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 O presente texto tem por objetivo explicitar a influência da globalização na formação profissional em educação física, fazendo uma análise inicial desde questões mais amplas como sistema econômico vigente, passando pela globalização até chegar na educação física.


 Atualmente estamos presenciando no mundo várias transformações advindas, "de políticas estruturais, que são estratégias do processo de reestruturação neoliberal" (TAFFAREL, 1998, p.13). Estas transformações estão sendo impostas aos países do capitalismo periférico, pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, que estão servindo aos países do capitalismo central (ibid).


 Essa construção hegemônica do neoliberalismo vai se impondo através de reformas em vários planos, sejam estas educacionais, sociais, econômicos, políticos, etc. Ideologicamente, os financiadores do neoliberalismo, incutem a idéia de que esta é "uma nova solução, senão a única, para enfrentar os problemas sócio-econômicos" (FARIA JUNIOR, 1997, p. 45).


 No entanto, a análise de realidades recentes têm apontado o contrário. Segundo Faria Junior (ibid), estatísticas mundiais comprovam o fracasso neoliberal em resolver os problemas da pobreza e miséria, ocorrendo até de haver um aumento acentuado dos mesmos. No tocante a estas transformações, este breve ensaio discorrerá sobre uma delas que é a globalização e sua influência na formação profissional em educação física.


 A globalização é tida hoje como um processo universal, inexorável, irreversível e já consumado em sua forma atual (ibid). Sobre esta idéia (ideologia), podemos perceber que este processo já estava para acontecer, se fazendo necessário ao ponto de não se questionar seus determinantes como se fosse a ordem natural das coisas, cabendo aos países do capitalismo periférico se adaptarem a esta realidade. A globalização em sua essência, prega, por um mundo sem fronteiras que impeça o livre comércio e as relações afins entre os países, promovendo um mercado livre que regulará as relações sociais de produção (PINHEIRO, 1997).


 Em contrapartida, sabemos que na verdade a globalização é um processo concentrador e excludente, que só vem a atender os interesses dos países do capitalismo central, deixando os países do capitalismo periférico à sua mercê.


 Outro ponto que merece ser ressaltado é que a "esta nova ordem significa Estado Mínimo, ou seja, forte e centralizado politicamente, mas descentralizado e minúsculo enquanto intervenção econômica" (ibid, p.67).


 Dessa forma o Estado se desobriga de gerir financeiramente a educação, que antes era de sua obrigação (firmada à base de compromisso político e arrecadação de impostos), incentivando a iniciativa privada; porém ele continua sua influência no corpo de conhecimento. Uma prova clara de que tal fato está acontecendo é a situação de sucateamento das universidades públicas, promovida pelo Estado, com a proposta (projeto) da autonomia universitária (medida privatista).


 Com a reorganização do mundo do trabalho ditadas pela globalização, um novo perfil de trabalhador se faz necessário para atender as exigências de um mercado dinâmico ( Silva, 1997). Ao se pensar neste trabalhador, é válido imaginar quem vai prepará-lo. A partir daí nos remete a pensar ne escola, e com isso, nas adaptações feitas no plano educacional. O corpo de conhecimentos, tratados na escola, será para preparar o indivíduo para um mercado de trabalho a qual não caberá a crítica da realidade.


 Um outro ponto que merece ser mencionado é que o professor também deverá ser preparado para contribuir com essa formação. Isto nos remete a pensar na formação. desses professores. A universidade também passa por este reajuste, principalmente no que concerne a "adaptar os perfis profissionais às contínuas transformações no mercado de trabalho"(TAFFAREL, op.cit, p.17). Com relação à licenciatura, a formação do futuro professor deverá lhe possibilitar uma intervenção subordinada não só a uma visão tecnicista, mas para além disto, uma visão multifuncional, visando a superação de modelos de produção do passado (Taylorista/Fordista). Para questão de elucidação, estes modelos se baseavam no trabalhador adquirir modos de pensar definidos e restritos a partir do lugar a ser ocupado no trabalho segmentado e hierarquizado, denotando uma total alienação de todo o processo de produção. Um exemplo clássico destes modelos é a linha de montagem das fábricas de veículos, onde cada trabalhador tem uma função específica a desenvolver na construção dos mesmos, não tendo que pensar criticamente em seu labor, mas apenas desenvolver movimentos repetidos.


 A partir deste ponto, ao nos reportarmos à educação física, possíveis pensamentos que podem (e devem) ser refletidos são: sobre a sua contribuição na formação deste novo trabalhador (de acordo com estas tendências), além da sua permanência no âmbito escolar caso não contemple, em sua prática, para essa formação. Na escola, matérias como Português, Matemática e Inglês têm valor para estas novas tendências, principalmente, pelo corpo de conhecimento que possuem. E a educação física? Será que seu corpo de conhecimento também tem o seu valor?


 As respostas para tais perguntas talvez possam ser respondidas ao se pensar na graduação. A educação física atualmente tem passado por profundas mudanças principalmente com relação a formação dos futuros profissionais que, encantados com o ideário do profissional liberal, estão dando maior ênfase em seus estudos, para a área não formal. Em contributo a isto, boa parte dos professores, tem propiciado que o currículo seja voltado para esta formação. O que está colocado hoje é a educação física enquanto promotora da saúde (RAMOS, 1997). Frente a esta situação, a presença da educação física na escola fica complicada. De um lado a mesma vai perdendo espaço na escola, pois seu corpo de conhecimento não é tão importante quanto as outras matérias, além de ser menos uma responsabilidade para o Estado gerir mais esta disciplina conforme o projeto neoliberal. De outro, os graduandos estão direcionando sua formação para o meio não formal, que não é gerido nem garantido pelo Estado. Em vista disto, podemos perceber (temer) que a retirada da educação física do meio escolar é um fato que não demora a ser consumado.


 A atual formação profissional em educação física configura desta forma a situação de se ter um "novo campo" de atuação regulamentado. Em contrapartida, somos praticamente empurrados do meio formal. O texto da nova LDB comprova isto claramente quando trata da educação física escolar (PINHEIRO, po.cit,1997).


 Em relação a situação supra citada, gostaria de fazer a exposição de uma análise, pois a mesma não diz respeito tão somente em perder um campo de atuação e ganhar outro. Para esta exposição, defini dois aspectos em que vou me ater, sendo eles: A Precarização de Trabalho e o Projeto de Formação Humana.


 Com relação ao primeiro aspecto, os eventos atuais têm demonstrado uma desregulamentação do trabalho generalizada em vários setores. O fenômeno da precarização do trabalho tem sido apontado por Antunes (1997), quando fala na redução do proletariado fabril em detrimento da automação; e paralelamente a isto no aumento da "subproletarização do trabalho presentes na forma de trabalho precário, parcial, temporário, subcontratado (...) vinculados à economia informal" (p. 44).


 Com a educação física acontece da mesma forma. Perdendo espaço no âmbito escolar que possui direitos historicamente conquistados de trabalho, os professores estão sendo lançados no meio não formal, onde se tem um trabalho precário sem direitos trabalhistas garantidos.


 Com relação ao projeto de formação humana, a saída do âmbito escolar implicaria na perda de um espaço onde a educação física ainda tem a possibilidade de ter uma autonomia pedagógica para atuar numa perspectiva crítico-superadora, fugindo aos códigos do sistema hegemônico vigente.


 Sendo assim, devido ao reordenamento do mundo do trabalho, galgado no neoliberalismo, a educação física vem sofrendo profundas transformações tanto na formação dos futuros professores, como também na sua relação de trabalho. Portanto, é necessário que nos mobilizemos frente a esta situação, fugindo ao ideário funcionalista de que professor de educação física não deve se meter em questões políticas, devendo deixar isto para os políticos. De nada adianta saber e concordar com os conhecimentos expostos, se não for para causar a transformação social.


 Obs. O autor é acadêmico da FAEFID-UFJF e o trabalho foi orientado pelo prof. Hajime Takeuchi Nozaki


 Referências bibliográficas


 Antunes, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 4. ed. São Paulo: Cortez; Campinas, 1997.
Faria Junior, Alfredo Gomes de. Educação física: globalização e profissionalização - uma crítica à perspectiva neoliberal. Motrivivência. Santa Catarina. Ano IX, n. 10, p.44-60,dez, 1997.
Pinheiro, Maria do Carmo Morales. Discutindo alguns pontos da Nova-Velha LDB. Caderno de debates. Ano IV, Vol.05, p. 63-74, jul, 1997.
Ramos, Alexandre Trindade. Atividade física- diabéticos, gestantes, 3ª idade, crianças, obesos. Rio de Janeiro. Sprint: p. 16, 1997.
Silva, Paulo da Trindade Nerys. Globalização: a nova cultura do trabalho e seus impactos. Motrivivência. Ano IX, n. 10, p.121-141,dez,1997
Taffarel, Celi Nelza Zulke. A Formação Profissional e as Diretrizes Curriculares do Programa Nacional de Graduação: O Assalto às consciências e o Amoldamento Subjetivo. Revista de Educação Física/UEM, p..13-23,1998.