Integra
Querido Papai Noel
Começo me desculpando por ter deixado para escrever essa cartinha tão perto do Natal, mas, como é de seu conhecimento, esse não foi um ano fácil e muitas coisas ficaram para o final. Perdemos muito mais do que campeonatos, alguns embates importantes, vagas e posições, porém não perdemos nem a esperança, nem a alegria. Isso jamais!
Imagino todos os pedidos que o senhor deve estar recebendo e a dificuldade em atender a todos. E se for como a reforma lá de casa, já sei que a boa desculpa para não terminar o serviço é que todos os fornecedores já estão em recesso e ninguém entrega mais nada em 2019. Azar de quem deixou tudo pra última hora.
Ainda assim, como não perco a esperança, vou tentar me aventurar.
Meu pedido esse ano não recairá sobre roupas, eletrônicos ou utensílios domésticos. Meu pedido é da ordem do intangível. Não sei se isso é da sua alçada e vou tentar.
Como o senhor sabe no próximo ano teremos Jogos Olímpicos. Isso mesmo, será lá do outro lado do mundo, na terra do sol nascente. A última vez que isso aconteceu foi em 1964 e o Japão precisava mostrar ao mundo que estava vivo e pujante, mesmo depois de terem jogado duas bombas atômicas sobre pessoas que nada interferiam naquela guerra horrorosa. Sim, menos de duas décadas depois de serem destruídos os japoneses usaram a vitrine olímpica para dizer ao mundo por que era preciso temê-los.
A geopolítica mudou e o Movimento Olímpico também. Se naquela edição Aída dos Santos foi a única mulher da delegação brasileira, e por pouco não foi a primeira na história a subir ao pódio, agora as mulheres estão prestes a ser a maioria. Eu tenho um orgulho danado de todas elas que seguem firmes apesar dos pesares. Nada para elas foi obra do acaso, da benevolência ou do descuido. Negativo. Tudo foi conquistado com luta e agora elas estão aí.
Não bastasse isso o Brasil já tem seus representantes do surf nos Jogos Olímpicos de Tóquio. A final do mundial desse ano deu Brasil de novo. Lembra daquele menino, o Ítalo Ferreira, que teve o passaporte roubado e chegou atrasado na competição entrando no mar com bermuda de passeio e faturou o campeonato apesar disso? Pois é. Menino valente, cheio de energia e alegria. Levou o campeonato mundial, a vaga olímpica junto com o Medina e encanta o mundo com sua irreverência. Será que dá pra dar um pouco mais de visibilidade e apoio pra ele?
Seria possível espalhar um pouco dessa força mágica para os outros brasileiros que estão nessa empreitada para conseguir a vaga olímpica? Depois desses tempos de penúria acompanho todo o esforço e sacrifício de atletas que ainda tem a mania de ter fé na vida e desejo a eles que o sonho de ser olímpico possa se realizar. Sei que a gente tem que olhar pra força dos adversários, afinal, essa conversa de que o atleta é campeão por sorte ou milagre é coisa de torcedor mal informado.
Sem ser pidona demais, gostaria de aproveitar essa cartinha também pra pedir pelos alunos do Grupo de Estudos Olímpicos, da USP, que fecharam o ano arrasando. Com o mesmo brilho, alegria e energia do Ítalo mantiveram-se no topo do ranking com trabalhos significativos sobre racismo, atletas transgêneros, o imaginário da derrota, o surf olímpico, a educação e os e-sports. Time valente, que está na corda bamba por causa do corte nas bolsas. Sei que esse pedido é por eles e pelo esporte brasileiro.
Enfim, é isso. Que nesses dias o senhor fique com seu saco bem cheio de virtudes em forma de presente. Que possam fazer a alegria de todos que ainda acreditam que o Natal é mais do que um momento de receber. E cuide bem dessas belezuras que puxam seu trenó antes que inventem também rinha de renas e chamem a isso de esporte.