Resumo
Os objetivos deste estudo foram: explicitar os diferentes sentidos do feminino que aparecem nas imagens veiculadas pela revista Claudia entre 1960-1999; identificar as crenças sobre o papel da mulher que perpassam nas imagens ao longo do tempo e identificar os mitos que estão presentes no discurso imagético da revista. Para tanto, analisamos as narrativas e imagens pictográficas enfocando a mulher na família, no trabalho e no lazer presentes no periódico em questão no período determinado. Analisando os discursos que emergiram da composição textual e imagética da revista, verificamos que os anos 60 e 70 desenham uma mulher frágil, submissa, compreensiva, afável, elegante, portadora de um instinto “natural” para o sacrifício e para se dedicar aos outros. Esses adjetivos persistem durante o período analisado, mas, a partir da década de 80, eles começam a conviver com outros atributos como a autonomia, uma postura mais arrojada, um espírito de ir à luta na busca da satisfação pessoal em bases mais abrangentes e um desejo de tornar sua sexualidade mais explícita. Diante das novas perspectivas que se abrem à sua frente, a mulher descobre a possibilidade de se realizar também em outras instâncias que não apenas por meio da maternidade e do casamento. Demeter, Hera, Afrodite e Atena se alternam na configuração mítica do feminino que transita pelas três instâncias do cotidiano da mulher que nos propusemos a analisar: família, trabalho e lazer. Demeter na figura emblemática da mulher-mãe. Hera nos cuidados com o casamento, no sentido de guardiã dessa instituição. O binômio Demeter-Hera é central nos anos 60 e 70 e quase nenhum espaço resta para a manifestação da energia arquetípica de outras deusas. Rompendo paulatinamente com essa barreira construída culturalmente por uma sociedade que valoriza prioritariamente os papéis de esposa e mãe, Afrodite emerge timidamente nos anos 60 no despertar da sexualidade latente da mulher. Ao entrar em contato com a energia dessa deusa, o que se dá em seus momentos de lazer, a mulher se reconcilia com a sua feminilidade, soltando as amarras enclausurantes que impediam a eclosão de seu eros criativo e se torna plena nos anos 90. Atena com seu vigor e disponibilidade para a luta começa a insinuar nos anos 70 na figura da mulher que parte para a conquista de um espaço no mercado de trabalho, desembocando na mulher guerreira multifocal sobrecarregada pelo acúmulo de tarefas do final do século. Todo esse compósito aponta para o retorno à imagem primordial de Pandora. Criada à imagem das deusas ela traz em si as energias arquetípicas de cada uma delas. Buscar o equilíbrio que possibilite a manifestação dessas energias de forma harmônica, sem que haja prevalência permanente de uma sobre a outra, parece ser o mote que tem norteado o comportamento feminino nos últimos tempos. Todo esse panorama aponta para a eclosão de um outro imaginário acerca do ser-mulher que, aos poucos, está-se consolidando em nosso meio social.