Resumo

Na presente pesquisa, buscou-se entender como o treinador das categorias de base do futebol masculino no Brasil, na faixa etária sub-15, define o jovem jogador, levando em consideração as possíveis influências mercadológicas e midiáticas em seu ambiente de trabalho e, consequentemente, em seu olhar. No meio do futebol, é usual que jogadores sejam descritos como mercadorias. Um exemplo disso é a palavra joia, usada como referência a um jovem jogador de grande talento ou potencial. Também são frequentes relatos de que, nos ambientes de formação, jovens jogadores enfrentam situações como distanciamento escolar e familiar, além de diversos tipos de abusos conflitantes com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), uma lei federal que versa sobre os direitos básicos de crianças e jovens no Brasil. Por meio de entrevistas com 25 treinadores da categoria sub-15 de clubes de futebol filiados à Confederação Brasileira de Futebol (CBF); da análise da Lei Pelé e do Certificado de Clube Formador (CCF), que regula a relação de trabalho entre clubes e jovens jogadores; da descrição de jogadores como “joias” em sites jornalísticos especializados; do ECA e de documentos balizadores da ética profissional na área da Educação Física, formação frequente dos treinadores de futebol no Brasil; e com o auxílio dos estudos de mídia e esporte de Bourdieu e Mauro Betti, verificou-se que o modo como os treinadores entrevistados definem os jovens jogadores se apresentou distanciado do praticado pela mídia, demonstrando uma baixa influência da segunda sobre as definições dos primeiros. Enquanto a mídia define, frequentemente, o jovem jogador como uma mercadoria, ou joia, o treinador o enxerga de maneira mais humanizada. As influências midiáticas apontadas na rotina do treinador se relacionam mais ao ambiente de trabalho. Em contrapartida, de acordo com as respostas dos entrevistados, os clubes enxergam os mesmos jovens muito mais como mercadorias do que como seres humanos, conceito próximo do que é apresentado na redação do artigo 29 da Lei Pelé, que versa sobre a relação de trabalho entre clube e jogador em formação. Em relação aos direitos básicos dos jovens jogadores, dados disponibilizados pela CBF sobre o CCF e pela Federação Paulista de Futebol (FPF) sobre competições sub-15 reforçam a impressão de que as violações ao ECA são frequentes nos centros de formação e, por conta disso, o treinador se encontra atuando em um ambiente que o coloca em conflito tanto com o próprio estatuto quanto com documentos balizadores da ética de sua profissão.  O desempenho profissional dos treinadores é avaliado majoritariamente por questões esportivas, sendo pouco observada a sua conduta ou o processo de formação humana dos jovens jogadores, de modo que, de acordo com as respostas dos entrevistados, os treinadores são pouco exigidos nesses dois aspectos pelos seus empregadores

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