Resumo
As colônias de férias escolares tiveram como maior suporte teórico antigos conhecimentos advindos da medicina que priorizavam uma vida ao ar livre, distante dos centros urbanos, para a recuperação e o fortalecimento corporal. Ao oferecerem uma substanciosa alimentação e práticas corporais realizadas junto à natureza às crianças de classes populares no decorrer das férias escolares, tiveram por objetivo principal, inicialmente prevenir o contágio de doenças, sobretudo a tuberculose, que debilitavam a saúde de muitos moradores de grandes cidades. Por meio de congressos, as colônias de férias foram divulgadas entre a comunidade científica internacional a partir de 1882, sendo frequentemente recomendadas como uma inovadora medida de assistência infantil que diversos países poderiam adotar para proteger a saúde de suas crianças. Ao tomar como fontes principais os anais dos Congressos Internacionais de Higiene e Demografia, dos Congressos Pan-Americanos da Criança e, ainda, revistas especializadas em saúde, educação e educação física, muitas publicadas por instâncias administrativas oficiais, a pesquisa centralizou-se em investigar as principais políticas de implementação de colônias de férias para as crianças de quatro dos maiores centros urbanos sul-americanos das primeiras décadas do século XX: Buenos Aires, Montevidéu, Rio de Janeiro e São Paulo. O recorte temporal foi definido de 1882, quando as colônias de férias começaram a ser debatidas no cenário internacional, até meados da década de 1950, momento no qual os primeiros medicamentos alopáticos para o tratamento da tuberculose passaram a ser empregados de modo mais efetivo no controle da doença, alterando as políticas de saúde pública de muitos países, que deixariam de adotar os recursos da vida ao ar livre para preservar a saúde de suas populações, e destituindo as colônias de férias do seu principal objetivo médico. A pesquisa procurou expandir os estudos realizados pela História da Educação e pela História da Educação Física, uma vez que as colônias de férias apresentam-se na atualidade como um objeto de estudos ainda pouco explorado pela ciência sul-americana, mas que, no entanto, nos narram processos históricos bastante inovadores ao se estabelecerem como uma instituição concomitantemente próxima e distinta da escola, onde foram gestadas e aplicadas novas práticas e modelos pedagógicos e onde conteúdos antes excluídos das pedagogias mais tradicionais encontraram a oportunidade de serem incorporados enquanto possibilidade educativa. Ao adotar a história cultural como principal referencial teórico para a análise das fontes, foram priorizadas as transformações das mentalidades e sensibilidades que deslocaram a vida ao ar livre de seus preceitos médicos para concebê-la como uma educação do corpo passível de ser sistematizada e institucionalizada pelas colônias de férias. Durante o período abordado pela pesquisa, foi possível concluir que as colônias de férias não se limitaram tão somente a uma medida de saúde pública, uma vez que organizaram em seu interior uma série de procedimentos que transformariam definitivamente as férias escolares em uma aventura do corpo que possibilitava que muitos desejos infantis se tornassem realidade e que demarcava novas possibilidades educativas voltadas especialmente à crianças que não tinham, até então, seus direitos à saúde, à educação e ao brincar integralmente respeitados