Resumo

A lesao medular (LM) produz interrupcao do fluxo neural atraves da medula espinhal. Quanto mais alto for o nivel da LM, maior e mais abrangente sera a perda das funcoes do sistema nervoso somatico e autonomo. A lesao medular provoca paralisia dos musculos esqueleticos inervados pelo segmento lesado e todos segmentos abaixo deste nivel. As principais sequelas sao: atrofia muscular e ossea, comprometimento da funcao vasomotora e ventilatoria, funcao cardiaca reduzida, queda geral na aptidao cardio-respiratoria e da capacidade fisica. Consequentemente, o lesado medular torna-se dependente, sedentario e predisposto a varias doencas e a menor longevidade (NOREAU & SHEPHARD, 1995). Com o desenvolvimento tecnologico, os individuos portadores de LM, progressivamente tem aumentado a longevidade e buscado recursos para melhora da qualidade de vida. A atividade fisica para portadores de defiCiência, principalmente os lesados medulares, representa uma alternativa muito importante tanto no processo de reintegracao social como em termos de terapia e prevencao de doencas. O uso do exercicio visando Saúde e qualidade de vida requer a aplicacao dos conhecimentos de fisiologia do exercicio para que a atividade fisica possa ser realizada de forma precisa e eficiente. Existem entretanto, muitas questoes nao definidas em aspectos relevantes da fisiologia do exercicio em lesados medulares. A aptidao cardio-respiratoria em portadores de lesao medular e usualmente avaliada atraves do pico de consumo de oxigenio (VO2pico). Aparentemente, dois fatores poderiam interferir na aptidao cardio-respiratoria de portadores de lesao medular: (1) nivel e tipo de LM e (2) habito de atividade fisica (NILSSON et al., 1975). Porem, nao existem estudos conclusivos do que limitaria o VO2pico em individuos com lesao medular. Alguns autores verificaram uma correlacao entre o nivel de LM e o VO2pico (COUTTS, RHODES, McKENZIE, 1983; VAN LOAN et al., 1987; ERIKSSON, LOFSTROM, EKBLOM, 1988; BURKETT et al., 1990). Contudo, NOREAU & SHEPHARD (1995) revendo estudos realizados entre 1980 e 1994 nao perceberam qualquer relacao entre o VO2pico e o nivel de LM em paraplegicos. No estudo realizado por ERIKSSON et al. (1988) foi verificado que o tipo de LM poderia ter influencias sobre os resultados de VO2pico. Neste estudo os paraplegicos portadores de LM incompleta obtiveram valores mais altos de VO2pico que os paraplegicos portadores de LM completa. DAVIS & SHEPHARD (1988), ERIKSSON et al. (1988), BURKETT et al. (1990) e GREVE et al. (1992) encontraram diferencas significantes entre individuos portadores de LM com diferentes habitos de atividade fisica. SHEPHARD & DAVIS (1991) acreditam que a influencia do nivel de LM pode se tornar mais visivel apos treinamento fisico rigoroso. DAVIS (1993) revendo alguns estudos realizados desde a decada de 70, concluiu que as diferencas na aptidao cardio-respiratoria em paraplegicos poderiam ser explicadas simplesmente como resultado de treinamento e de um habito de vida mais ativo. Alguns dos trabalhos que estudaram o pico de consumo de oxigenio nos portadores de lesao medular divididos pelo nivel de lesao medular (COUTTS et al. 1983; VAN LOAN et al., 1987; ERIKSSON et al., 1988; BURKETT et al., 1990) e/ou por habito de atividade fisica (DAVIS & SHEPHARD, 1988; ERIKSSON et al., 1988; BURKETT et al., 1990; GREVE et al., 1992) falharam na selecao dos voluntarios, quanto as seguintes caracteristicas: sexo (VAN LOAN et al., 1987), nivel de lesao medular (ERIKSSON et al., 1988; GREVE et al., 1992), tipo de lesao medular (VAN LOAN et al., 1987; DAVIS & SHEPHARD, 1988; BURKETT et al., 1990, GREVE et al., 1992) e o habito de atividade fisica (COUTTS et al., 1983; VAN LOAN et al., 1987). O objetivo principal deste estudo foi o de verificar as influencias do nivel de lesao medular e do habito de atividade fisica nas respostas cardiovasculares, respiratorias e metabolicas ao exercicio em individuos portadores de lesao medular, agrupados de forma homogenea quanto ao sexo, idade, peso corporal total, estatura, habito de atividade fisica, tipo, tempo e nivel de lesao medular. Nos estudamos 50 paraplegicos usuarios de cadeiras de rodas com LM completa, segundo os criterios da American Spinal Injury Association (ASIA, 1996), entre os niveis T1 e L2, com tempo de LM maior que 10 meses. Os voluntarios foram agrupados de acordo com dois criterios: (1º) nivel de LM segundo a classificacao anatomo-funcional esportiva da International Stoke Mandeville Games Federation (ISMGF) nas classes II (T1-T5, n = 17), III (T6-T10, n = 19) e IV (T11-L3, n = 14) e (2º) habito de atividade fisica (grupo de desportistas u DESP, n = 28 e grupo de nao-desportistas u NDESP, n = 22). Foi considerado desportistas o voluntario que praticava algum tipo de desporto competitivo duas vezes ou mais por semana ha mais de tres meses consecutivos apos a reabilitacao inicial. Todos os voluntarios, apos avaliacao clinica e espirometrica, foram submetidos a teste de esforco incremental ate a exaustao em cicloergometro de membros superiores (aquecimento u carga de 25 watts durante dois minutos / incrementos de 12,5 watts a cada dois minutos ate a exaustao). Simultaneamente foram realizadas medidas ergoespirometricas (sistema metabolico Vista CX, Vacumed u EUA), para obtencao das respostas cardiovasculares, ventilatorias e metabolicas durante exercicio. Os resultados obtidos foram analisados quanto ao efeito do nivel de lesao medular (diferentes niveis de lesao medular para o mesmo habito de atividade fisica) e do habito de atividade fisica (grupo de desportistas e grupo de nao-desportistas para o mesmo nivel de lesao medular). Testes estatisticos parametricos e testes nao-parametricos foram aplicados de acordo com a natureza da variavel estudada. Os resultados obtidos foram analisados em duas condicoes: (1) durante o esforco maximo e (2) na intensidade de exercicio correspondente ao limiar anaerobio, determinado pelo metodo ventilatorio (LAV). Todos as classes e grupos estudados nao apresentaram diferencas significantes quanto a idade, estatura, peso corporal total e tempo de LM. Os resultados do presente estudo mostraram que as variaveis espirometricas sao pouco influenciadas pelo nivel de lesao medular e habito de atividade fisica em paraplegicos. Apenas os valores de capacidade vital forcada (CVF) em litros para DESP e em porcentagem do previsto (CVF %prev) para DESP e NDESP apresentaram diferencas entre os niveis de lesao medular (classe IV > classe II). Por outro lado, as respostas fisiologicas ao exercicio em paraplegicos foram influenciadas pelo nivel de lesao medular e/ou pelo habito de atividade fisica. O VO2pico obtido durante exercicio em cicloergometro de membros superiores foi sensivel para detectar os efeitos do habito de atividade fisica em todos os niveis de lesao medular estudados. O nivel de lesao medular interferiu no VO2 pico independentemente do habito de atividade fisica. Neste caso, o VO2pico em mL.kg-1.min-1 pareceu ser mais adequado. O VO2pico em paraplegicos parece nao ser limitado pela ventilacao voluntaria maxima (VEmax). O consumo de oxigenio no limiar anaerobio ventilatorio (VO2lav) obtido em cicloergometro de membros superiores foi maior em paraplegicos nos grupos de desportistas em relacao aos grupos de nao-desportistas. O nivel de lesao medular interferiu no VO2lav, sendo que os individuos com lesao medular mais baixa (T11-L3) apresentaram valores mais elevados (VO2lav em L.min-1) tanto para os grupos de desportistas como para os grupos de nao-desportistas. A resposta ventilatoria ao aumento da demanda metabolica obtida durante o exercicio cicloergometro de membros superiores em paraplegicos, estimada pela razao VE e a producao de gas carbonico (VCO2), a VE/VCO2, foi semelhante aquela descrita para individuos sem defiCiência em exercicio com membros inferiores. Adicionalmente durante exercicio maximo e submaximo, individuos paraplegicos apresentaram um padrao respiratorio taquipneico. Os resultados do presente estudo mostraram que, diferentemente da populacao sem defiCiência, a frequencia cardiaca maxima (FCmax) poderia ser influenciada pelo habito de atividade fisica independentemente do nivel de lesao medular em paraplegicos durante exercicio em cicloergometro de membros superiores. Por outro lado, o valor de FCmax prevista usando a formula da idade (220 u idade) e geralmente atingido por paraplegicos desportistas e nao-desportistas com um numero maior de excecoes (quatro individuos num grupo de nove voluntarios) entre os nao-desportistas de lesao medular mais alta (T1-T5). Adicionalmente, paraplegicos desportistas atingiram valores mais elevados de FC, VO2 e carga de trabalho no LAV em relacao aos paraplegicos nao-desportistas. A analise do pulso de oxigenio durante exercicio maximo (PulsoO2max) sugere que para todos os niveis de lesao medular, o habito de atividade fisica aumenta o volume sistolico maximo em paraplegicos durante exercicio em cicloergometro de membros superiores. E importante salientar que as diferencas descritas em relacao ao nivel de lesao medular geralmente se referem as classes II e IV. Aparentemente as variaveis estudadas nao foram sensiveis para diferenciar individuos com niveis proximos de lesao medular (classe III em relacao as classes II e IV). Palavras chave: aptidao fisica u exercicio fisico u esportes u teste ergometrico com os bracos uconsumo de oxigenio u limite anaerobio u paraplegia

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