Resumo

O cenário de mudanças dos últimos anos impactou diretamente a escola e o ensino da Educação Física. Na tentativa de encontrar alternativas que possam responder ao atual contexto democrático, multicultural, globalizado e profundamente desigual, na esteira do movimento de reorientação curricular que alcançou otros componentes, surge uma proposta a partir das teorias pós-críticas, a denominada perspectiva cultural do componente. Dentre suas principais características, destacam-se: as práticas corporais são concebidas como artefatos da cultura; a educação física cultural questiona os marcadores sociais nelas presentes; busca reconhecer os seus sujeitos e promover o diálogo com as diferenças. Para tanto, posiciona professores e estudantes como autores do currículo por meio da leitura, ressignificação e produção de brincadeiras, danças, lutas, esportes e ginásticas. Tendo por objetivo, elaborar um mapa dos saberes docentes acerca das características epistemológicas e metodológicas da Educação Física cultural, o presente estudo recorreu à entrevista narrativa para produzir 17 relatos de experiência da Educação Física cultural em diferentes realidades. Os documentos foram submetidos à análise cultural mediante o confronto com as teorias pós-críticas. Como resultados mais relevantes, foi possível identificar os campos teóricos que inspiram as ações didáticas (estudos culturais, multiculturalismo crítico, pós-estruturalismo e pós-colonialismo); os princípios ético-políticos que levam os docentes a definir o tema e as atividades de ensino (reconhecimento da cultura corporal, justiça curricular, ancoragem social, evitar o daltonismo cultural e descolonização do currículo); os procedimentos didáticos adotados (mapeamento, vivência, leitura, ressignificação, aprofundamento, ampliação, registro/avaliação); e a concepção de conhecimento privilegiada nas aulas (toda a produção discursiva e não discursiva sobre as práticas corporais e os seus representantes). Para concluir, a análise dos relatos de experiência permite afirmar que a Educação Física cultural dá visibilidade à gênese e ao desenvolvimento contextual das práticas corporais. Como se viu, o acesso a esses conhecimentos prepara o ambiente para interpelar os significados implícitos nos discursos que desqualificam certas manifestações e exaltam outras. Para tanto, os docentes desenterram os saberes das minorias posto que sucumbiram à força dos setores dominantes, foram erradicados e desqualificados por não estarem à altura das definições do que se concebe como científico, correto ou benéfico.