Resumo

O advogado Fabiano Neme e o arqueólogo Matheus Bellé são porto-alegrenses que compartilham, assim como muitos latino-americanos, duas grandes paixões: o fute-bol e a política. Por isso mesmo, o propósito do livro é explorar as interconexões entre es-ses dois elementos por meio da apresentação de histórias e fatos que demonstram a pro-ximidade entre o futebol e as ditaduras da Argentina, do Brasil, do Chile e do Uruguai 

Para isso, os autores começam com uma breve contextualização da conjuntura política ditatorial nesses quatro países. O ponto em comum culminante entre todas essas ditaduras centra-se na Operação Condor, operação norte-americana clandestina iniciada em 1975 dentro do contexto da disputa político-ideológica que marcou os anos da Guerra Fria. A partir dos pactos firmados entre Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, as ditaduras colaborariam entre si para manter a América Latina “presa a uma ideologia de exploração da força de trabalho e internacionalização do capital, e, pela repressão, livre do risco de seguir o exemplo de Cuba e se aliar ao bloco socialista capitaneado pela União Soviética” (Neme; Bellé, 2022, p. 24).A fim de atingir, na presente resenha, a melhor exposição do conteúdo político--futebolístico dos episódios narrados no livro, decide-se separá-la em duas seções: uma primeira que demonstra a instrumentalização do futebol por parte e em prol dos regi-mes ditatoriais latino-americanos nos quatro países mencionados, e uma segunda que explicita o ambiente futebolístico enquanto um espaço de resistência latino-americana contra as ditaduras.1 As ditaduras e a instrumentalização do futebol1 As ditaduras e a instrumentalização do futebolOs autores nos contam alguns eventos do futebol latino-americano que acabam por escancarar a instrumentalização política desse esporte por parte das ditaduras nos quatro países por eles analisados. Tais eventos vão desde o uso da Copa de 1970 em fa-vor da ditadura capitaneada por Emílio Garrastazu Médici até o desastroso Mundialito no Uruguai em 1980. Seguindo uma linha cronológica, comentemos primeiro sobre a Copa de 1970.Sediada no México, a Copa de 70 foi de extrema importância para Médici, pre-sidente do regime desde 1969, que encontrou no futebol “o elemento ideal para desviar o foco brasileiro do uso indiscriminado da violência de Estado” (Neme; Bellé, 2022, p. 65), já em um contexto de vigência do Ato Institucional 5, que marca o início dos cha-mados “anos de chumbo” da ditadura brasileira. Partindo desta premissa, Médici passa a agir enquanto uma figura íntima à seleção e não poupa esforços seja para acompanhar partidas e disponibilizar preparadores físicos ligados ao Exército para treinamento dos atletas, para interferir diretamente na Seleção.As influências de Emílio Médici na seleção que representaria o Brasil na Copa de 70 significam as primeiras demonstrações de uma instrumentalização da Copa e do próprio futebol por parte do regime militar, que não estava disposto a aceitar quaisquer nomes ou elementos na seleção brasileira que não servisse para passar uma imagem po-sitiva da ditadura. Por isso o técnico João Saldanha, ex-membro do Partido Comunista

 

Referências

MAGALHÃES, Lívia Gonçalves. Com a taça nas mãos: sociedade, Copa do Mundo e ditadura no Brasil e na Argentina. Rio de Janeiro, RJ: Lamparina, 2014.

NEME, Fabiano; BELLÉ, Matheus. Condor F.C: o uso político do futebol nas ditaduras da América Latina. Porto Alegre, RS: Ed. dos Autores, 2022.

WISNIK, José Miguel. Veneno Remédio: o futebol e o Brasil. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2008.

Acessar