Integra

Atualmente, o mundo prega o conforto a partir dos avanços tecnológicos em meio à sociedade. São inúmeros produtos fabricados para que cada vez mais o homem se sinta confortável em seu ambiente de trabalho, em seu lar, em sua vida social.

Contudo, tal conforto mascara posturas que praticadas com freqüência, conduzirão o indivíduo a experimentar dores, lesões e/ou quadros clínicos agudos ou crônicos de doenças relacionadas aos ambientes em que comumente freqüenta.

Lima (2003), ao perceber as mudanças posturais causadas pelo excesso de tempo em uma mesma posição, diz que: "(...) se uma pessoa permanece muito tempo em um determinado padrão postural, provocará uma adaptação muscular e ligamentar compatível com o referido padrão, ou seja, uma região irá se adaptar mais encurtada e outra mais alongada." (pág. 180)

Crianças que passam de 4 a 8 horas por dia (horário integral) numa escola têm nesse momento uma atenção merecida. Tal carga-horária é basicamente vivenciada em sua maior percentagem na posição sentada (e são crianças!). E é aí que iniciam os problemas: que posturas tais crianças adotam ao sentar-se, ao passar boa parte do dia assimilando atividades cognitivas, enquanto a escola não se importa com uma postura osteomusculoarticular que sustenta todo o organismo, inclusive o cognitivo?

Ao iniciar um trabalho de ARPE (Alongamento Reeducativo da Postura em Escolares) - baseando-se em técnicas da RPG, desenvolvido com alunos da alfabetização a 4ª série, percebi que atividades que exigiam fechamento de quadril (flexão coxofemoral abaixo dos 90°) não eram executadas com eficiência por praticamente 90% do alunado pesquisado.

A maioria dos alunos apresentava até dificuldades de sustentar-se na posição sentada com as pernas esticadas, mantendo-se a 90°. Conseqüentemente, com o passar dos anos, a tendência é de que a abertura do ângulo de flexão do quadril aumente, ou seja, quanto maior for o grau de abertura maior será o quadro de dificuldades.

Conscientizar-se da própria postura não é fácil. Daí a importância que o desenvolvimento psicomotor assume diante da formação da criança.

Dentre os fatores abrangidos pelo desenvolvimento psicomotor, destaca-se neste trabalho Esquema Corporal, por meio do qual a criança toma consciência de seu corpo e das possibilidades de expressar-se por seu intermédio.

O MEC/SEESP, ao lançar Linhas Programáticas para ao Atendimento Especializado na Sala de Apoio Pedagógico Específico (1994), cita Wallon para dizer que "o esquema corporal é a representação relativamente global, científica e diferenciada que a criança tem de seu próprio corpo". (pág. 9)

Neste aspecto, a consciência corporal, ou seja, a interpretação das diferentes partes do corpo no tempo e no espaço pela criança é fundamental para que ela saiba entender-se e corrigir-se quando necessário em se tratando de sua postura.

Paralelamente à tomada de consciência do próprio corpo, é necessário que se implante o programa ARPE (Alongamento Reeducativo da Postura em Escolares) nas escolas, com o intuito de melhorar a funcionabilidade das estruturas musculo-articulares visando uma melhor qualidade física futuramente. O ARPE baseia-se em técnicas desenvolvidas na RPG da Fisioterapia para desenvolver na criança, a consciência corporal global, através de um programa de alongamento contínuo (ver anexo) que visa trabalhar a cadeia muscular global do indivíduo para melhorar o aparelho músculo-esquelético do mesmo.

LIMA (2003) cita Guiselini para afirmar que: "O sentido cinestésico envia informações ao cérebro sobre a funcionabilidade do corpo no que diz respeito às posições, alterações posturais, grau de tensão/relaxamento, amplitude do movimento, entre outros aspectos." (pág. 187)

Para que isto ocorra, é fundamental que tais sentidos e percepções sejam desenvolvidos quanto mais cedo melhor. É importante que desde a inserção da criança na vida escolar, seja trabalhado a importância das posturas adequadas em diferentes situações para que se tenha uma vida futura com qualidade e, despertando naqueles que tendem para o esporte de alto nível, o valor que o alongamento e a flexibilidade assumirão em seus desempenhos.

Como sabemos, não somente os cabelos envelhecem mas todo o nosso organismo. É fácil cuidarmos daquilo que a olho nu podemos ver, mas podemos sofrer conseqüências desastrosas com a saúde em idade avançada a partir de problemas que ao longo da vida, sorrateiramente foram se instalando no organismo por nossa própria culpa. E da escola! Pois é dela a responsabilidade de formação da criança, não somente intelectual, mas, sobretudo, como pessoa humana integral. Fazer com que o aluno consiga aprender a seguir aprendendo é uma das metas do ensino moderno e, um grande desafio para a escola na atualidade.

Metodologia da pesquisa

As atividades da referida pesquisa são as que se seguem e, por objetivar a consciência corporal da criança para uma melhor postura, serão a base deste trabalho prático de alongamento e estabilização das cadeias musculares alteradas ao longo da vida, respeitando a individualidade de cada um, suas limitações e/ou capacidades físicas:

Atividades

Todas as posturas deverão incluir os braços em posição anatômica para que alongue também as cadeias musculares destes membros já em contração contínua. Os tempos estabelecidos para cada postura dependerão do feeling do professor, mas não devem ultrapassar sua manutenção sucessiva por mais que 3 min, pois todas as formas posturais são mantidas por força isométrica localizada e por isso, podem levar a fadiga.

1ª atividade: sentado, mantendo a coluna ereta com as curvaturas normais realizando um ângulo de 90º em relação ao quadril, respiração apical, pernas em posição de lótus (Buda) caso esteja sentado no chão e, pernas formando ângulo de 90º com a coxa, devendo os pés estar com toda a planta sobre o solo caso esteja sentado numa cadeira ou banco.

2ª atividade: postura da bailarina, que consiste em estar de pé, com os pés às 12h e 55min ,devendo os calcanhares estar unidos, joelhos com rotação externa e semiflexão. O tronco deverá inclinar-se para frente à medida que se empina o bumbum. A flexão de tronco variará de pessoa para pessoa tendo em vista as dificuldades individuais e, seu ponto de referência será a manutenção das curvas normais da coluna vertebral. O prof. orientará o aluno para a flexão mais ou menos acentuada do tronco, permitindo um maior alongamento da cadeia muscular posterior. É ele quem irá determinar o quanto a criança pode flexionar o tronco.

3ª atividade: em decúbito dorsal, realizar-se-á uma flexão de quadril e simultaneamente de joelho, aproximando ambos os membros inferiores do peito. Deverá se ter o cuidado de não retirar a região lombar do solo.

4ª atividade: os alunos devem estar sentados em círculo, com as pernas afastadas lateralmente. Dever-se-á, em seguida, escolher uma das pernas, realizar uma flexão lateral do trono com a extensão dos braços sobre a perna escolhida. Após o tempo estabelecido pelo professor, trocar a atividade para a outra perna.

5ª atividade: ainda com as pernas afastadas, direcionar o tronco para dentro de ambas, solicitando do aluno, a manutenção da postura em seu limite individual.

6ª atividade: com as pernas em "posição de Buda", manter-se sentado realizando uma respiração mais apical, mantendo a homeostase dos músculos anteriores e posteriores no equilíbrio.VARIANTE: manter a mesma postura, porém de pernas esticadas. Esta última é a atividade que demonstrará a evolução do trabalho realizado. O aluno deverá estar sentado, mantendo-se sem maiores esforços e dores a postura ideal.

7ª atividade: esta atividade fica a critério do professor, pois exige um nível maior de concentração, força e captação de O2 por parte do aluno. Portanto, é conveniente que se faça com crianças maiores. Utiliza-se de uma parede onde os alunos deverão estar de pé e recostados. A posição inicial deve ser a mesma descrita na postura da bailarina. O aluno deverá manter encostado na parede a cabeça com a nuca alta, toda a coluna e, com o "bumbum encaixado", encostá-lo suavemente. As pernas em semiflexão resistirão ao peso do corpo. A respiração mantida deverá ser apical e para que a coluna esteja estabilizada na altura da lombar, os pés deverão se afastar da parede tanto quanto for necessário para que esta esteja totalmente e com suavidade, encostada também na parede. O professor deverá corrigir os possíveis erros individuais mantendo a atenção para possíveis ocorrências de quadros de tonturas ou desmaios. A atividade deve terminar com a tração que o professor fará em cada aluno, que consiste em sustentar seu peso com ambas as mãos postas com pressão nas laterais da cabeça e parte frontal da mesma, com os polegares, na porção inferior da "maçã do rosto". O aluno, neste momento deverá arriar o corpo como se fosse sentar no chão, enquanto o professor sustenta seu peso pela cabeça. Isto levará a um alongamento de toda a coluna vertebral, sobretudo da região cervical. Em seguida o aluno, lentamente, voltará a posição ereta deslizando os calcanhares em direção à parede à medida que respira simultaneamente.

Avaliação dos resultados:

Marcar inicialmente com um lápis dermatoglífico ou caneta hidrocor as pernas do aluno após ele ter feito uma inclinação de tronco buscando deslizar as mãos pelas pernas até alcançar o seu limite máximo de flexão.

Após as atividades precitadas, realizar novamente este procedimento para avaliar quantos e qual o percentual de ganho entre os alunos.

Obs.: não se deve tomar esta postura da avaliação como uma forma de atividade para alongamentos neste programa. A mesma só será utilizada por questões avaliativas, pois a persistência da mesma pode causar deslizamentos intervertebrais.
O autor, André de Brito Oliveira leciona no CIEP 460 - Thiophyla Bragança, Araruama, RJ

Referências bibliográficas

  •  Lima, Valquíria de. Ginástica Laboral: atividade física no ambiente de trabalho. Ed. Phorte, 1ª ed., São Paulo - 2003.
  • SEE: Linhas Programáticas para Atendimento Especializado na Sala de Apoio Pedagógico Específico. MEC/SEESP, Brasília - 1994.
  • Harrow, Anita J. Taxionomia do Domínio Psicomotor: manual para a elaboração de objetivos comportamentais em Educação Física. Ed. Globo, 2ª ed., Rio de Janeiro - 1988.
  • Lima, Valquíria de. Ginástica Laboral: atividade física no ambiente de trabalho. Ed. Phorte, 1ª ed., São Paulo - 2003.
  • SEE: Linhas Programáticas para Atendimento Especializado na Sala de Apoio Pedagógico Específico. MEC/SEESP, Brasília - 1994.
  • Souchard, Ph.E. O Stretching Global Ativo: a reeducação postural global a serviço do esporte. Ed. Manole Ltda, 1’ª ed., São Paulo - 1996.