Resumo

A tese tem por tema o movimentar-se humano como diálogo do ser-no-mundo. Tal experiência, exemplarmente vivenciada nos gestos artísticos e esportivos, fornece elementos para pensarmos como nos construímos no mundo e com os outros. Essa questão orienta a investigação de uma experiência tão primordial quanto nossa existência, da qual temos um saber que não se dá por esclarecimento, mas por familiaridade. O texto mantém como referência a fenomenologia de Merleau-Ponty e alguns dos seus temas principais, acessados também pelas pesquisas das neurociências, da Educação, dos esportes e Educação Física, das artes e do Zen. O percurso desse debate passa pelo estudo do corpo-próprio, do entrelaçamento corpo-mundo; do movimentar-se mais especificamente nas experiências de dançar e jogar, que conduzem ao fluxo, ao ritmo, à temporalidade, à passagem do hábito à expressividade, à aprendizagem na experiência do outro e do diálogo. A fronteira problemática entre o adquirido e o criado é investigada por Merleau-Ponty que identifica no hábito um caráter ao mesmo tempo tributário em relação ao passado, mas inovador. Tal caráter inovador está associado ao potencial expressivo do corpo-próprio o qual revela uma natureza intercorporal na experiência de diálogo. O dançar auxilia a pensar a composição “técnica/expressão” no desaparecimento da primeira em detrimento da segunda. O reconhecimento de pertença a um fluxo é a permissão a uma forma de passividade que se revela ensinante. O jogar escancara uma motricidade que não é serva da consciência, que se apresenta em um diálogo intercorporal no qual o sujeito é o próprio movimento expressivo. O corpo-próprio, nem objeto nem sujeito, é sim um modo de orientação. Um estilo que se renova a cada apresentação, mas que nunca se dá por completo e anuncia a presença de um invisível. A aprendizagem, requer pois engajamento, mas também descentramento, um deixar-se habitar pelo outro. A possibilidade de diálogo acontece na presença de algo que não pertence ao domínio do eu. O estranhamento diante do outro dá direito de cidadania a um não-saber, um estranho que não se deixa apanhar e nem por isso deixa de ser familiar. A partir de uma ambigüidade revelada na intercorporeidade aprendemos com o outro, e o que aprendemos não é necessariamente sobre o outro, mas sobre o outro de nós mesmos. Tal proposição indica conseqüências éticas na possibilidade de vivermos as diferenças e construir algo a partir delas, de dar ao passado uma nova orientação. As reflexões acerca do “movimentar-se” sugerem a aprendizagem como situação de diálogo intercorporal diante do potencial expressivo do corpo-próprio. Mais do que isso, indicam um movimento que não é o predicado de um sujeito, mas o sujeito mesmo da aprendizagem. O movimentar-se aponta para um saber que não se mostra necessariamente quando exprimimos opiniões, mas quando nos tornamos gesto. 

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