Resumo
O objetivo dessa dissertação foi compreender os significados do ser criança nos contextos de pobreza urbana e rural. Para tanto, realizamos uma pesquisa-ação que teve os diários de campo e a elaboração de um livro infantil como principais instrumentos de coleta de dados. Durante a trajetória de campo visitamos três escolas de realidades sociais distintas dentro do contexto de desigualdade social: uma escola do campo, uma escola itinerante em um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e uma escola situada em uma região caracterizada como favela. Nossas reflexões teórico-metodológicas e a análise dos dados estiveram pautados nos pressupostos marxianos e da Psicologia sócio-histórica. Considerando que as crianças vivem seu universal no particular, nossos resultados apontam na direção de que, ao mesmo tempo em que essas três formas de vivenciar a infância se assemelham, elas se distanciam. No campo, elas nos mostram o assombro com a iminência do trabalho, as relações contraditórias com a cidade e alertam sobre a relação homem-natureza. As crianças do acampamento nos mostram outra lógica de relações humanas que rompem com o modelo capitalista aliando as dimensões do trabalho e da educação; mesmo no coletivo, cada criança é única e, imersas na dinâmica do movimento social, aprendem desde cedo a questionar, decidir e reivindicar seus direitos. No morro, elas denunciam a presença do tráfico de drogas, o apelo ao consumo e a sexualização da infância. Em comum essas crianças têm o brincar cujo sentido é experienciado de modo diferente em cada contexto. Em nossas discussões buscamos construir uma reflexão sobre a dimensão do trabalho, educação e o brincar do campo ao morro; discutimos sobre as determinações capitalistas sobre o ser criança contemporâneo e tecemos críticas à ciência psicológica que tem instrumentalizado, ao longo da história, diversas concepções sobre o desenvolvimento infantil - a maioria delas pautadas em visões naturalizantes que fundamentam práticas na contramão da transformação social e emancipação humana, especialmente a criação, que instrumentaliza o brincar