Resumo

Este artigo busca analisar possibilidades de inserção e reconhecimento de mulheres transexuais e/ou travestis que jogam em times femininos de voleibol de alto rendimento na cidade de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul. Para isso, é levado em consideração também a cena brasileira, devido a influência midiática de casos envolvendo campeonatos nacionais. O método de pesquisa utilizado foi a etnografia off-line (AMARAL, NATAL, VIANA, 2008) e on-line (MISKOLCI, 2011). No ambiente off-line, a observação participante se deu a partir de um campeonato local, envolvendo entrevistas semiestruturadas com duas interlocutoras. No que se refere ao ambiente on-line, foi desenvolvido trabalho de campo em jornais e nas redes sociais. Entendendo que esses ambientes off-line e on-line se retroalimentam, buscamos problematizar quais são os poderes/saberes (FOUCAULT, 2008) que legitimam, ou não, essa inserção das jogadoras transexuais em Campo Grande. Assim como, percebemos o quanto a categoria travesti deixa de ser usada no contexto do vôlei de alto rendimento, mas não necessariamente é abandonada pelas interlocutoras, pois, em certa medida, essas identidades raramente são construídas de forma centrada em categorias fixas e permanentes (VENCATO, 2003). Os dados apontam para o quanto essas jogadoras transexuais e/ou travestis têm sido vistas não apenas como ameaças possíveis à ordem de uma matriz de integibilidade/reconhecimento de gênero (BUTLER, 2013), mas, a partir do momento em que elas estão inseridas em quadra, também começam a fazer parte da estratégia de jogo do time em busca da vitória. Por mais que essas mulheres transexuais sejam legalmente reconhecidas como tal, há um antes “homem” que não é esquecido, pelo contrário, é constantemente lembrado. A existência do órgão genital masculino em um corpo passável enquanto feminino (DUQUE, 2017) as alocam em um lugar de abjeção (BUTLER, 2018), mas também de suposta virilidade, o que se torna, na lógica local, um fator decisivo para uma possível superioridade em quadra. Isto é, o corpo da mulher transexual é visto como um corpo capaz de anular ou diminuir todo o treinamento e práticas de jogo de mulheres não transexuais, por isso ela é vista, em alguns casos, disputadas pelos times. Neste sentido há uma possibilidade de inserção e reconhecimento, algo que poderíamos chamar de “reconhecimento tático e estratégico de jogo” que vai além de uma possível visibilidade trans positiva. Existe, dentro da lógica de inteligibilidade do sistema esportivo, uma maneira de inserção dessas transexuais nos time que as contrataram visando benefícios para o grupo, mas que não necessariamente as reconhece como mulheres.
 

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