Resumo
No início do século XXI eclodiram mudanças nas políticas curriculares brasileiras para o Ensino Médio (EM) e para a Educação Profissional, com destaque para a promoção do currículo integrado e ampliação da jornada escolar. Os Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia (IFs) foram criados no bojo dessas mudanças; logo, seus princípios norteadores incorporaram as finalidades esboçadas em tais políticas. Se tomarmos o texto curricular como uma partitura, podemos dizer que, com base numa partitura, diferentes músicas podem sem tocadas. Nesse contexto, o objetivo do presente estudo foi analisar o currículo do Ensino Médio Integrado (EMI) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG), suas conexões com a educação em tempo integral (ETI) e com a construção curricular do componente Educação Física (EF). Buscando interpretar a partitura e ouvir a polifonia instaurada no currículo do IFMG, a metodologia adotada incluiu análise de documentos curriculares; entrevista semiestruturada com um gestor; entrevistas narrativas com professores de EF; e grupo focal com estudantes. Recorrendo à hermenêutica crítica, as análises compreenderam três dimensões: macro, mezo e micro. A dimensão macro contempla um olhar panorâmico sobre o EM, na tentativa de compreender os condicionantes do currículo para essa etapa da Educação Básica. A dimensão mezo abrange os arranjos específicos do IFMG e suas orientações curriculares para os cursos de EMI. Na dimensão micro, o recorte é o currículo da EF, enquanto um componente curricular do EMI do IFMG e os efeitos do currículo na vida de um grupo de estudantes. Os dados produzidos indicaram que o currículo prescrito do IFMG é permeado pelo discurso neoliberal que submete as finalidades da educação escolar às necessidades do mercado, conferindo-lhe características associadas à concepção instrumental. Os Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs) reproduzem esse discurso e explicitam a falta de integração curricular. A construção do currículo da EF nos campi ressignifica as prescrições ao dar maior centralidade à cultura, incorporar pressupostos da formação integral e atender demandas da jornada em tempo integral, contudo em algumas situações se curva aos discursos hegemônicos, afetada pelas relações de poder. As narrativas dos estudantes apontaram dificuldades impostas pela jornada extenuante e excesso de tarefas, resultantes de um currículo que não contempla as múltiplas dimensões da formação humana. Os estudantes destacaram alguns efeitos do currículo, como o estímulo à autonomia, a valorização das diferenças na formação de suas identidades e a oportunidade de construir uma rede de conhecimentos em torno dos temas estudados, sintonizada com questões candentes em suas vidas. A interpretação do conjunto indica que embora seja necessário mais investimento na integração do corpo docente e na construção coletiva dos PPCs, a fim de superar a falta de integração do EMI e atender às especificidades da jornada em tempo integral, as improvisações dos professores e dos estudantes ressignificaram as normativas institucionais, produzindo currículos que intencionam superar tais problemas, inspirados pelos pressupostos das teorias críticas e pós-críticas.