Integra

O indefectível “jeitinho brasileiro”, tão pouco compreendido pelos estrangeiros, já faz parte de tratados antropológicos sobre o Brasil. Para nós, acostumados com gambiarras cantadas em verso e prosa na abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, é mais do que natura trabalhar com um objetivo e considerar ainda outras saídas diante da possibilidade de uma adversidade.

Gostemos ou não, concordemos ou não, quem vive nesse país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza, precisa sempre considerar inúmeras variáveis antes de fechar qualquer projeto ou plano de trabalho. Daí a expressão Plano B.

O Plano B é aquela saída, nem sempre muito honrosa, que permite finalizar uma tarefa custe o que custar. O famoso “se não tem cão, caça com gato”. Afinal, se o objetivo é caçar, que a presa seja captura de fato.

Dias atrás participei de uma atividade sobre os Jogos de 2016. Nada como o tempo para olhar o passado e ter condições mínimas de avaliar o que aconteceu. Já se vão mais de 4 anos de um evento que “foi um rio que passou em minha vida”, conforme cantou Paulinho da Viola. Discutimos como a imagem do país e do evento repercutiu nos meios de comunicação a partir de diferentes perspectivas. E o que ficou para mim, em particular, é como são fortes os mitos fundadores desse país tanto para quem vive aqui como para quem nos vê de fora.

O que me chamou atenção nesse webnario foi a intervenção de William Ferraz de Santana, mestrando da EACH-USP, ao relatar um fato ocorrido durante sua atividade como voluntário na arena da ginástica em 2016. Ele descreveu sua atuação junto a um voluntário vindo do Japão e seu espanto diante das improvisações ocorridas durante as competições. Era incompreensível que um evento daquela magnitude não respeitasse cronogramas e estratégias elaboradas ao longo de anos.

Com seu jeito brasileiríssimo de ser William tentou explicar aquilo que para nós é tão
compreensível e que levou Fernando Sabino a escrever: “no fim tudo dá certo, e se não deucerto é porque ainda não chegou ao fim”. Ou seja, entre tentativas e erros persistimos na tentativa de buscar uma solução para um problema, mesmo lançando mão de estratégias pouco convencionais. E aí entra o Plano B. É a solução não planejada. E o Plano C é a variante para a solução não planejada que ainda não deu certo e que não permite se chegar ao fim.

Depois dessa breve explicação a curiosidade de William se voltou para a Terra do Sol Nascente com uma pergunta certeira ao jovem voluntário. “E no Japão? Como se dão as coisas?” E a resposta veio a queima-roupa. “Nós não temos Plano B”.

Deve ser mesmo muito curioso viver em um lugar onde as coisas funcionam conforme o planejado. Acordar, viver e dormir sabendo que tudo funcionará conforme o previsto. Uma vida que só sacoleja quando algum abalo sísmico, já esperado, acontece.

Essa talvez seja uma das maiores lições da história olímpica recente. A certeza da realização quadrienal de uma competição também sofre com as incertezas que estão postas pela vida tão ordinária de nós mortais.

Faltando menos de 3 meses para os Jogos Olímpicos de Tóquio temos pouco a celebrar. A tocha, símbolo que deveria unir as nações, transita apenas dentro de solo japonês e pouco ou quase nada sabemos dela. O que dizer então do funcionamento das arenas? Nem todo planejamento nipônico e olímpico seria capaz de prever os tempos de pandemia. Nenhuma letra do alfabeto Nenhuma letra do alfabeto daria conta de tanta incerteza.