Resumo

Tratar como objeto científico a participação de homens homossexuais na assistência do futebol representa um contraste histórico e cultural que marca um deslocamento sobre a lógica desse esporte como espaço de resistência e manutenção de uma ordem heteronormativa ou, mais que isso, de um modelo de masculinidade esperado e aceito no campo do futebol. As lacunas existentes sobre essa temática justificam a relevância em problematizar o futebol e o torcer como espaços de vivência do lazer, cuja dominação de uma determinada masculinidade é evidenciada e valorizada. Dito isso, aos objetivos do trabalho foram investidas as seguintes questões: (1) como os torcedores gays se apropriam deste espaço; e, a partir da compreensão desse cenário, (2) quais discursos são produzidos por eles sobre a relação homossexualidade, homofobia e futebol. Para isso, dialogamos com autores e autoras cuja produção se insere nos Estudos Culturais, Queer e Feministas, para composição do arcabouço teórico utilizado na compreensão dos conceitos chave, bem como, de trabalhos que têm constituído um campo de Estudos sobre Futebol, no Brasil. Esta pesquisa assume uma natureza qualitativa na descrição e análise dos dados e o trabalho de campo fez uso de dois instrumentos de coleta - a observação participante e a entrevista semiestruturada - organizadas em dois momentos. As observações foram orientadas por um roteiro prévio e os registros dos quinze entrevistados foram organizados em quadros temáticos, a fim de que pudéssemos compreender, nas interseções dos discursos, os objetivos definidos, a priori. Entendemos, a partir dos discursos analisados, que nenhum dos informantes está alheio a homofobia nos estádios e na vivência do torcer, ainda que alguns deles não a reconheçam no futebol, atribuindo outros sentidos aos xingamentos e comportamentos ali experimentados. De maneira geral, eles se apropriam desses territórios, produzem e reproduzem comportamentos heterossexistas e homofóbicos de forma semelhante aos demais torcedores, alinhados a uma lógica heteronormativa de torcer. Foi providencial classificá-los, metaforicamente, como torcedores miméticos, ao refletirmos sobre as experiências que eles relataram viver com o futebol e seu clubismo. O termo mimético é entendido, aqui, como forma de proteção e defesa num processo de acolhimento e inclusão entre iguais, sustentado em referenciais de masculinidades e virilidades típicas dos estádios de futebol, onde o torcedor mimético se assemelha aos demais torcedores movidos por diferentes interesses ligados à vivência dessa prática de lazer.

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