Sobre
Prefácio
O esporte é tema tão popular quanto a religião e tão desconhecido quanto um costume exótico. Este estudo parte da ancestralidade ritual do esporte na Grécia Antiga e acompanha a sua evolução social até os nossos dias, numa pesquisa ampla sobre as dimensões básicas da vida esportiva. Eis a distância entre o ver e praticar, eis a relação entre ídolos e torcidas, eis os números surpreendentes do PIB esportivo no Brasil e no mundo.
Do ponto de vista de um antropólogo social fascinado pelo assunto, o que mais me chama a atenção é que a narrativa é construída em cima de entrevistas, o que permite avaliar com riqueza de perspectiva o modo pelo qual a nossa sociedade concebe e vivencia o esporte, inclusive nas suas formas mais populares.
O dossiê demonstra como o esporte ultrapassa a esfera do entretenimento, como indústria cultural e de massa. É também fonte de identidades que se cruzam com a segmentação econômica, social e política dos seus espectadores e praticantes, criando mais um sistema de emblemas coletivos. Emblemas que, ao definir as pessoas como praticantes deste ou daquele esporte, ou como admiradores deste ou daquele time ou atleta, separa ou reúne ricos e pobres, doutos e analfabetos, em papéis sociais que podem ou não combinar com sua posição social.
A investigação do ídolo e do espectador ajuda a descobrir como os grandes craques servem de modelo social e moral para a pessoa comum, como exemplos de comportamento a serem seguidos ou evitados.
São equivalentes éticos dos santos que, antigamente, ocupavam tal lugar no imaginário popular.
A pesquisa mostra, ainda, que os valores do mundo esportivo — regras fixas que valem para todos, respeito pelos árbitros e, sobretudo, o rodízio entre vitória e derrota — reforçam implicitamente elementos básicos da vida democrática, onde o adversário não se confunde com o inimigo e o vencer não legitima nenhuma perpetuidade no topo da lista. É jogo jogado em campo e fora dele.
Roberto DaMatta