Resumo

A questão etnicorracial no Brasil é algo extremamente complexo. O comércio de cidadãos africanos como mão de obra escrava com vistas a produzir riquezas para as elites europeias colonizadoras, e as teorias racialistas, baseadas em “pseudociências” que atribuíram ao negro suposta inferioridade biológica e cultural como forma de justificar a escravidão, produziram estigmas que relegaram as populações negras a condição de não existência. O contexto brasileiro, principalmente a partir de meados do século XIX, representa em termos de lutas sociais, da perspectiva das relações etnicorraciais, um momento especial, pois com o processo escravista em declínio e muitos negros e pardos já libertos, inseridos no contexto social, o Brasil se deparava com algo ímpar no mundo até então, um país altamente miscigenado do ponto de vista racial. Essa mistura de raças, segundo as elites dirigentes da época, era algo que inviabilizaria a construção do Brasil como nação. Nos dias atuais, constatamos uma sociedade fortemente racista, consequências das teorias racialistas, das políticas de branqueamento e as consequências destas, na forma do mito da democracia racial. A cisão entre os cidadãos negros e os pejorativamente reconhecidos como “mulatos”, produziu um ilusória aceitação do pardo como classe racial intermediária. Como parte dos movimentos negros de enfrentamento ao racismo tomamos como foco na presente pesquisa práticas pedagógicas de caráter antirracistas nos cotidianos escolares. Partindo da Educação Física escolar e na Educação Infantil reconhecemos, assim, nas microações afirmativas, pelo viés da cultura corporal, uma potente forma de luta antirracista. A Educação Física, que em seu percurso epistemológico foi empregada pelas políticas governamentais como ferramenta ideológica de exclusão, tem hoje por meio da cultura corporal, a possibilidade de romper com as práticas excludentes, se aproximar e se apropriar de outros saberes nos diálogos com as crianças pequenas das classes populares, no fortalecimento e exaltação de suas formas serestar no mundo, na busca por possibilitar a construção de corporeidades negras afirmadas positivamente. Assim, nesta pesquisa narrativa com as experiências vividas, busquei, nas imbricações da minha vida pessoal e profissional, nas experiências como cidadão negro brasileiro, pai de crianças negras, filho, professor e pesquisador, entender o significado do ser negro no Brasil e as contribuições que as práticas pedagógicas de caráter antirracistas podem trazer para as crianças pequenas no sentido de desconstruir estigmas e favorecer a construção de identidades etnicorraciais negras positivas. 

Arquivo