Pessoas Transgênero no Esporte: Entre o Debate Acadêmico e o Preconceito.
Por Joaquim Francisco de Lira Neto (Autor), Alessandra Marques Lira (Autor).
Resumo
Atualmente, o tema da inclusão de pessoas transgênero em competições esportivas de alto rendimento tem sido alvo de intensos debates, sobretudo, a partir da presença de atletas trans nos Jogos Olímpicos de Tóquio, realizados neste ano. Entretanto, o tema ainda é abordado de forma preconceituosa, mesmo por personalidades consagradas no esporte. Objetivos: O presente trabalho tem como objetivo analisar os critérios balizadores da inclusão de pessoas transgênero no esporte de alto rendimento. Delineamento/Métodos: Foi realizada uma revisão bibliográfica de artigos encontrados na Plataforma Google Acadêmico, em busca efetuada com as palavras “transgêneros” e “esporte”. Foram selecionados os trabalhos que abordaram, especificamente, os critérios adotados por organizações esportivas internacionais que permitem a inclusão de pessoas trans no esporte. Resultados: A pesquisa bibliográfica empreendida revelou que a inclusão de pessoas trans no esporte ocorre segundo os critérios estabelecidos, sobretudo, pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) e pela Associação Internacional das Federações de Atletismo (IAAF). Apesar do tema em questão ter ganhado maior visibilidade apenas recentemente, em termos de presença nas grandes mídias, atletas assumidamente trans competem em esportes de alto rendimento desde a década de 1970. Renée Richards é o caso mais famoso pois, após jogar pela categoria masculina nas décadas de 1950 e 1960, fez a cirurgia de redesignação sexual (CRS) e passou a competir pela categoria feminina – embora não tenha comunicado as autoridades esportivas, sendo delatada e tendo sofrido retaliações por parte da comunidade esportiva. Impedida de participar de competições oficiais, Richards conseguiu na justiça o direito de competir pela categoria feminina (COELHO et al., 2018). Nos Jogos Olímpicos de Tóquio, ganhou repercussão o caso da levantadora de peso trans neozelandesa Laurel Hubbard. Embora se tenha especulado que ela seria mais forte que as demais, e que, portanto, a competição seria injusta, a atleta, que voltava de uma lesão, não conseguiu realizar com sucesso nenhum levantamento. A revisão bibliográfica indicou que a chave para a compreensão da inclusão de pessoas trans no esporte encontra-se no controle dos níveis de testosterona no sangue. Em outubro de 2003, a Comissão Médica do COI realizou, em Estocolmo, uma reunião do comitê ad hoc para criar uma política de inclusão de atletas transgêneros nos Jogos Olímpicos. Essa política, lançada em maio de 2004 e conhecida como Consenso de Estocolmo, permitia que mulheres e homens transgêneros que haviam feito a transição antes da puberdade competissem na categoria do gênero com o qual se identificam. No caso da transição após a puberdade, os critérios eram mais rígidos, sendo exigida a CRS, além de estar em terapia hormonal (TH) por, no mínimo, 2 anos para poder competir (DUBON, ABBOUTT, CARL, 2018). Esta regulamentação permaneceu até 2015, quando o COI atualizou e não somente não endureceu, mas, pelo contrário, tornou certos critérios mais brandos. Segundo a nova regulamentação, não há restrições para homens trans. No caso de mulheres trans, estas devem se declarar como mulheres, no mínimo, 4 anos antes de competir, e seus níveis de testosterona devem estar abaixo dos 10 nmol/L, por no mínimo 12 meses antes de uma competição, independe de terem realizado ou não a CRS. Esta é a regulamentação vigente atualmente (COELHO et al., 2018). Evidentemente, no âmbito acadêmico/científico sempre serão realizadas novas pesquisas, com a constante possibilidade de revisão dos critérios anteriormente estabelecidos