Resumo
O objetivo desse estudo foi investigar os efeitos do fornecimento de dicas visual, cinestésica, separadamente e em conjunto, na aprendizagem de habilidades motoras por indivíduos surdos. A tarefa utilizada foi o arremesso de dardo de salão. A amostra foi composta por 99 indivíduos do ensino fundamental, de ambos os sexos, sendo 62 com surdez neurossensorial bilateral (de moderadamente severa a anacusia) e 37 ouvintes, com idade média de 10,4 anos (±1,5) e 10,8 anos (±1,4), respectivamente. O estudo constou de três grupos experimentais de indivíduos surdos: dica visual (SV); dica cinestésica (SC) e dica visual e cinestésica (SVC). Para cada um destes grupos foi composto um grupo de ouvintes pareado por idade. O delineamento compreendeu: pré-teste (1 bloco de 5 arremessos); fase de aquisição (6 blocos de 10 arremessos); pós-teste (1 bloco de 5 arremessos) seguido de teste de transferência (1 bloco de 10 arremessos). Somente na fase de aquisição, a cada bloco de 10 tentativas, a dica "cotovelo flexionado em 90º" foi fornecida de acordo com a condição, por meio de figura (dica visual), manipulação (dica cinestésica) ou figura e manipulação (dica visual/cinestésica). As análises foram realizadas separadamente para os participantes que aprenderam (PA) e que não aprenderam (PNA) a habilidade. A identificação de indicativo de aprendizagem ocorreu mediante análise descritiva dos desempenhos individuais em relação ao erro radial absoluto. Foram consideradas para a análise não-paramétrica as variáveis precisão e consistência do desempenho (erro radial), respectivamente, erros absoluto e variável e, a tendência direcional através do erro constante; duas variáveis que expressam o padrão de resposta (temporais) e 14 variáveis que correspondem ao padrão de movimento (espaço-temporais). Os indivíduos surdos também foram avaliados quanto ao domínio da língua de sinais brasileira (LIBRAS) por meio da TVRSL 1.3. As medidas de erro, de padrão de resposta e de movimento foram obtidas através dos softwares Launcher Tracker e Kinovea. Os resultados dos PA mostraram que, com a prática, todos os grupos (surdos e ouvintes) diminuíram os erros radiais, absoluto e variável; ou seja, em termos de precisão e consistência do arremesso, aprenderam a habilidade. Na comparação entre os grupos experimentais, os resultados mostraram que o grupo SV obteve desempenho superior ao SC e ao SVC. Não foi detectada diferença na comparação entre os grupos de ouvintes em função da dica fornecida. A confirmação do melhor aproveitamento da dica visual pelos aprendizes surdos também foi verificada nos resultados relativos ao padrão de movimento. A dica visual possibilitou um melhor posicionamento do braço de arremesso, o que interferiu nas variáveis de ângulo, tempo e velocidade, resultando em maior precisão e consistência do arremesso. Estes resultados permitem concluir que: (1) A dica visual é mais eficiente em promover a aprendizagem motora dos surdos do que a dica cinestésica e a visual associada à cinestésica; (2) os efeitos da dica visual são específicos à aprendizagem dos surdos; e (3) o nível de domínio da LIBRAS dos aprendizes surdos - no caso, abaixo do esperado para a idade e escolaridade - não determina a ocorrência ou a não-ocorrência de aprendizagem de uma habilidade motora