho completo. Em alguns casos, somente ele é incluído em bases de dados bibliográficas. E dessa forma, a chamada da referência perde totalmente seu sentido.
Por outro lado, pode-se argumentar que é necessário explicitar o referencial teórico do trabalho. Tudo bem, isto é válido. Mas as grandes linhas de pensamento, os autores de maior influência em determinado campo devem ser imediatamente reconhecidos como tal, não precisando da chamada de referência de uma obra específica.
Concluindo…
Com estes três fatos, que provavelmente ninguém nunca lhe contou, espero que você possa ser mais elegante, lógico e eficaz do ponto de vista da comunicação em sua redação acadêmica. E parafraseando Umberto Eco, estes são valores e habilidades que não se limitam à academia, mas que são úteis para a vida.