Resumo

Esta tese é o resultado de uma investigação realizada por meio da história oral, buscando os tensionamentos e as possibilidades do fazer docente em educação física quando lida com a diversidade étnica. O campo empírico desta pesquisa, de abordagem qualitativa, envolveu uma intervenção como núcleo, vivida mediante um seminário regional, de duração de uma semana, nomeado “População negra, educação física e currículo”, organizado por mim. O seminário, lugar de captura da história oral narrada pelos sujeitos (docentes) em meio ao dialogismo instaurado com a participação de estudiosos da questão, docentes e discentes da escola pública, educadores dos movimentos sociais e militantes do movimento afrodescendente de Cuiabá (MT), contexto da pesquisa, nos permitiu identificar questões que apontam para além do silenciamento dos afrodescendentes. Além da intervenção, com formato de seminário, também utilizei uma entrevista que costura parte da tese, de modo a recolher mais detidamente a história e cultura locais (em especial de Cuiabá), sempre na busca da perspectiva afrodescendente. O dialogismo instaurado pelas conferências e debates do seminário foi o lócus de onde se colheu a história oral narrada pelos palestrantes Kabengele Munanga, Edílson Fernandes de Souza, Amauri Mendes Pereira, Ângela Linhares e Henrique Cunha, junto aos docentes vinculados ao ensino superior na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Universidade de Várzea Grande de Mato Grosso (UNIVAG) e Universidade de Cuiabá (UNIC) – as três universidades que possuem o curso de educação física em Cuiabá –, ao qual se acresceu entrevista com Jacy Proença, que concede a particularidade de nos trazer com mais precisão o mundo cultural local. A pesquisa mostrou que: é importante um trabalho sobre memória afrodescendente junto ao trabalho com o corpo em educação física; a busca da ancestralidade pode ser vivida como um processo que faz a alteridade comportar um olhar mais equânime, mais justo, mais amoroso para a diversidade étnica; o trabalho com o corpo negro em educação física deve nos levar à dança e a outras matrizes afrodescendentes do corpo em movimento – inclusive deve comportar a reflexão sobre o corpo do trabalhador nos contextos concretos de sua vida e trabalho. Viu-se que, nessa busca da memória cultural afrodescendente, realizam-se “empréstimos”, mutações e deslocamentos (troca de lugares, de experiências) e que seria importante pensar a ancestralidade como processo, que não se afirma com algumas conquistas, mas continua a percorrer os caminhos da utopia. Isso significou concretamente que a Lei 10.639, no contexto das políticas afirmativas, auxilia-nos a construir saber capaz de relacionar a história cultural afrodescendente à memória coletiva local (cuiabana, por exemplo), valorando o corpo negro junto à expressividade cultural afrodescendente. Também se compreendeu como essencial a universidade sair de seus muros e conectar o fazer universidade ao mundo das culturas comunitárias afrodescendentes em sua arte e vida, lutando pela concepção de um fazer ciência e arte que se articule com a luta por condições de dignidade da cultura afrodescendente.

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