Resumo

Atualmente as artes marciais orientais são um elemento constitutivo da cultura corporal da cidade de São Paulo. Sua prática encontra-se disponível enquanto possibilidade de experiência. Em outras palavras, qualquer pessoa que deseje pode facilmente ter acesso a essas práticas corporais originadas nos países do extremo oriente. Mas como isso foi possível? Como um elemento de uma cultura tão diferente em relação a que existia em São Paulo pôde se estabelecer? Foi justamente para tentar responder a essas questões que escrevi este trabalho. Nesse sentido, a presente pesquisa se baseou em fontes orais, bibliográficas e documentais, para investigar parte do processo de introdução e disseminação de algumas das mais populares artes marciais orientais atualmente praticadas na cidade de São Paulo. Especificamente sobre as fontes orais, optei por uma estratégia que focou mestres imigrantes de três países: Japão, China (Hong Kong) e Coréia do Sul. A justificativa para tal estratégia reside no fato de que são esses os países onde se originaram algumas das artes marciais orientais mais populares, atualmente praticadas na cidade de São Paulo. Para análise dos depoimentos, foram observados os apontamentos de Alessandro Portelli (1997), para quem os relatos orais “são um documento do presente, compartilhados em sua responsabilidade tanto pelo depoente quanto pelo pesquisador”. Como resultado, observou-se que a introdução das artes marciais orientais, em muito, deve-se à imigração dos povos de origem oriental, iniciada nos anos iniciais do século XX, e que parte do sucesso no trabalho de disseminação dessas práticas deve-se ao processo de modernização, na perspectiva defendida por Norbert Elias (1994), ao qual elas foram submetidas. Essa modernização expressou-se na adoção em seus países de origem e também no país receptor, no caso o Brasil, de alguns padrões de trabalho corporal de origem européia, com destaque, nesse sentido, para o esporte e para os métodos ginásticos e também para o “controle da violência potencial” inerente a essas práticas. Verificou-se também que o período Pós II Guerra Mundial, mais especificamente nas décadas de 1960 e 1970, representou um novo momento no processo de disseminação dessas práticas na cidade, processo que até então vinha sendo promovido pelo trabalho exclusivo dos mestres imigrantes e que, a partir desse momento, começa a se beneficiar do surgimento de um terreno fértil para essas práticas advindo do aumento de sua visibilidade na cidade, um fenômeno gerado pela difusão em massa de produtos da indústria do entretenimento relacionados às artes marciais orientais. Por fim, verificou-se o papel de um fenômeno que teve início para algumas dessas práticas ainda nos anos finais do século XIX, em seus respectivos países de origem, mas que atualmente continua em curso, a esportivização. Nesse sentido, com o auxílio dos estudos realizados por Pierre Bourdieu (1990; 1983) e Norbert Elias (1994; 1992), verificou-se que os desdobramentos desse processo têm sido os responsáveis por um embate entre as tradições dessas artes marciais orientais e os anseios daqueles que são partidários do processo de modernização, ocidentalização e esportivização para essas práticas. Tal situação tem agido no sentido de tornar possível a associação das artes marciais na cidade de São Paulo a uma diversidade de sentidos, que, de alguma forma, buscam saciar os anseios dos atores sociais envolvidos no cotidiano das artes marciais, seja no trabalho de disseminação das práticas, seja no seu consumo

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