Brasil x Portugal: festa para quem?
Integra
O País assiste neste dia 19 de novembro, por meio do amistoso internacional entre as seleções de Futebol do Brasil e de Portugal, a reinauguração do Estádio “Bezerrão” ou o “Novo Bezerrão”, no discurso da modernização conservadora do Governo do Distrito Federal.
Inaugurado ainda sob a égide da Ditadura Militar no ano de 1977, O nome do referido equipamento esportivo alicerçado em uma cultura personalista, alude ao Sr. Valmir Campelo de Bezerra, hoje Ministro do Tribunal de Contas da União, outrora administrador daquela cidade, e que em 1994 na condição de Senador, foi o representante derrotado do rorizismo na eleição ao GDF, pelo candidato da Frente Brasília Popular Cristóvam Buarque.
Do pontapé inicial de Pelé no aniversário dos trinta e nove anos do milésimo gol do “Atleta do Século”, à presença de Felipe Massa, atual vice-campeão mundial de Fórmula 1, passando por Romário como referência da campanha publicitária do evento e melhor jogador da Copa de 1994, às participações do Melhor do Mundo em 2007, o Candango Kaká e do principal candidato ao mesmo posto no ano em curso Cristiano Ronaldo, assim como a interpretação do Hino Nacional por Zezé de Camargo e Luciano do vizinho estado de Goiás, a entrega pública (?) do estádio se assemelha a um conto de fadas!
A aparente beleza e funcionalidade dos seus confortáveis vinte mil lugares, ocultam uma das acepções manifestas por Houiass no verbete prioridade, como a condição do que está em primeiro lugar em importância, urgência, necessidade, premência!
Faz parte das bandeiras históricas dos movimentos populares, sindicatos e partidos que entendem a sociedade como construção humana, a defesa intransigente dos Direitos Sociais a toda população, não os vinculando à lógica excludente do mercado, dentre eles a Educação, o Lazer e numa leitura ampliada também o Esporte.
A concepção prevalente da força política hegemônica representada não apenas no Palácio do Buriti, mas também na Secretaria de Esporte, na Vice-Presidência regional da Confederação Brasileira de Futebol, no segundo atleta a comemorar a marca dos mil gols, bem como na direção da equipe de futebol da Sociedade Esportiva do Gama, que disputará a terceira divisão do Campeonato Brasileiro em 2009, todos identificados com o Partido Democrata, os afasta das teses que universalizam as políticas sociais, por entenderem-nas como onerosas ao Estado!
Em recente missiva enviada a seus assessores diretos, o Governador do DF enfatizou que é “… Fundamental também separar o que é interesse público do que é interesse privado, empresarial.”
Contraditoriamente ao ideário liberal, nem um único centavo, dos divulgados mais de R$ 55 milhões investidos na reforma e conseqüente modernização do estádio, tampouco os estimados R$ 10 a 12 milhões para a organização da festa, já incluídos o simbólico cachê de R$ 3 milhões aferido a cada uma das seleções, é oriundo da decantada iniciativa privada, qual seja, todo o recurso tem como fonte o orçamento público, trata-se de uma curiosa parceria, para usar um vocábulo pertinente aos interesses do capital, entre o público e o privado!
Inserido no universo dos negócios, desta feita mediados pelo Futebol e seus interlocutores, com trajetórias traduzidas em passado recente pelo desfecho de duas Comissões Parlamentares de Inquérito ocorridas no âmbito do Congresso Nacional há pouco menos de dez anos, o GDF faz uma aposta na política dos grandes eventos, busca se qualificar como uma das sedes e postula a realização da cerimônia de abertura da Copa do Mundo de 2014, repetindo o feito recente do Campeonato Mundial de Futsal.
Nesta perspectiva pode ser que faça sentido termos ingressos que variam entre R$ 90,00 e 250,00, mas é papel do poder público ser protagonista nesta dimensão do esporte?
A Constituição afirma que não, a ação concreta de inúmeras forças políticas com espectro ideológico distinto tensiona em sentido contrário, basta visitarmos a experiência recente dos Jogos Panamericanos, no qual a questionável participação dos recurso públicos foi a peça de resistência na realização do propalado Maior Evento das Américas.
A falaciosa argumentação do legado social bem como do acesso aos próprios públicos erguidos e deixados ao conjunto da população esbarra na prática de uso e gestão privada dos mesmos.
Torna-se mais aguda a situação quando se constata a precária condição de conservação de um número significativo de equipamentos esportivos e de lazer, com piso danificado, ausência de cobertura, sem tabelas com aros, balizas, postes, redes, pra não falarmos das escassas piscinas, seja no espaço das cidades, seja no interior das Escolas Públicas, além da também usual, mas não menos grave ausência de materiais pedagógicos e formação continuada que dê suporte a prática do componente curricular Educação Física, que resiste pelo esforço e compromisso de seus docentes.
Ao traduzir sua visão de mundo e desmontar a tese da restrição orçamentária materializada por suas decisões políticas, o GDF explicita sua ênfase na dimensão do Esporte como um dos negócios possíveis em um espaço mediado pelo consumo, e se afasta do preceito constitucional que prioriza a Educação, não restrita somente às Escolas, inserida em um conceito substantivo de cidadania que amplie as possibilidades de emancipação humana, situando-os não meramente como espectadores, mas sujeitos de sua própria história.