Resumo

Nos últimos anos, avançou entre a comunidade científica internacional o uso de sites de
compartilhamento como forma de acesso ao conhecimento. A popularização da chamada
“pirataria das obras científicas” desestabilizou o sistema de comunicação da ciência, que
produziu controvérsias. Este sistema, dominado pelo oligopólio de poucas editoras comerciais e pela atividade intensa de ativistas defensores do acesso aberto, precisou lidar com o compartilhamento massivo de arquivos, algo que outras indústrias de conteúdo já haviam experimentado, mas não a indústria da comunicação científica. Esta pesquisa é uma cartografia de controvérsias sobre a pirataria das obras científicas, que tem por objetivo descrever de maneira panorâmica os principais acontecimentos registrados no debate público. Para isso, foram usados métodos digitais, de base qualitativa, para pesquisar, registrar e descrever os principais atores da controvérsia, seus posicionamentos e os desdobramentos de suas ações. A controvérsia em questão foi debatida principalmente em tribunais, por meio de litígios na justiça, e em ambientes virtuais, por meio do debate em fóruns híbridos online. Durante a descrição dos acontecimentos, foi identificado que os direitos autorais foram um dos temas centrais em disputa. Em contraste com o movimento do acesso aberto, que se baseou exclusivamente nas licenças públicas como estratégia de ação (algo que inibiu o debate sobre os direitos autorais), os movimentos piratas incitam controvérsias sobre as teorias dos direitos autorais e sobre a reforma da legislação. Com base nesses achados, aprofundou-se a pesquisa teórica e histórica como forma de identificar as bases para a impressão amplamente compartilhada, mas raramente demonstrada sistematicamente, de que os direitos autorais não se adaptam bem ao campo científico. Para isso, estudou-se a origem da inserção das obras científicas no rol das obras protegidas pelos direitos autorais, a teoria da assimilação da obra científica pelas obras literárias, o conceito de “obra científica” e as principais contradições e antinomias das obras científicas. Em conclusão, foi observado que o movimento pelo acesso aberto pode ter errado ao investir apenas nas licenças públicas como caminho para a reforma editorial das ciências. O caso da pirataria das obras científicas demonstra que o debate sobre a proteção das obras científicas pelos direitos autorais é central para a reforma do sistema editorial da ciência, justamente porque as contradições e antinomias experimentadas pelos cientistas, editores e bibliotecários nesta seara são persistentes, antigas e, diante do avanço da pirataria, tendem a aumentar.
 

Acessar Arquivo