Resumo

O artigo parte, por um lado, da experiência etnográfica de participação I Jogos Mundiais dos Povos Indígenas (JMPI), que aconteceram de 23 de outubro a 1 de novembro de 2015 em Palmas (TO). Tal experiência envolveu tanto a observação participante nos jogos e nas rotinas da arena e da feira indígena armadas no complexo construído para o megaevento, quanto a coleta de materialidades midiáticas (panfletos publicitários, capas de jornais locais, site institucional e cobertura jornalística local e nacional) e a realização de entrevistas com alguns integrantes do grupo de comunicadores indígenas que trabalhou na cobertura do evento. Por outro lado, parte de uma reflexão que sublinha a invisibilidade de questões indígenas (não necessariamente de falas sobre os indígenas) nos espaços públicos brasileiros, reafirmando relações ontológicas que envolvem a história de contato oportunizada pela colonização e seus corolários. Atualmente, permanece a colonização do olhar para tais questões, embora, à força de movimentos político-culturais de resistência indígena, algumas rupturas se ensaiam e fazem sobre(vi)(ver) formas-de-vida contemporâneas e pretéritas, evidenciando a centralidade dos povos indígenas na geração de um protagonismo político e, por que não, desportivo. No texto, o gesto metodológico é o de colocar as experiências do discurso oficial e midiático bem como à lógica de consumo do corpo e dos objetos indígenas e uma proximidade a eles performada para câmeras fotográficas, filmadoras e celulares - máquinas de apagamento e silenciamento acionadas sob os holofotes da arena olímpica - ao lado dos esforços tanto de negação dos jogos (como é o caso dos Kaiowa do Conselho Aty Guasu) quanto de invenção da cultura, de diálogo interétnico com base na "cultura" e de indigenização das imagens e dos jogos como formas de existir de um outro modo criados pelos indígenas participantes. Os jogos, portanto, também fazem (sobre)viver para si e para os outros a cultura e a “cultura”, pois permeiam essas relações a “cultura”, com aspas, tal como a define Carneiro da Cunha (2009) num jogo recíproco de objetificações que de algum modo possa garantir o diálogo intercultural, ainda que este seja sempre permeado de equivocos (VIVEIROS DE CASTRO, 2004; 2005; 2008). Podem, desse modo, tanto significar tentativas performáticas de captura subjetiva quanto a possibilidade de invenção da cultura e de políticas de subjetivação ou tecnologias de si que fazem dobrar, à luz de outra intensidade, o jogo (como forma de competição) e o jogo (como forma política de disputa).

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