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A utilização de atividades lúdicas na educação física escolar e a formação da criança"

Por meio de análise crítica da Educação Física desde o seu nascimento, pode-se observar que sendo ela uma prática pedagógica, suas tendências sempre surgem de necessidades sociais concretas, dando origem a diferentes entendimentos do que dela se conhece (COLETIVOS DE AUTORES, 1992).

O momento atual caracteriza-se por uma Educação Física escolar fortemente voltada para a prática do "esporte", ou seja, para o treinamento esportivo. A influência do esporte competitivo no sistema escolar é muito grande, a ponto de caracterizar a Educação Física como um prolongamento da instituição esportiva, subordinando-a aos seus códigos de rendimento atlético, de comparação, de competição, de regulamentação rígida, de racionalização de meios e técnicas, etc. Importante salientar que o esporte escolar por sua vez, apresenta-se subordinando a valores impostos pela sociedade capitalista em que vivemos. Estes códigos e significados revestem o processo educativo por ele provocado e reproduz, inevitavelmente, as desigualdades sociais (COLETIVO DE AUTORES, 1992).

A prática sistemática do esporte faz com que a escola mantenha os padrões dominantes da sociedade, não dando espaço para que o aluno desenvolva o seu aspecto crítico como agente transformador da sociedade, nem o seu aspecto criativo, como ser que é capaz não somente de reprodução de jogos e movimentos, mas também capaz de criar diante de situações - problemas a ele apresentadas.

A sociedade em que estamos inseridos sofre diversas mudanças, na qual conceitos e valores mudam constantemente. A indisciplina e a violência tornaram-se nos últimos anos, assuntos recorrentes nos meios de comunicação em massa. Surge inevitavelmente a seguinte questão: a exposição a formas de indisciplina e de violência faz com que as crianças tornem-se agressivas? Embora seja claro que a indisciplina e a violência como são apresentadas na televisão não é benéfica para as crianças, devemos ser cautelosos para não tornar a televisão um "bode expiatório" responsável pelos autoníveis de indisciplina e violência na sociedade.

Quando nos voltamos às escolas da periferia, principalmente nas grandes cidades, percebemos que os alunos presenciam uma realidade bastante diversa, sem conseguir apreender dela conceitos e valores éticos e morais. O dia-a-dia da maioria dessas crianças é marcado por cenas de assaltos, espancamentos, mortes, roubos, brigas com armas brancas e de fogo, entre outras. Muitos dos alunos chegam a presenciar estes acontecimentos dentro de sua própria casa. Assim, em casa e/ou na vizinhança essas crianças são constantemente expostas a realidades fortemente marcadas pela indisciplina e pela violência. Não fazer uso desta indisciplina e violência, perpassa caminhos da educação como um todo, que deve ser implementado e assumido por todos aqueles que tem a educação como principio capaz de emancipar indivíduos. Fazer compreender esta verdade é com certeza o maior de todos os obstáculos que temos a frente.

A indisciplina e a violência tornaram-se categorias que necessitam serem discutidas afim de que se possa romper o processo reprodutivo na sociedade dada. O agir agressivo tornou-se cotidiano, a desumanidade passou a ser o ponto referencial da humanidade e a falta de tempo se fez emblema para o nada fazer. Nesse contexto, a Educação Física deve oportunizar a criança uma variada gama de experiências, não só esportivista como na maioria das vezes é trabalhada. Todas estas experiências deverão estar orientadas para o processo de conhecimento do mundo e formação pessoal e social, participando ativamente na construção de sua cidadania.

Vê-se assim que "A Educação Física é um instrumento essencial para construir o ser humano que sonha o eterno e descontrai a violência" (DIAS 1996, p.19), ou seja, é por meio destas ações que se pode contribuir para a formação educativa dos indivíduos, possibilitando tornarem-se cidadãos integrados e participantes numa sociedade dada. Crianças quando expostas a experiências de indisciplina e violência estão inclinadas a autodesvalorização, ao baixo nível de confiança em si e nos outros. Sendo assim, torna-se necessário que ela adquira como referencias, exemplos positivos, ou seja, exemplos que possibilite refletir acerca do certo e do errado.
A família, primeiro referencial da criança, deve trazer em suas bases fundamentais a confiança, a auto-estima e o senso de agregação, somados a ética e ao respeito. Valores que no atual momento apresentam-se escassos. Segundo Dias (1996, p.49), a principal causa de indisciplina e violência contra a criança encontra-se "no seio da família", ou seja, o principal lócus produtor e reprodutor da indisciplina e da violência parte do ambiente familiar. É preciso discutir e procurar soluções para os problemas coletivos almejando uma nova prática pedagógica na escola e fora dela, voltada para o "DESENVOLVIMENTO integral", e não apenas para o "ATENDIMENTO integral".

Os atuais Parâmetros Curriculares Nacionais destacam "(...) a visão de que a constituição da sociedade é um processo histórico permanente permite compreender que estes limites são potencialmente transformáveis pela ação social. E aqui é possível pensar sobre a ação política dos educadores. A escola não muda a sociedade, mas pode, partilhando esse projeto com seguimentos sociais que assumem os princípios democráticos, articulando-se a eles, constituir-se não apenas como espaço de reprodução, mas também com espaço de transformação. (BRASIL, 1997, p.26)".

Segundo Darido (2001, p9) a Tendência Interacionista Construtivista, objetiva a interação do sujeito com o mundo. Nesta concepção a aquisição do conhecimento é um processo construído pelo indivíduo durante toda a sua vida. Ainda segundo Darido (2001, p10) a principal vantagem desta abordagem é que ela possibilita uma maior integração com uma proposta pedagógica ampla e integrada da Educação Física Escolar. Deve-se resgatar a cultura (popular) de jogos e brincadeiras dos alunos envolvidos no processo ensino-aprendizagem, incluindo as brincadeiras de rua, os jogos com regras, os brinquedos cantados dentre outros que compõem a vivência cultural dos alunos. Além de valorizar suas experiências, sua cultura, à proposta construtivista também tem o mérito de propor uma alternativa aos métodos diretivos, tão impregnados na prática da Educação Física. O aluno constrói o seu conhecimento a partir da interação com o meio, resolvendo problemas. "Na proposta construtivista o jogo enquanto conteúdo/estratégia tem papel privilegiado. É considerado o principal modo de ensinar, é um instrumento pedagógico, um meio de ensino, pois enquanto joga ou brinca a criança aprende. Sendo que este aprender deve ocorrer num ambiente lúdico e prazeroso para a criança". (DARIDO, 1999, p.23).

A brincadeira e o jogo são situações em que a criança reflete, ordena, desorganiza, organiza novamente, destrói e reconstrói o mundo a sua maneira. É também um espaço onde a criança pode expressar, de modo simbólico, suas fantasias, seus desejos, medos, sentimentos agressivos e os conhecimentos que vai construindo a partir das experiências que vive. Portanto, o jogo possibilita a percepção total da criança, em seus aspectos motores, afetivos, sociais e morais, revelando também muito das estruturas mentais sucessivas da criança. As próprias crianças podem estabelecer relações de troca, elas aprendem a lidar com regras observando que poderão algumas vezes ganhar e outras, perder.

Para se desenvolver, a criança, precisa aprender com os outros, por meio de relações de troca e afeto, ampliando suas relações sociais, interações e formas de comunicação, pois, só assim poderá se sentir segura para expor suas dúvidas e curiosidades. Nesse processo, todo o conhecimento emerge de uma construção pessoal e social, na qual a criança tem um papel ativo compartilhado com o grupo.
Desde o primeiro ano de escolarização, as brigas e as discussões surgem muito cedo entre as crianças, tanto no pátio da escola como dentro da sala de aula ou na quadra durante as aulas de Educação Física. Manifestações espontâneas da vontade de apropriar-se de um objeto ou um território, de impor seu projeto, são, com freqüência, a única maneira, embora arcaica, que a criança encontra para regular os seus conflitos. Essa violência é inerte as relações sociais e é inútil e perigoso negá-la. É preferível considera-la como resultado de múltiplas interações, manifestando-se em circunstâncias precisas, como: reação à violência do outro, do meio, como resposta a um estresse ou uma frustração, como desejo de impor-se em seu meio social (realidade que vive no dia a dia). Portanto devemos considera-la como modo de expressão e de comunicação, para que a própria criança seja capaz de situa-la em suas relações com os outros, trazendo respostas às interrogações que violência e indisciplina provocam.

O jogo é uma forma de conhecimento produzido pelos homens desde os primórdios da humanidade, no qual o prazer (o lúdico) e o desafio estão presentes nessa prática social, em suas diferentes formas (jogos individuais, jogos coletivos, jogos com regras simples, jogos com regras mais complexas). O jogo é uma prática originalmente, comum a crianças e adultos, indistintamente, possibilitando a relação do indivíduo com o coletivo, com a comunidade a que pertence. É um fenômeno social, ou seja, é resultado de uma cultura, com seus costumes e tradições, por isso há diferenças na forma de jogar e o desconhecimento de determinados jogos por alguns grupos sociais.

Eles são elaborados pelas pessoas de acordo coma as oportunidades sociais, costumes e tradições; assim como existe, também a incorporação de jogos de outras culturas. Aí, a importância de oportunizar ao nosso educando a apropriação dos mais variados tipos de jogos e brincadeiras vivenciados pelos nossos antepassados, inserindo-o na memória coletiva da humanidade para que de posse desse conhecimento possa ele reelaborar novos jogos, ampliando esse riquíssimo acervo cultural, criando novas opções de lazer em seu cotidiano.

Concluindo, a escola oferece inúmeras disciplinas que devem trabalhar o conhecimento humano acumulado até então, porém até o momento não consegue fazer com que educandos utilizem tais conhecimentos na vida, nem que faça relações. " O grande desafio é integrar o aluno, para fazê-lo, é necessário mais do que conhecimento, é preciso fazer um trabalho que desperte a responsabilidade, o comprometimento do aluno e de sua família" (TIBA, 1998, p.170).

É através do jogo que a criança descobre um mundo novo, onde cria situações e resolve a seu modo, encontra novos significados e age conforme sua compreensão. No jogo a criança experimenta situações diferentes, testa sua percepção que o auxilia em outras atividades, este é o momento em que deixa ser levada pela brincadeira, incorporando-as e desenvolvendo habilidades que necessitam ser moldadas.
A incorporação de diversas atividades através do brinquedo, faz com que a criança, comporte-se muito além do habitual de sua idade. As representações bem como as brincadeiras de faz de conta, são simbolismos de objetos e ações que fazem parte de aprendizagem, da construção do conhecimento.

Os jogos, as brincadeiras, devem sempre dar condições para que todos os que pratiquem sintam prazer em estar fazendo uma atividade que lhes tragam o autodesenvolvimento e não uma oportunidade de destruir os outros, preponderantemente, estas atividades lúdicas favorecem a socialização, contribuindo ativamente à não violência e indisciplina, pois a participação em jogos contribui para a formação de atitudes sociais: respeito mútuo, solidariedade, cooperação, obediência às regras, senso de responsabilidades, disciplina, iniciativa pessoal e coletiva. É jogando que se aprende o valor do grupo como força integradora pelo sentido da competição salutar e da colaboração consciente e espontânea, contribuindo assim na formação de um cidadão crítico e transformador do ambiente (sociedade) em que vive.

Obs. Os autores, professores Ms.Gisely Rodrigues Brouco (gy_pr@yahoo.com.br) é aluna da UNESP e João Carlos Carvalho Queiroz (msjoca712@hotmail.com), ambos trabalhando no UNIANDRADE - Centro Universitário Campos de Andrade (PR).

Bibliografias consultadas

  • Betti, Mauro. Educação Física e sociedade. São Paulo: Ática, 1991.
  • Brasil, Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF. 1998.
  • Coletivo de  autores. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.
  • Costa, Vera Lúcia M. Prática da Educação Física no 1º grau: reprodução ou perspectiva de transformação? São Paula: IBRASA, 1987.
  • Darido, Suraya C. Educação Física na Escola: Questões e
  • Reflexões. Araras, SP: Topázio, 1999.
  • Darido, Suraya C. Os conteúdos da Educação Física Escolar: influências, tendências, dificuldades e possibilidades. Niterói, RJ: Perspectivas em Ed. Física Escolar, v.2, n.1 (suplemento), 2001.
  • Dias, K. P. Educação Física X Violência. RJ: Sprint, 1996.
  • Freire, João Batista. Educação de Corpo Inteiro: teoria e prática da Educação Física. SP: Scipione, 1997.
  • Lima, Elvira S. Desenvolvimento e aprendizagem na escola: aspectos culturais, neurológicos e psicológicos. São Paulo: GEDIT, 1997.
  • Montageu, A. A natureza da Agressividade Humana. RJ: Zahar,1978.
  • Tiba, Içami. Ensinar aprendendo: como superar os desafios do relacionamento professor - aluno em tempos de globalização. SP: Gente, 1978.
  • Velasco, Cacilda. Brincar, o despertar psicomotor. Rio de janeiro: Sprint, 1996.