Cultura Escolar, Cultivo de Corpos: Educação Physica e Gymnastica Como Práticas Constitutivas dos Corpos de Crianças no Ensino Público Primário de Belo Horizonte (1906-1920)
Resumo
Problematiza-se, neste trabalho, o movimento de afirmação de uma nova cultura escolar em Belo Horizonte nas duas primeiras décadas do século XX, especialmente após a reforma do Ensino Primário promovida pelo governo mineiro em 1906. Nela, depositou-se a esperança de realizar uma "revolução de costumes" nas crianças, especialmente as filhas de populações pobres, procurando, ao mesmo tempo, destruir seus hábitos de origem e implantar-lhes maneiras consideradas civilizadas. Mais que instruir, era preciso educar. Educação que se traduziu também como cultivo dos corpos: muitos foram os dispositivos mobilizados para realizar uma pretendida "educação physica" das crianças, presentes na legislação do ensino; nas maneiras de organizar e ocupar os espaços; na distribuição dos tempos escolares; nas diferentes disciplinas dos programas de ensino; na obsessão pela higiene; na inspeção médica; nos rituais escolares; na aproximação com as práticas de trabalho; e, ainda, nos muitos cuidados que lhes dedicavam as Diretoras e professoras. Acompanhando mais detidamente o enraizamento escolar da "Gymnastica", a partir dos ordenamentos legais prescritos no período e dos relatórios produzidos pelos agentes escolares, buscou-se evidências do processo de instituição de seu campo disciplinar, indicando-se que seu ensino foi representado e orientado sob o primado da correção e constituição dos corpos das crianças, tidos como disformes e desalinhados. Os impasses e precariedades desse processo não impedem de ver, no entanto, o investimento de uma época sobre o corpo das crianças, no âmbito da escola.