Resumo


 

Integra

Já cantava o poeta Cazuza, o tempo não para. Diferentemente do filme “O dia da marmota”,
cujo roteiro descreve uma cena que volta a acontecer todos os dias em função de um evento
específico, nossos dias são marcados pelas mesmas 24 horas. Queiramos ou não, gostemos ou
não, estamos imersos na realidade produzida pelo desencadear de fatos que nos atormentam.
Desculpem, não há como falar de esporte, arte, política e sociedade do presente sem nos
referirmos à pandemia de covid-19.

Gostaria de falar apenas da aproximação dos Jogos Olímpicos de Tóquio, afinal faltam menos
de 100 dias para a cerimônia de abertura. Sua realização extemporânea será lembrada no
futuro pelos estudiosos do olimpismo como uma edição extraordinária em virtude do caos
humanitário provocado por um vírus incontrolável, pela insensibilidade de alguns líderes e
pela falta de responsabilidade e liderança de outros. Será comparada com as interrupções
ocasionadas apenas pelas grandes guerras mundiais de 1916, 1940 e 1944.

Lembrando que em 1940 as medalhas já tinham sido cunhadas e depois se tornaram valiosas
peças para colecionadores. Ou ainda, em 1944, numa demonstração de que Jogos Olímpicos
são muito mais do que competição, foi celebrado algo como um encontro dentro de um
campo de concentração marcado por premiar os participantes com medalhas de papel.

Escrevo essas considerações também ponderando que nesses menos de 100 dias muitas coisas
poderão acontecer. Vale destacar que 72% da população japonesa deseja que os Jogos
Olímpicos sejam transferidos para outra data ou que não ocorram, segundo pesquisa recente.
Na medida do impossível está dando para se viver, como canta a rockeira Rita Lee, e ninguém
melhor que os anfitriões para afirmarem essa máxima. Com todo o cuidado que está sendo
tomado, por quem considera que o covid-19 é mais do que uma gripezinha, é difícil realizar
uma festa mesmo para convidados da mesma casa, com artistas vindos de fora.

Ao longo desse longo ano de pandemia não foram poucas as dificuldades vividas por atletas
para chegarem a competir em Tóquio. O isolamento comprometeu treinamentos e
competições preparatórias. Outros tantos foram contaminados com menor ou maior grau de
sequelas. Algumas equipes não conseguem viajar porque muitos países impedem que
brasileiros passem por suas fronteiras. Ou seja, o princípio olímpico da igualdade está
quebrado, muito embora todos batalhem pela excelência. E isso é inspirador.

Em um momento em que todos buscam resguardar o seu trabalho os atletas tentam se manter
vivos. Pesquisa recente mostra como é difícil ser a favor ou contra do objetivo maior da vida.
Poucos têm a certeza de um novo ciclo olímpico e a continuidade da carreira em 4 anos. Esse é
um dado que assombra muitos atletas que conheço. Quanto tempo ainda resta para o fim?

Claro que compreendo o desejo de seguir rumo aos Jogos Olímpicos, a qualquer preço. Nem
por isso meu coração fica menos apertado diante dos riscos. As bolhas têm mostrado
problemas, porque elas são permeáveis quando justificativas de ordem pessoal se impõem.
Nas modalidades coletivas essa variável é potencializada pelo número de pessoas envolvidas
nas atividades. Mães e pais estão aflitos para verem seus filhos e filhas que também estão
saudosos de seus pais, maridos e esposas.

E o vírus, indiferente a tudo isso, segue contaminando, provando a impotência de humanos
arrogantes.