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Saudade é uma palavra que expressa a melancolia da falta de algo. Não basta apenas constatar a ausência daquilo que é significativo. Implica ainda no afeto que isso causa: o lamento pungente de um fado, a tristeza fofa de um samba canção ou o punhal no coração em forma de blues.

Nessas últimas semanas assisti a diferentes manifestações sobre a passagem de mais uma olimpíada (ciclo de 4 anos que separa uma competição olímpica de outra). Fossem tempos de velho normal e estaríamos torcendo por performances inesquecíveis de atletas maravilhosos. O novo normal, por outro lado, adiou o encantamento produzido pela transcendência do gesto perfeito de algumas humanas e humanos fora da média.

Sinal dos tempos, observei a tristeza expressa nas mensagens sobre a queima dos fogos que seriam usados na abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio.  Mais do que simplesmente iluminar a festa que teria acontecido, o espetáculo pirotécnico seria uma demonstração de prazer – não há quem não admire o espocar de pólvora colorida com formas variadas – com pegada politicamente correta, uma vez que não haveria danos ambientais. O Japão estava pronto para dar mais um espetáculo olímpico, como já havia feito em 1964.

Mas, o que mais me causou curiosidade mesmo foi ver a melancolia sobre o distanciamento na memória dos Jogos do Rio de Janeiro. Pois é. Ainda que eu sofresse com algum dano neurológico que me causasse esquecimento, as redes sociais não me permitiriam apagar o que aconteceu há 4 anos. Eu estive no Rio em 2016 sem portar crachá ou com autorização para tráfego em vias exclusivas. Minha história desse evento olímpico está relacionada com uma trupe de intrépidos pesquisadores, que no melhor estilo “a vida como ela é” foi até a Cidade Maravilhosa para ver se o Rio estava mesmo lindo.

Poucos dias antes do início da festa fui notificada de que haveria uma homenagem a antigos atletas na Casa Brasil e que poderíamos fazer uma entrega simbólica do livro Atletas Olímpicos Brasileiros, mas isso não implicaria em nenhum privilégio, nenhuma credencial. Ao informar aos membros do Grupo de Estudos Olímpicos sobre essa possibilidade, imediatamente surgiram voluntários. E logo depois do final da cerimônia de abertura nos deslocamos de São Paulo ao Rio em dois carros que juntos transportaram 11 pessoas.

Ali nos locomovemos do Centro à Barra e de lá ao Complexo de Deodoro, sem nunca deixar de passar por Madureira. Erramos muitos caminhos, entradas e saídas de estações, mas conseguimos entregar os livros a atletas que foram olímpicos nas décadas de 1940, 1950 e 1960. Assistimos à vitória de Marta, Cristiane e todas as meninas do futebol sobre a Suécia. E ainda prestigiamos o rúgbi feminino depois do pedido de casamento feito pela Marjorie Enya à Isadora Cerullo.

Sem saudade lembro das obras não concluídas que permanecem como fantasmas pela cidade a lembrar defensores e críticos daquela aventura que custou a vida pública a muitos. Sem qualquer melancolia assisto à decadência do esporte brasileiro que perdeu apoios, patrocínios e a oportunidade de ser grande, como sempre se desejou.

Mas, com esperança, olho para o futuro lembrando que a esperança é o ato da espera ativa, calculada e transformadora. Uma eleição no COB se aproxima e a força do voto dos atletas, que representam 1/3 do colégio eleitoral, pode escrever uma nova página na história. Ou reforçar a melancolia que se sente de um passado que não se quer ver repetir.