Integra

Para se discutir acerca de metodologia educacional faz-se necessário conceituá-la primeiramente. A metodologia estuda os métodos de ensino, classificando-os e descrevendo-os, sem julgar ou dar algum valor. O significado etimológico da palavra método é caminho a seguir para alcançar algum fim (PILETTI, 1995, p.102). Ou seja, a metodologia é um roteiro geral para a atividade, é ela que indica as grandes linhas de ação utilizadas pelos professores em suas aulas, pois é o meio de que lança mão para se trabalhar os conteúdos curriculares e se alcançar os objetivos pretendidos.

No final do século passado, os métodos tradicionais se revelaram inadequados às características da sociedade em transformação, começaram, então, a surgir os métodos novos, que procuraram apoiar-se na estrutura psicológica do aluno.

É importante salientar, ... que os métodos chamados tradicionais ou novos são assim considerados em razão do enfoque central que dão aos diferentes elementos envolvidos na ação educativa. Da mesma forma que caracterizamos a educação tradicional como apoiada na autoridade, no professor, e a educação renovada como aquela que se fundamenta no aluno, nas suas motivações e em seus interesses, os métodos de ensino podem ser entendidos nessa mesma linha de raciocínio.Com o conhecimento cada vez maior das ciências da educação, é natural que os métodos também passem a ser afetados pelos novos conhecimentos que se adquirem dia a dia a respeito da aprendizagem (PILETTI, 1995, p. 103).

Entende-se por metodologias tradicionais os métodos em que cabe ao professor transmitir os conhecimentos, e aos alunos apenas recebê-los de forma passiva, ouvindo, memorizando e repetindo o conhecimento. Já as novas metodologias procuram basear-se no princípio de que a criança é um ser em desenvolvimento, cuja atividade, espontânea e natural, é condição para seu crescimento físico e intelectual. A participação ativa do aluno consubstancia-se primordialmente no espaço que o professor reserva para as descobertas do educando (PILETTI, 1995, p.104). Os novos métodos preocupam-se, principalmente, com a vida social da criança, fator este fundamental para seu desenvolvimento intelectual e moral.

De acordo com Daolio (1998), na Educação Física os métodos tradicionais foram considerados aqueles em que o conhecimento gira em torno das modalidades esportivas, aos tratados de fisiologia esportiva e a manuais de preparação física, de forma mecânica e automatizada. De acordo com BETTI apud DAOLIO (1998, p.51), "na primeira metade desse século, a discussão, no máximo, referia-se aos métodos de ginástica aqui implantados: o sueco, o francês, a calistenia e outros de menor repercussão". Posteriormente a esse período, os profissionais dessa área começam a refletir sobre a Educação Física não somente como uma atividade técnica ou biológica, mas sim como um fenômeno psicológico e social buscando, em estudos na área da pedagogia e da psicologia, base para a construção de novas teorias e metodologias da educação física escolar.

Foi a partir da década de 70 que no Brasil houve um desdobramento de várias vertentes na Educação Física. Entre os profissionais de educação física dessa disciplina ganha destaque a psicomotricidade, influenciada por obras de Le Bouch e Piaget, e que valoriza a formação integral da criança, centrada na "educação pelo movimento". Outra linha de estudo que serviu como norteadora foi à educação física humanista que se opunha à visão fragmentada do comportamento humano, à mecanização e automatização de movimento.

Já na década de 80, João Batista Freire propõe uma redescoberta do corpo. "A educação da motricidade de que fala Freire se constituiria numa educação das habilidades motoras permitindo ao homem expressar-se" (DAOLIO, 1998, p.48). O autor valoriza o conhecimento espontâneo de jogos, brincadeiras e atividades motoras desenvolvida pela criança, dando ênfase, assim, à cultura infantil.

Além de um movimento de renovação da Educação Física expresso pela psicomotricidade ou pelo humanismo de Oliveira ou de Freire, agora há a explicitação da crítica aos condicionamentos históricos da educação e da sociedade. Se antes a preocupação restringia-se ao desenvolvimento das relações interpessoais, à auto-estima e aos aspectos motivacionais do indivíduo, agora a intenção era atuar na educação física de modo a contribuir para a transformação da sociedade, numa perspectiva mais ampla (RESENDE, 1992).

Essa última tendência foi explicitada no livro "Metodologia do ensino de educação física" em que um coletivo de autores procuram considerar a educação física como matéria escolar que trata pedagogicamente de temas da cultura corporal, ou seja, os jogos, a ginástica, as lutas, o esporte e outros.

As várias expressões da chamada cultura corporal são consideradas como formas de representação do mundo que o homem foi produzindo ao longo da história, constituindo-se no conhecimento abarcado pela educação física. Além de praticadas na escola, essas expressões devem ser refletidas a fim de que sejam assimiladas pelos alunos" (DAOLIO, 1998, p.55)

Percebemos três grandes tendências que hoje envolvem a educação física escolar. Apresentada por vários autores, essas tendências influenciam a prática pedagógica dos profissionais dessa área. Porém, mesmo com o surgimento dessas novas tendências e com os lançamentos de várias bibliografias em busca de uma modificação ou de uma atualização da educação física escolar, não podemos afirmar que ela esteja sendo realmente modificada na prática.

Preocupada em identificar quais as metodologias que os professores de Educação Física utilizam em suas aulas, e se essa metodologia descrita por eles encontra-se presente em suas aulas, venho a partir desse estudo analisar as entrevistas dos professores de Educação Física da região metropolitana da Grande Vitória, com o fim de alcançar esse objetivo.

Metodologia

Esse estudo sobre a metodologia utilizada pelos professores de Educação Física de escolas públicas foi feito a partir de dados levantados no estudo "Diagnóstico da Educação física escolar no estado do Espírito Santo", que é uma pesquisa empírica de caráter descritivo que se valeu de técnicas quantitativas e qualitativas, realizado pelo Laboratório de Estudos em Educação Física (LESEF). No presente estudo, utilizarei as entrevistas dos professores das escolas públicas da região metropolitana da Grande Vitória. Das 19 escolas participantes na pesquisa, foi possível obter dados de 16. Dessa forma os dados referir-se-ão as 16 entrevistas dos professores da área de Educação Física.

Apresentação e discussão dos dados

Ao analisar as entrevistas dos professores no que diz respeito à pergunta "qual a metodologia que você utiliza em suas aulas" pude observar o que os professores da região metropolitana do Espírito Santo entendem por metodologia. Percebo que 40% deles entendem que a metodologia advém da própria prática. Podemos constatar isso na fala do prof 5 que diz: "... talvez nossa prática, né, são 23 anos, nós é que fazemos a nossa mesmo". Para esses professores, a metodologia, ou seja, o seu método de dar aula, surge com a prática e esta lhes dá subsídio para criarem o melhor método a ser utilizado. Há ainda aqueles que consideram que a sua metodologia vem da prática, juntamente com tudo aquilo que aprenderam na faculdade, "é a bagagem de informações desde a época da faculdade, do que corre atrás, inclusive a questão dos cursos que a gente faz", relata o prof. 10.

Ainda no que diz respeito ao que o professor entende por metodologia, foram encontrados depoimentos como "metodologia é a própria criatividade..., usando a nossa mente" (prof. 11) ou ainda "ah, isso aí é uma misturada danada..." (prof.07). A fala desses professores nos leva a questionar se eles possuem algum conhecimento sobre metodologia de ensino.

O que se percebe é que muitos desses professores não sabem ao certo o que vem a ser metodologia, ou mesmo não possuem uma noção muito clara sobre o assunto. Nas entrevistas, 30% deles não souberam responder qual a metodologia que utilizam, entraram em assuntos diferentes e até pediram para desligar o gravador enquanto formulavam uma resposta.

O fato de esses profissionais não saberem indicar sua metodologia de trabalho não significa que eles não possuam um método para lecionar. Pode não estar claro, para eles a metodologia que utilizam, mas alguma linha de ação eles devem utilizar no decorrer das aulas. O professor ao dirigir e estimular o processo de ensino em função da aprendizagem dos alunos, utiliza um conjunto de ações, passos, procedimentos de ensino e também "um método de reflexão e ação sobre a realidade educacional, sobre a lógica interna e as relações entre os objetos, fatos e problemas dos conteúdos de ensino, de modo a vincular a todo o momento o processo de conhecimento e a atividade prática humana no mundo" (LIBÂNEO, 1995, p.151). As metodologias são as formas pelas quais os objetivos e conteúdos se manifestam no processo de ensino. Ao selecionar e aplicar um conteúdo, o professor estará utilizando um método para desenvolvê-lo.

Na Educação Física encontramos diversas metodologias que abordam as várias maneiras de lidar com os conteúdos e de como proceder diante da turma no trato com o conhecimento. Sabemos também que, apesar da existência de novas abordagens, há ainda a utilização dos métodos tradicionais por parte de alguns professores.

Verificando a metodologia que os professores de educação física da região metropolitana de Vitória utilizam, constatei que dois (prof 2 e prof 3) dos dezesseis professores utilizam o método tradicional, alternando-o um pouco com o método novo (não especificaram qual), relatam ainda que, mesmo usando o método tradicional, eles atualmente são mais maleáveis com os alunos, não são totalmente rígidos e autoritários. Percebo que quando esses professores citam o método tradicional, referem-se principalmente ao modo como eles lidam com os alunos.

Uma característica predominante do método tradicional de ensino é justamente a relação aluno-professor, que se manifesta de forma autoritária, e que nas novas metodologias é vista de outra forma. Um dos professores entrevistados diz basear-se no autor Roberto Pádua e em Davi Camargo, para a elaboração de suas aulas. Outros dois professores (prof 4 e prof 16) utilizam o método Piaget, ou "linha piagetiana", como um deles mesmo cita e, apesar de não relatarem nenhum livro, se baseiam no próprio Piaget. A psicomotricidade, baseada também em Piaget, trabalha a formação integral do aluno por meio do movimento e, embora esse não seja um autor específico da educação física, teve grande influência nessa área.

Os professores 07, 12 e 13 utilizam a metodologia "mistura tudo", pois de acordo com o prof 13 "metodologia você já tem, mas pode acrescentar mais, eu não me fecho em uma só metodologia, método, mas a gente usa tudo que possa contribuir para o desenvolvimento integral do aluno". Essa expressão utilizada por esses professores é preocupante, pois nos faz pensar que eles se apossam de um pouco de cada metodologia, junta tudo em uma só como se elas se completassem. É necessário entender que cada método vai tratar do conhecimento de forma diferenciada, e deve ser condizente com o objetivo que os professores têm com os alunos em relação ao conteúdo abordado.

Três dos demais professores citaram outras metodologias como o construtivismo, utilizado pelo professor 10 que se baseia no método Motessori, em que a metodologia está centrada essencialmente na criança; o professor 11 diz que sua metodologia é a própria criatividade, e não cita nenhuma bibliografia na qual se baseia; já o professor 14 diz que sua metodologia é ser democrático "não sendo tradicional de se impor com os alunos", cita como bibliografia o livro "Educação Física do pré à universidade". Os professores 1, 5, 6, 8, 9 e 15 não especificaram nenhuma metodologia, porém alguns citaram bibliografias que utilizam como o professor 1 que se baseia no livro de Hudson Ventura e o professor 8 que cita Celi Taffarel e João Batista.

Considerações finais

As metodologias mais discutidas no meio acadêmico na área de Educação Física nesses últimos tempos são: crítico-emancipatória (E. Kunz); crítico-superadora (Coletivo de Autores); psicomotricidade (Le Bouch); desenvolvimentista (Go Tani); e construtivismo (João Batista Freire). Pude, por meio das entrevistas, verificar que quase nenhuma referência a esses autores ou, até mesmo, a essas metodologias foram feitas. Percebi que, mesmo aqueles professores que responderam à pergunta sobre a metodologia que utilizam, não conseguiram deixar claro sua linha de ação, sua metodologia. Será que essas metodologias tão discutidas no âmbito acadêmico estão presentes no cotidiano escolar? Penso que, mesmo não citadas, encontrarei nas suas aulas desses professores indícios de algumas dessas metodologias, quando analisar o exemplo de aula dado por eles. É importante salientar, no entanto, que por este estudo ainda encontrar-se em andamento, está sujeito a novas conclusões.

Obs. A autora, Elisa Barcellos da Cunha e Silva, é bolsista PET-LESEF/CEFD/UFES

Referências bibliográficas

  • Cunha, Jurema Alcides. Síntese de métodos didáticos. Porto Alegre: Editora Globo, 1996.
  • Daolio, Jocimar. Educação física brasileira: autores da década de 1980. Campinas: Papirus,1998.
  • Libaneo, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1995.
  • Medeiros, Mara. Didática e prática de ensino da educação física: para além de uma abordagem formal. Goiânia: Ed UFG, 1998.
  • Neto, Amarílio Ferreira. Pesquisa histórica na educação física brasileira. Vitória: Centro de Educação Física e Desporto, Universidade Federal do Espírito Santo, 19996.
  • Piletti, Claudinho. Didática geral. São Paulo: Ática, 1995.
  • Soares, Carmen Lúcia et al. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992.