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INTRODUÇÃO:

Existe um saber corporal que muito pode dizer sobre nossas próprias capacidades e pensar o movimento é pensar o próprio ser humano na sua constituição. Compreender como se estabelece a aprendizagem do movimento para supor uma metolologia de ensino dos gestos esportivos é limitar o potencial desta experiência. Considerando as atividades físicas de aventura na natureza realizadas na Ilha de Santa Catarina, buscou-se identificar e discutir elementos que pudessem indicar pistas sobre o processo de construção de conhecimento, sobretudo corporal, a partir de relatos destas experiências. A questão principal que norteou o estudo foi: o quanto podemos aprender sobre nossa aprendizagem a partir dela própria? A proposta desta pesquisa ultrapassa o estudo particular de algumas atividades e amplia-se no leque de conhecimentos que delas podem surgir, reconhecendo como valiosas as contribuições colhidas a campo no diálogo com a literatura.


METODOLOGIA:

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, essencialmente descritiva, de abordagem fenomenológica, requisitada pelo referencial teórico que sustenta o estudo. A busca de subsídios para análise deu-se através de entrevista a 24 praticantes e atletas de diferentes atividades de aventura realizadas na Ilha de Santa Catarina, relatando suas experiências, as percepções do corpo e do ambiente, os conhecimentos considerados necessários e o processo de aquisição/construção destes conhecimentos. Utilizou-se um roteiro para entrevistas, registradas através de gravações, imediatamente após as atividades realizadas, respeitando os devidos procedimentos éticos. As falas foram transcritas e analisadas a partir do referencial teórico da fenomenologia de Merleau-Ponty. Na educação de um modo geral, e na Educação Física especialmente, pouco se fala sobre a aprendizagem a partir dela própria, se não por indicadores de performance. Os relatos não são a própria aprendizagem, entretanto estão nela fundados, possuem os resquícios do fenômeno sobre o qual falam, trata-se de uma retomada descritiva da própria vivência.


RESULTADOS:

A partir da contribuição dos praticantes percebeu-se a possibilidade de explorar, nas análises, a relação entre as falas e a forma como estes percebem e constroem as atividades e sua relação com o mundo, o que levou ao estudo da percepção e constituição do conhecimento. Considerando elementos da fenomenologia de Merleau-Ponty, é possível reconhecer na própria experiência, que a aprendizagem se dá em situação de diálogo, entre indivíduos e entre estes com o mundo, no qual o caráter expressivo do corpo próprio é requisitado. A comunicação surge quando algo que não pertencia ao domínio esperado se apresenta, quando há uma quebra em relação ao que já estava previsto. As análises permitem sugerir a recuperação do espaço da corporeidade nas experiências de aprendizagem como elemento coletivo, o reconhecimento do potencial expressivo do corpo e do papel da expressividade na construção de conhecimentos. Provavelmente o mérito das atividades consideradas neste estudo, mas não necessariamente estas, resida no fato de nos permitirem perceber como é o nosso perceber, ou, quem somos e que mundo é este por nós mesmos, o quanto podemos aprender sobre nós mesmos. A vivência de gestos esportivos facilmente fornece ao homem elementos para a experiência do conhecimento de si, e sobre como este se constrói na relação com o mundo, entretanto muitas vezes essa possibilidade de conhecimento é desperdiçada.


 CONCLUSÕES:

O corpo reúne nele mesmo os paradoxos do mundo da vida, quando temos que pensar o corpo nos deparamos com as deficiências de nossos conceitos. Antes da linguagem exercemos uma espécie de compreensão primitiva do mundo - uma espécie de cumplicidade, familiaridade - revelando um "eu posso" irrefletido, investido de ação. É possível concluir que o praticante não adquire um hábito senão quando se torna capaz de exercer sua capacidade criativa. O passado retorna como aquilo que dá orientação, mas no momento em que se estabelece um diálogo, uma provocação, os gestos técnicos se calam para deixar surgir a expressão, eis o momento da aprendizagem, da atualização do hábito. O êxito está na capacidade de continuar dialogando, e não na utilização de determinados modelos. A criação está na pré-disposição à aventura (como aquilo que está por vir), quando avançamos além do que não conhecemos de nós mesmos. A própria palavra é gesto, corpo; e o que estabelecemos com o outro é um diálogo corporal. Entretanto, como todo gesto precisa ser construído integralmente, o hábito não é o que se repete, mas a atualização manifesta na expressão. Então a aprendizagem não se dá na repetição. Há sempre um corpo habitual, uma historicidade que não se destrói mas existe para que sejamos capaz de criar, para que algo se elabore. Isto é o mesmo que reconhecer o potencial criador do movimento humano, tendo como horizonte antropologia e história.