Resumo

Iniciar um texto com uma pergunta parece bastante comum, no entanto terminá-lo com o mesmo ponto de interrogação parece estranho se pensarmos a partir da ciência clássica, leia-se “positivista”, predominante em nossa área no último século. O que se pretende com este breve ensaio é apresentar um “ponto de vista” (entre muitos outros), que tem como pressuposto a complexidade dos fatos, neste sentido, não se pretende concluir ou esgotar o assunto, mas elaborá-lo a partir de pesquisas realizadas e experiências vividas no cotidiano escolar.

Muitas são as teorias que surgiram e diretrizes que foram elaboradas nas últimas décadas para a área de Educação Física, especialmente para o contexto escolar. As diferentes “tendências” (GHIRALDELLI JR.,1986) ou “abordagens pedagógicas” (DARIDO, 2006), apresentadas por estes e outros autores, bem como as Diretrizes e Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), Currículo Básico para Escola Pública do Paraná (1990) e Diretrizes Curriculares Estaduais (2006, 2008), nos permitem refletir e tentar identificar se estas propostas realmente se concretizaram, de forma significativa, no contexto escolar.

A intenção não é confrontar teoria e prática, mesmo porque parte-se do pressuposto de que ambas não acontecem separadamente, no entanto se faz necessário refletir sobre o “dito” e o “feito”.

Se fizermos uma análise da bibliografia – livros e artigos – referente ao tema Educação Física Escolar, publicados na última década, podemos perceber que a todo o momento existe a preocupação com “mudanças”. Essa preocupação manifesta-se ora por meio de críticas ao status quo, ora elaborando novas propostas para o Ensino da Educação Física na Escola. Será que esta preocupação e essas informações chegam ao Professor? Será que o Professor concorda com a necessidade e tem interesse em mudar? Será que as instituições de Ensino Superior estão formando profissionais capazes de realizar mudanças? Será que a Escola está preparada para mudar? Essas e muitas outras perguntas devem ser feitas para entender um pouco da complexidade desse tema.

Apesar das dificuldades vamos tentar pensar sobre o assunto e para tal não poderia deixar de partir do meio e das experiências das quais faço parte, ou seja, o Curso de Educação Física da Universidade Estadual do Oeste do Paraná e as Escolas Públicas do Paraná, especialmente da região Oeste, nas quais trabalho com a Prática de Ensino e supervisão de estágio e participo da Formação Continuada dos Professores dessas Escolas, através de Cursos de Pós-Graduação e Extensão e do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE.

Outro fato importante para esclarecer é que acredito que existam problemas na área e que aceito e percebo a necessidade de mudanças, e que muitos colegas professores compactuam com esta idéia. Se não fosse assim, não estaríamos constantemente em “movimento”, buscando alternativas para melhorar. Essa dinâmica é e deve ser natural em qualquer área de conhecimento e intervenção.

Atualmente não se aceita mais a justificativa da falta de informação dos professores sobre as “novas” propostas para a Educação Física Escolar, no entanto, o que temos percebido, é de que somente o conhecimento (de teorias e propostas) não é suficiente para estimular e provocar mudanças. Arriscaria dizer que talvez independente do conhecimento (pelo menos o conhecimento científico e sistematizado da área), mudanças, no que diz respeito às propostas tradicionais, ocorreram e ocorrem na Escola. Não tenho dúvida de que o conhecimento contribui para impulsionar as mudanças na área, porém, o processo de construção do conhecimento (novo) ocorre dialeticamente com a sua aplicação. Essa compreensão reforça a idéia da impossibilidade de separar teoria e prática. Isso significa dizer que muitas das propostas da Educação Física Escolar surgiram de experiências vividas (e criadas ou transformadas) por professores no cotidiano escolar e, por outro lado, muitas experiências são realizadas a partir de um conhecimento científico apreendido.

Outro questionamento levantado acima, diz respeito à qualidade da formação de professores nas Instituições de Ensino Superior. A esse respeito, neste momento vou me limitar a dizer que, da mesma forma que no contexto escolar, o processo de mudança está acontecendo, talvez com a vantagem de que as informações, no que diz respeito as novas teorias científicas, estão mais presentes e sendo impulsionadas e acontecendo com maior freqüência neste ambiente. O desafio do Ensino Superior deve ser, além da formação inicial qualificada, proporcionar a formação continuada através de cursos de Extensão e Pós-Graduação ou outros programas como, por exemplo, o Programa de Desenvolvimento Educacional, que acontece por iniciativa da Secretaria de Estado de Educação em parceria com as Universidades Públicas. Mas todos sabem que essas ações dependem, principalmente, de vontade política (principalmente porque exige financiamento).

Por falar em iniciativas políticas, a estrutura física e as condições materiais existentes nas Escolas Públicas, bem como os programas de Formação Continuada e o incentivo aos professores (inclusive financeiro), são de fundamental importância para contribuir nas mudanças que pretendemos. Não estou afirmando que sem essas condições não é possível mudar, mesmo porque, essas conquistas também fazem parte das ações da equipe pedagógica, incluindo o professor de Educação Física, mas que elas facilitam e estimulam a busca pela qualidade. Dar aula com condições adequadas, minimamente uma quadra de esportes em boas condições, uma sala de ginástica e de atividades rítmicas, bem como bolas, aparelho de som entre outros equipamentos e materiais, número de alunos compatível com o espaço físico, disponibilidade de carga horária para o professor realizar o apoio didático, entre outros aspectos de caráter didático-pedagógico, são direitos do cidadão bem como dever do poder público. Novamente reforçamos a idéia de que as “coisas” acontecem paralelamente, em interdependência umas com as outras ou dialeticamente, influenciando-se mutuamente.

O que encontramos na maioria das Escolas Públicas, são quadras esportivas em condições precárias, sem cobertura (o que inviabiliza as aulas nos dias de chuva), bolas e outros materiais esportivos em pequena quantidade e péssimas condições, turmas extremamente grandes, várias turmas e professores dividindo o mesmo espaço físico e materiais ao mesmo tempo, entre outros problemas. Essas questões afetam diretamente a qualidade das aulas e interferem na motivação de professores e alunos.

Outro aspecto que também tem dificultado as mudanças pretendidas no dia a dia da Educação Física, é a cultura que permeia esta área de intervenção, principalmente a concepção, do “senso comum” (presente nos ambientes onde a Educação Física acontece e muitas vezes reforçados pela mídia) que está fortemente vinculada a um conjunto de atividades e não a uma área de conhecimento cientificamente reconhecida.

Aproximadamente desde a década de 70, os estudiosos da área têm buscado elevar a Educação Física ao status de Ciência. Essa manifestação tem impulsionado às pesquisas e consequentemente a elaboração de teorias. Na área da Educação Física Escolar pode-se destacar a Educação Psicomotora; a Educação Motora; as abordagens desenvolvimentista, construtivista, crítico superadora, crítico emancipatória, cultural, saúde renovada e a proposta de jogos cooperativos. Quando pensamos nessas teorias aplicadas ao cotidiano escolar, elas se assemelham na proposição de prática pedagógica participativa, respeitando o ser humano integral, buscando formar cidadão críticos e autônomos, em oposição à Educação Física Tradicional.

Contextualizado o problema, voltamos a pergunta inicial: Sobre a Educação Física escolar: houve mudanças significativas nas últimas décadas?

A elaboração e a implantação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, das Diretrizes Curriculares Estaduais e da AMOP, as pesquisas desenvolvidas na região oeste do Paraná, o acompanhamento dos estagiários nas Escolas, o contato direto realizado com os professores da rede pública de ensino (através de reuniões, de cursos e da participação no Programa de Desenvolvimento Educacional) nos faz reconhecer o esforço dos professores em realizar mudanças, buscando compreender as novas propostas e aplicá-las. No entanto, quando se trata de efetivá-las, principalmente “como fazer acontecer” e torná-las permanente, aparecem algumas dificuldades, como por exemplo: a dificuldade natural do ser humano de aceitar as mudanças e de incorporar novas atitudes; a resistência por parte de alunos e de alguns professores em reconhecer a necessidade de mudar; a falta de compromisso do poder público de “fazer a sua parte”, entre outros. Mas, apesar das dificuldades, acreditamos nas conquistas efetivadas nos últimos anos e temos esperança, pelo esforço e dedicação percebidos, tanto de professores como do poder público, que o processo está acontecendo. No entanto, devemos manter “vigilância constante” para não deixar “a chama apagar”.

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