Resumo

Introdução e objetivo(s) da vivência. No mês de Fevereiro de 2019, pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá realizaram três visitas técnicas à municípios próximos de Maringá-PR para aplicar, junto aos gestores públicos responsáveis pela pasta esportiva, um piloto do instrumento de pesquisa do projeto de pesquisa Inteligência Esportiva (IE). O projeto é uma ação conjunta entre o Centro de Pesquisa em Esporte, Lazer e Sociedade (CEPELS) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) junto à Secretaria Nacional de Esporte de Alto Rendimento (SNEAR) da Secretaria Especial de Esportes do Ministério da Cidadania, além da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Seu objetivo é produzir, aglutinar, sistematizar, analisar e difundir informações sobre o esporte de alto rendimento no Brasil e analisar as políticas públicas para o esporte de alto rendimento. Como consequência desse projeto está sendo proposto uma rede de esporte, com vistas a diagnosticar o sistema esportivo brasileiro por meio de coleta de dados dos diferentes entes federados buscando melhorar o nível de informação esportiva. Sendo assim, com a colaboração de pesquisadores e gestores de esporte foi elaborado um instrumento de análise baseado em quatro principais dimensões: (1) Estado; (2) Entidade; (3) Pessoas; (4) Política para o esporte. O instrumento permite o diagnóstico e o mapeamento das questões relativas à política pública e gestão do esporte em várias frentes, tendo como foco analítico os respectivos segmentos: a caracterização do estado ou cidade; do órgão responsável; questões de governança; caracterização do gestor; caracterização do quadro funcional; legislação; avaliação das instalações esportivas; além da apreensão da cultura esportiva local, coadjuvando para que as informações obtidas possam vir a subsidiar a elaboração de um banco de dados. Diante do exposto, o presente relatório tem como objetivo apresentar a descrição ou relato de experiência das impressões obtidas nos encontros com os gestores municipais de esporte. Descrição da vivência. Todos os encontros tiveram duração de aproximadamente uma hora, sendo que os compromissos puderam ser firmados com pelo menos cinco dias de antecedência. Além disso, todas as conversas foram gravadas com o consentimento dos gestores, já que as análises requeriam cautela devido à quantidade de informações que puderam ser obtidas. De início, relataremos a primeira experiência adquirida junto à gestão esportiva da cidade de pequeno porte I, no dia 12/02, encontro em que participaram, além dos investigadores, o Diretor de Esporte e Lazer e três técnicos esportivos que os auxiliavam durante o procedimento de aplicação. A cidade tem a população estimada pelo IBGE (2018) em 13.939 habitantes, com o PIB per capita (2016) de R$ 31.904,76, ocupando o lugar 146º no estado, e com o IDHM de 0,704, valor considerado alto. As impressões sobre o processo de aplicação do instrumento foram positivas. Percebeu-se que o Diretor, a princípio, mostrava-se um pouco apreensivo, havendo momentos em que os técnicos tomavam frente nas respostas fornecidas aos investigadores. Entretanto, o procedimento de aplicação do instrumento pôde ser realizado integralmente. Percebe-se que há limitações por parte do Diretor nos conhecimentos referentes à sua própria atuação como gestor público, caso haja a consideração de que o mesmo deveria ter respondido o instrumento de maneira concludente. Essas limitações podem ter relações com a dimensão do município e a pouca experiência do gestor no cargo. O segundo relato refere-se ao dia 26/02, no município de pequeno porte II, com os investigadores podendo aplicar o instrumento junto ao Coordenador de Esportes. A cidade tem a população estimada pelo IBGE (2018) em 21.122 habitantes, com o PIB per capita (2016) de R$ 27.970,20, posição 164º no estado, e com o IDHM de 0,747, considerado alto. As impressões sobre o processo de aplicação do instrumento também foram consideradas positivas. Aqui, diferente do relato anterior, a aplicação do instrumento contou apenas com a presença do Coordenador. Dentro da estrutura política municipal, o Coordenador de Esporte está abaixo da Diretora de Educação, já que a pasta foi anexada junto à educação. Porém, como se tratava de questões mais profundas sobre o cenário esportivo do município, entendeu-se que o Coordenador poderia ter uma contribuição maior em relação à Diretora devido a sua atuação restringir-se apenas às questões ligadas ao esporte. Durante o desenvolvimento da aplicação percebeu-se que o gestor detinha domínio sobre os conhecimentos necessários para a atuação administrativa e política. O mesmo revelou ocupar um cargo no Conselho Regional de Educação Física (CREF), e desde jovem esteve envolvido junto à área, havendo passado por outras experiências profissionais que o habilitavam para o exercício do cargo. Conclui-se a partir dessa experiência que quanto maior o conhecimento do gestor público, mais descomplicado se torna a aplicação. O terceiro e último relato concerne ao dia 26/02, realizado em um município de grande porte junto ao Secretário de Esportes. A população estimada pelo IBGE (2018) é de 121.198, com o PIB per capita (2016) de R$ 34.462,70, classificado como 92º no estado. Seu IDHM é de 0,748, considerado alto. As impressões sobre o processo de aplicação, neste caso, podem ser consideradas menos positivas consideradas as experiências anteriores. Comparada aos outros municípios, a cidade notabiliza maior número de habitantes, consequentemente, intui-se que há um direcionamento mais eficiente acerca das políticas esportivas. Entretanto, o que se pôde notar foi uma gestão pouco instrumentalizada sobre os conhecimentos e saberes técnicos que envolvem a pasta de esporte. Diferentemente do encontro na cidade de pequeno porte II e mais próximo das experiências da cidade de pequeno porte I, o Secretário mostrou-se desconfortável durante todos os momentos por conta da presença dos investigadores. As perguntas direcionadas, por vezes, não retornavam através de respostas condizentes com o conteúdo da própria pergunta. Também eram notáveis sinais de impaciência por parte do Secretário. O episódio evidenciou dificuldades de aplicação do instrumento. Tais embaraços, por hipótese, podem estar relacionados à indisposição e falta de conhecimento do gestor esportivo. Reflexões e implicações para a área. A partir da experiência na aplicação deste instrumento piloto evidenciamos alguns aspectos, como: [a] a pessoa mais capacitada para responder informações referentes à pasta nem sempre é o gestor máximo do órgão; [b] a aplicação de alguns aspectos do instrumento é condicionada ao porte do município, pois a capacitação técnica em alguns casos não está preparada para responder questões um pouco mais complexas acerca da gestão ou mesmo conceitualmente do esporte. Portanto, para obter as informações pretendidas é necessário que a linguagem do instrumento seja acessível para o gestor; [c] os gestores do esporte não possuem dados concretos sobre suas ações, em muitos casos o esporte está sendo desenvolvido nos municípios, mas não há um controle sobre quais as ações que são desenvolvidas, quais os profissionais envolvidos, qual o orçamento gasto e principalmente o qual é número de pessoas atendidas. Essas informações seriam essenciais para a transparência e o controle do poder público. Como exemplo, em órgãos públicos de educação, saúde e assistência social, todos os dados são sistematizados e os gestores possuem o controle do que está sendo desenvolvido. Acreditamos que no sistema federativo brasileiro, assim como aconteceu nessas outras áreas de atuação do Estado, iniciativas para o controle de informações referentes às políticas públicas de esporte devam partir de um modelo top-down, talvez condicionando o financiamento às exigências de governança.