Integra

O orçamento federal de 2019 projeta um déficit de R$ 139 bilhões. Ironicamente, nada que assuste, pois o governo até já estuda perdoar os produtores rurais de uma dívida previdenciária de R$ 17 bilhões. Em decorrência, outros “perdões” estarão na fila, repetindo práticas de governos anteriores. 

O que assusta, mesmo, é que diante desse preocupante déficit orçamentário, com gravíssimas repercussões em áreas prioritárias, a verba pública continue financiando investimentos dos clubes de futebol. Isso ocorre, também, na formação de jovens jogadores que, uma vez vendidos por bom dinheiro, enriquecem empresários, o próprio clube e, em muitos casos, cartolas. É preciso dizer que tudo ocorre legalmente, conforme a Lei de Incentivo ao Esporte, mas ignorar esses “investimentos” na iniciativa privada é compactuar com o desperdício da verba oficial.
O caso do América de Minas Gerais, que disputou a Série A em 2018, é didático para explicar esse sistema.

Entre 2007 e 2014, o clube mineiro aprovou projetos na Lei de Incentivo num total de R$ 23 milhões. Desse total, captou R$ 12 milhões para “investimentos nas categorias de base”. Cruzeiro, Ipatinga e Uberlândia, também usaram dinheiro da mesma lei. O Flamengo desenvolve projetos para natação, remo etc. E, em fins de 2018, o Corinthians aprovou seis projetos junto ao recém extinto Ministério do Esporte. 
         Em sua página na internet o América-MG mostrava que revelava talentos em suas escolinhas, como o atacante Richarlison, vendido ao Fluminense em 2015, por R$ 10 milhões (50% dos direitos econômicos), segundo noticiário da imprensa. Além do dinheiro, o América ficou com 20% desses direitos, que lhe renderiam mais grana em caso de uma transação internacional de seu ex-jogador. 

          Foi o que ocorreu, em 2017, quando o fluminense vendeu Richarlison foi para o Watford, da Inglaterra, por R$ 46 milhões. Atualmente, ele está no Everton Inglês, vendido por R$ 247 milhões. 

        O dinheiro da Lei de Incentivo ao Esporte vem de quem tem imposto de renda a pagar, podendo destinar parte de sua dívida para projetos esportivos, com limites de seis por cento para as pessoas físicas e um por cento para as jurídicas. Ou seja, é dinheiro que o governo abre mão para “incentivar o esporte”. 
Originalmente, esse incentivo atenderia apenas às modalidades fora do futebol. Mas, em dezembro de 2006, data da aprovação do projeto de lei, o lobby da CBF e dos cartolas entrou em campo e o jogo da bola acabou beneficiado. 

O interessante nesse processo é que a Lei não prevê que o clube deve ressarcir o cofre do governo em caso de “lucro” como ocorreu com Richarlison. Ou seja, é o dinheiro público financiando os ganhos da iniciativa privada, em tempos de déficits orçamentários bilionários. 
“Pode isso, Arnaldo”?