Resumo

Este trabalho resultou de uma análise da teoria educacional brasileira recente acerca do tema das relações entre disciplina e educação, inclusive a educação escolar. Ele teve início com um levantamento e classificação dos textos de domínio público que, pondo tal assunto em discussão, materializaram-se em dissertações e teses defendidas nos principais programas brasileiros de pósgraduação em Educação, em artigos publicados nas principais revistas educacionais do Brasil e nos livros editados em território nacional, todos na última década do recém-terminado século XX. O critério utilizado nessa classificação foi o tipo de abordagem teórica realizada pelos especialistas ao elaborarem suas reflexões. Dois desses tipos foram identificados: o primeiro, no qual os educadores se aproximavam do tema da disciplina pela via da interpretação psicológica do fenômeno educativo, transformava tal tema num problema em cujo equacionamento, inspirado na psicologia educacional elaborada no âmbito do escolanovismo, a noção de espontaneidade aparecia como principal raiz, e portanto como forma principal de solução. O segundo, em que educadores abordavam o tema da disciplina visando-o na perspectiva de uma interpretação política do fenômeno educativo, transformava o mesmo tema em um problema em cujo equacionamento, influenciado pela arqueogenealogia foucaultiana, a noção de poder irrompia como raiz mais importante, e assim, como seu ponto de deslindamento. Em seguida, tendo em vista a indicação dos fundamentos científico-filosóficos dos dois tipos de aproximação do tema, bem como o exame crítico dos equacionamentos do problema no qual esses tipos de abordagem transformaram o tema, procedeu-se a uma retomada crítica do conceito de epistemologia, realizando-se, simultaneamente, uma discussão sobre o que significa fazer uma abordagem psicológica tanto quanto uma abordagem política da educação. A retomada crítica da noção de epistemologia e a discussão do significado das abordagens psicológica e política da educação levaram-nos à conclusão de que ao erigir as noções de espontaneidade e poder em raízes pelas quais se soluciona o problema das relações entre educação e disciplina a recente teoria educacional brasileira constituiu uma injustificável e inaceitável redução do fenômeno educativo, ora à sua dimensão psicológica, ora à sua dimensão política. E isso com todas as suas piores conseqüências. Surgiu então o desafio da proposição de uma abordagem do tema da disciplina cuja problematização, ao mesmo tempo em que incorporasse o reconhecimento das dimensões psicológica e política do problema humano e educacional da disciplina negasse-as como definidoras do humano, numa superação que só poderia produzir-se se o transformássemos num problema em cujo equacionamento a principal raiz fosse a centralidade do dado histórico da consciência, vale dizer, se abordássemos o tema da disciplina nos termos em que o faz a Antropologia filosófica, que equaciona o problema da humanidade do homem como mediação subjetiva entre o homem como dado natural e o homem com expressão formal. Essa a tarefa que procuramos cumprir nesse trabalho, isto é, propor e fundamentar uma tal abordagem do tema da disciplina e oferecer novos subsídios para o enfrentamento desse problema que ocupa hoje um lugar tão importante nas preocupações de pais e educadores. 

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