Resumo
A pesquisa busca compreender a relação entre a prática do jiu-jitsu, tal como desenvolvido pela família Gracie, e a violência praticada pelo que a mídia convencionou chamar de pitboys, jovens cariocas de classe média e alta que amiúde envolvem-se em brigas e atos de vandalismo. Evitando abordar o tema pelo viés da ausência, comumente utilizado para explicar o comportamento de pitboys - a falta de instrutores de jiu-jitsu qualificados, de pais zelosos, de limites de educação, de leis mais severas etc. -, o presente estudo procurou observar, no interior de uma academia de jiu-jitsu, a construção de um ethos guerreiro, a profissionalização da porrada advinda do sucesso dos eventos de vale-tudo, as inscrições corporais dos praticantes de jiu-jitsu, a importância das marias-tatames na consolidação de um estilo de masculinidade rude ou bruto, e a relação entre virilidade e masculinidade, atributos muito prezados por lutadores. Num segundo momento, a pesquisa se dedica a entender a porrada como um jogo, uma brincadeira inserida num contexto lúdico; jogo que é a um só tempo racional e irracional, e que implica sempre em algum risco e, portanto, em possibilidade de reconhecimento e lucros de distinção para os vencedores. Observa-se também o contexto mais amplo dentro do qual o fenômeno pitboy eclodiu: a sensação de insegurança que se instala no rastro da ascensão do crime organizado a partir dos anos oitenta, o processo de identificação de pitboys com marginais excluídos, a cultura da malandragem que une a ambos e, ao mesmo tempo e paradoxalmente, o reforço das fronteiras de classe no uso do você sabe com quem está falando?, comumente utilizado por jovens de classe média e alta que praticam a violência na noite carioca.