Resumo

O presente trabalho é fruto de uma parte da dissertação intitulada “Capoeira não pede bênção a coronel”: os Mestres e a Memória da disseminação da Capoeira em Vitória da Conquista-BA (1950-2000), defendida no Programa de Pós-Graduação em Memória: Linguagem e Sociedade da UESB. Tem como objeto de estudos, a Capoeira, uma prática corporal construída a partir das matrizes civilizatórias africanas. Historicamente, a capoeira é marcada por tensões geradas pelos conflitos e disputas existentes na sociedade, assim, ocorreu a busca pela reivindicação de seu espaço na sociedade brasileira. Na cidade de Vitória da Conquista-BA, esta luta não se distancia deste contexto. A existência de tensões, ocasionadas pelas disputas ao longo do seu processo de disseminação, mostram-se como um reflexo dos enfrentamentos trazidos atualmente pelos Mestres. Assim, esta pesquisa teve como objetivo investigar as tensões e disputas geradas durante o processo de disseminação da Capoeira em Vitória da Conquista-BA, buscando analisar os relatos dos Mestres de Capoeira que foram apontados como os principais disseminadores desta prática corporal na cidade, delimitando uma baliza cronológica traçada desde a década de 1950 até os anos 2000. Desse modo, utilizou-se a História Oral como método que contribuiu para a compreensão, recriação e aprendizado crítico da memória contida nos relatos dos mestres, conforme o referencial teórico-metodológico pautado nas produções de Michael Pollak (1989), Pierre Nora (1993), James Fentress e Chris Wickham (1992), Alessandro Portelli (1997) e José Carlos Meihy (2010). Os dados da pesquisa foram revelados a partir de entrevistas e coleta de relatos orais, seguindo o método qualitativo. Os resultados apontaram para a existência de conflitos e tensões marcados pela égide do discurso racista, da discriminação e da exclusão socioeconômica, manifestada no cotidiano da cidade de Vitória da Conquista na segunda metade do século XX. Os focos principais destas tensões abarcaram desde o poderio das famílias de coronéis nos anos de 1950, 1960 e 1970, quando o negro passou pelas dificuldades impostas na ocupação e sustentabilidade de espaços para a prática da capoeira, até o processo de mercadorização que tentou atingir os fundamentos tradicionais e colocar a Capoeira em outro lugar nos anos de 1980, 1990 e 2000, assim como os rumos que cada Mestre de Capoeira tomou durante suas lutas nesse processo de difusão. Foi possível compreender, portanto, a relação entre as memórias apresentadas pelos mestres de Capoeira e as adversidades que os tensionaram através de disputas de cunho socioeconômico e étnico racial, refletidas enquanto mecanismos e “dispositivos” de poder do próprio sistema.