Resumo
Alterações de composição corporal, como a obesidade e a sarcopenia, ou baixos valores de ângulo de fase, estão associadas com um mal prognóstico da COVID-19, bem como podem ser consequências da doença, já que pode desencadear um quadro inflamatório persistente após a fase aguda da infecção, propiciando uma resistência anabólica e um possível acúmulo de gordura subcutânea e visceral. Umas das formas mais eficazes para reabilitação e melhora dos parâmetros da composição corporal é a prática de exercício físico, especialmente o aeróbio e o de força. Porém, poucos ensaios clínicos foram realizados nesse cenário, e as informações até o momento advém de estudos com menor rigor metodológico, como estudos observacionais ou sem grupo controle. Portanto, este trabalho teve como objetivo analisar o efeito de 24 semanas de um programa de treinamento físico multicomponente sobre a composição corporal, ângulo de fase e qualidade muscular em sobreviventes da COVID-19. O estudo caracteriza-se como ensaio clínico randomizado, controlado, de superioridade, unicêntrico, conduzido em paralelo, com cegamento de avaliadores dos desfechos e aninhado a um projeto maior chamado Covid-19 and Rehabilitation Study (COREStudy), que foi realizado na Universidade Federal de Santa Catarina. Os participantes, selecionados de modo não probabilístico, e que desenvolveram quadros severos à críticos na fase aguda da doença, foram divididos em dois grupos: treinamento multicomponte (GI) e grupo controle (GC), que recebeu orientações sobre a prática de atividade física. A intervenção foi composta por duas fases, objetivando primeiramente progressão de volume (fase 1), e posteriormente de intensidade (fase 2). A composição corporal foi avaliada através da densitometria computadorizada por absorciometria radiológica de dupla energia e o ângulo de fase calculado a partir dos valores brutos de resistência e reatância obtidos por bioimpedância. A qualidade muscular foi avaliada através da razão entre a força isométrica máxima de membros superiores e inferiores e suas respectivas massas magras. A análise dos dados foi realizada por intenção de tratar (ITT) e por protocolo (PP), através da utilização de equações de estimativa generalizada, adotando-se o post-hoc de Bonferroni. Adicionalmente, o tamanho de efeito (TE) entre grupos foi calculado. Quarenta participantes (18 mulheres, 52,25 ± 13,00 anos) foram randomizados em GI (n=21) e GC (n=19). A análise ITT não evidenciou nenhuma alteração nos parâmetros analisados. A análise PP identificou que o GC apresentou aumento no IMC (0,58 kg/m2 ; p = 0,018; TE: -0,15), na massa gorda (1,46 kg; p = 0,004; TE: -0,22) e na quantidade de gordura visceral (68,81 g; p = 0,036; TE: -0,32). Para a variável percentual de gordura, o GI apresentou redução (-0,53%; p = 0,030; TE: -0,16). Portanto, podemos concluir que o programa de treinamento multicompontente, aqui proposto, não foi superior às orientações de atividade física, com o objetivo de gerar modificações de parâmetros de composição corporal, ângulo de fase e qualidade muscular em sobreviventes da COVID-19. Porém, parece que nos participantes que cumpriram um mínimo de 70% das sessões propostas, existe um pequeno efeito no que tange aspectos de proteção em relação ao aumento da gordura corporal, especialmente a gordura visceral.